Acórdão nº 1731/16.9T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. Relatório Por participação apresentada em 24/08/2016, deu-se conta da ocorrência de um acidente de trabalho de que foi vítima mortal A. N.

    , quando exercia funções para B. C. – Tinturaria e Acabamentos, Lda.

    , sendo seguradora a X Seguros, S.A.

    .

    Decorrida a fase conciliatória do processo, as partes não chegaram a acordo (fls. 222 e ss.), aceitando todas a existência e caracterização do acidente como de trabalho e o nexo de causalidade entre a morte do sinistrado e aquele, tal como a existência e validade do contrato de seguro e a retribuição auferida pelo sinistrado, mas alegando a seguradora que o acidente se deveu a culpa do trabalhador e da empregadora, esta por falta de cumprimento das regras de segurança, o que a empregadora e a viúva do sinistrado não aceitaram.

    A fls. 230 e ss., veio Maria, viúva do sinistrado, requerer a abertura da fase contenciosa do processo contra a entidade empregadora e a seguradora, pedindo a condenação destas no pagamento de: a) 2.715,63 € de pensão anual, vitalícia e actualizável, com início em 24/08/2016; b) 5.533,68 € de subsídio de morte; c) 35.000,00 € de danos não patrimoniais; d) 40,00 € por despesas de deslocação; e) juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, computando os já vencidos em 34,00 €.

    A ré entidade empregadora contestou a fls. 274 e ss., reconhecendo o acidente e o nexo de causalidade entre o mesmo e a morte do sinistrado, mas dizendo não ter existido qualquer violação de regras de segurança da sua parte, tendo a obra que o sinistrado foi verificar sido executada por uma empresa terceira e nunca tendo dado ordens ou instruções ao seu trabalhador para que procedesse a qualquer vistoria da mesma, pelo que o acidente se deveu a culpa exclusiva deste. Termina pedindo a improcedência da acção quanto a si e a sua absolvição dos pedidos.

    A ré seguradora contestou a fls. 280 e ss., mantendo a posição anteriormente assumida em sede de tentativa de conciliação e dizendo que a subida do sinistrado ao telhado de onde se deu a queda foi feita sem qualquer equipamento de segurança, o que era do perfeito conhecimento do sinistrado, pelo que deve o acidente ser descaracterizado. Ainda que assim se não entenda, sempre haverá culpa da entidade empregadora na eclosão do acidente, uma vez que não disponibilizou equipamentos de segurança ao trabalhador nem cumpriu qualquer norma de segurança para a actividade por aquele levada a cabo. Termina pedindo a improcedência da acção quanto a si e a sua absolvição dos pedidos.

    Nenhuma das partes apresentou articulado de resposta.

    A fls. 306 e ss. foi proferido despacho saneador, com selecção dos factos assentes e dos constantes da base instrutória.

    Realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: «Assim, e nos termos expostos, julgo a ação procedente por provada e, consequentemente, condeno, sem prejuízo dos juros que se mostrem devidos (art.º 135.º do Código de Processo do Trabalho), no pagamento à autora Maria: I.

    a ré B. C. – Tinturaria e Acabamentos, Lda., as seguintes quantias: a) 5.533,70€ (cinco mil, quinhentos e trinta e três euros e setenta cêntimos), a título de subsídio por morte; b) a pensão anual e vitalícia no montante de 9.052,10€ (nove mil e cinquenta e dois euros e dez cêntimos), desde 24/08/2016, atualizada: i. em 01/01/2017 para 9.097,36€ (nove mil e noventa e sete euros e trinta e seis cêntimos); ii. em 01/01/2018 para 9.261,11€ (nove mil, duzentos e sessenta e um euros e onze cêntimos); c) 40,00€ (quarenta euros) a título de reembolso de despesas de transporte; d) 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros) a título de compensação por danos não patrimoniais; II.

    a ré X Seguros, S.A., solidariamente com a ré B. C. – Tinturaria e Acabamentos, Lda. e tendo direito de regresso sobre esta relativamente a todas as quantias que venha a pagar, as seguintes quantias: a) 5.533,70€ (cinco mil, quinhentos e trinta e três euros e setenta cêntimos), a título de subsídio por morte; b) a pensão anual e vitalícia no montante de 2.715,63€ (dois mil, setecentos e quinze euros e sessenta e três cêntimos), desde 24/08/2016 e até perfazer a idade da reforma por velhice (passando a 3.620,84€ a partir daquela idade ou no caso de verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho), atualizada: i. em 01/01/2017 para 2.729,21€ (dois mil, setecentos e vinte e nove euros e vinte e um cêntimos); ii. em 01/01/2018 para 2.778,34€ (dois mil, setecentos e setenta e oito euros e trinta e quatro cêntimos); c) 40,00€ (quarenta euros) a título de reembolso de despesas de transporte.

    Custas integralmente pela ré empregadora.

    Valor da ação: 150.667,91€ (art.º 120.º do Código de Processo do Trabalho).» A ré empregadora veio interpor recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: «QUESTÃO PRÉVIA: DA NULIDADE DA SENTENÇA 1º - Da leitura dos factos dados como provados, verifica-se que há evidente contradição entre os factos dados como provados nas alíneas Q) e U) – violação de observância de equipamentos de segurança e o facto provado na alínea T), no qual foi dado como provado que o trabalhador, mesmo assim, resolveu utilizar o equipamento em tais circunstâncias.

    2º - Ora, assim sendo, somos confrontados com um facto a mencionar existência no local de equipamentos de protecção individual que foram usados, e outros factos a declarar que não existiam. Perante isso, a decisão proferida torna-se ambígua e obscura, nulidade que expressamente aqui se invoca para todos os efeitos legais, nos termos do artigo 615º, n.º 1 al. c) do C.P.C.

    DO RECURSO 3º - A recorrente não pode conformar-se com a douta sentença proferida nos presentes autos, que julgou procedente a acção por provada e condenou nos termos constantes da decisão judicial.

    4º - Nos presentes autos, entendeu o douto tribunal recorrido que existiu responsabilidade agravada da Recorrente, que pela inobservância ou inaplicação das normas de segurança devidas, causou o acidente de trabalho descrito nos autos. Ora, o que está em causa, assim, no presente recurso é apurar se há efectivamente responsabilidade agravada ou não da Recorrente por ausência de observância das regras de segurança, e em consequência, se devia ser responsabilizada ou absolvida dos pedidos peticionados, sendo que a nossa resposta vai no sentido de que a mesma deveria ser absolvida.

    5º - Assim, o presente recurso versará sobre matéria de facto e de direito, pois não concorda a aqui recorrente com o teor da douta decisão proferida pelo Tribunal “ a quo”, pois é nosso entendimento que toda a prova que o tribunal valorou e apreciou de forma incorrecta, pelos motivos e fundamentos legais citados na sentença, deve ser apreciada do modo que se passará a descrever e, em consequência, ser alterada a decisão sobre a matéria de facto.

    6º - Mas em primeiro lugar, há factos que, para além de merecerem o estatuto de não provados, devem acima de tudo ser considerados como não escritos, por serem apenas matéria conclusiva, para além de entendermos que no mínimo há lapso de escrita quanto ao Ponto T) dos factos dados como provados e cuja nulidade supra esgrimida não for procedente, deve ser rectificada.

    7º - Dispõe o n.º 3 do artigo 607.º do Código de Processo Civil que o juiz, na elaboração da sentença, deve “discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes”, e este número é ainda complementado pelo seu n.º 4 o qual menciona que “na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.

    8º - Os artigos citados demonstram-nos a necessidade de aplicação de um critério normativo enquanto fundamento da distinção entre questão de facto e de direito, essencial para apurar a verdadeira matéria de facto e descrevê-la na sentença, para posterior aplicação da matéria de direito aos factos, que no nosso humilde entendimento não foi devidamente observado.

    9º - E isso é perceptível na motivação e fundamentação para a matéria de facto dada como provada e não provada, pois na página 7, onde afirma que“ Muito embora nenhuma prova tenha sido feito no sentido de ao sinistrado ter sido alguma vez ministrada formação para execução de trabalhos em altura (…)”, o tribunal recorrido deu como provados os pontos S) e V) da matéria de facto.

    10º - A isso, acresce ainda mais esta tomada de posição na douta sentença recorrida, pois na página 8 está escrito o seguinte: “ (…) É certo que não há qualquer prova de ordens expressas dos legais representantes da Ré no sentido de ordenar ao sinistrado que subisse ao telhado para verificar o estado de execução da obra em causa, (…)” e mesmo assim, o douto tribunal “ a quo” deu como provados os pontos Q) e U) da matéria de facto.

    11º - O mesmo se refira ao ponto R) dos factos dados como provados. Não basta a referência dada pela fabricante do telhado de fibrocimento para o uso de redes de segurança para concluir que esta é uma estrutura frágil, mas só um relatório de peritagem poderia concluir sobre a fragilidade do telhado, o que não sucede. Mais, não foi apurado se o local onde se deu queda deveu-se a algum vício causado pela deterioração do próprio telhado.

    12º - Pelo supra exposto, estes factos dados como provados, isto é, os factos Q), R), S), U) e V) são apenas juízos de valor ou matéria conclusiva e que merecem o estatuto de não provados e devem ser dados como não escritos, por existir excesso ou exorbitância de resposta...

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