Acórdão nº 6/16.8TELSB-D.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelANTERO LUIS
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. Relatório Nos autos de inquérito que correm termos nos serviços do Ministério Público do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, com o Nº 6/16.8TELSB, na sequência de promoção do Magistrado do Ministério Público, para que Meritíssimo Juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal tomasse conhecimento do conteúdo das mensagens existentes, nos ficheiros de correio electrónico do contabilista de uma das sociedades visadas com a investigação, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 179, nº 3 do Código Processo Penal, o mesmo indeferiu tal pretensão, por despacho 10/07/2018, junto a fls. 66 verso a 71 dos presentes autos, nos seguintes termos: (transcrição) «Por despacho judicial de fls.254 foi autorizada, na sequência do requerido pelo MP, a apreensão de correio electrónico quanto aos suspeitos aí devidamente identificados.

    Do auto de busca e apreensão, verifica-se que a PJ fez tábua rasa da autorização judicial e procedeu à apreensão de correio electrónico relativo a RR.., pessoa que não é suspeito nos presentes e não estava incluído entre as pessoas constantes da autorização judicial.

    Por despacho de fls. 464 foi ordenada a eliminação dos ficheiros relativos à caixa de correio electrónico de RR...

    Desse despacho veio o MP recorrer, alegando, em resumo que a apreensão do correio electrónico de RR.. mostrou-se uma diligência inteiramente proporcionada e imperativa à aquisição da prova e que nada obsta a circunstância de RR.. não ser suspeito no âmbito da presente investigação, porquanto, são susceptíveis de serem apreendidos quaisquer objectos relacionados com o crime ou que possam servir de prova, nos termos do artigo 174º nº 2 do CPP.

    Por acórdão do TRL de 8-5-2018, foi decidido que, são susceptíveis de serem apreendidos quaisquer objectos relacionados com um crime ou que possam servir de prova e que as mensagens de correio electrónico do Rui Fernandes foram licitamente apreendidas.

    Na sequência da decisão do TRL veio o MP apresentar, novamente, neste TCIC os ficheiros apreendidos a RR..

    Tendo em conta o requerido pelo MP, com vista a uma compreensão da questão vejamos, antes de mais, as normas legais em causa: O art. 12º da D.U.D.H, nos termos do qual "Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei."; O art. 8' da C.E.D.H., nos termos do qual "1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência. 2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem - estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros."; Da CRP: arts. 26°, sob a epígrafe "Outros direitos pessoais", ["1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação. 2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias]; n° 8 do art. 32°, este sob a epígrafe "Garantias do processo criminal" [nº 8. São nulas todas as provas obtidas mediante (...), abusiva intromissão na vida privada, (...), na correspondência ou nas telecomunicações]; nºs 1 e 4 do art. 34º, sob a epígrafe "Inviolabilidade do domicilio e da correspondência" ["1. O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis. (...). 4. É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal. "]; e nºs 1, 2, 4 e 7 do art. 35°, sob a epígrafe "Utilização da informática ["1. Todos os cidadãos têm o direito de acesso aos dados informatizados que lhes digam respeito, podendo exigir a sua rectificação e actualização, e o direito de conhecer a finalidade a que se destinam, nos termos da lei. 2. A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção, designadamente através de entidade administrativa independente. (…).4. É proibido o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei. (...). 7. Os dados pessoais constantes de ficheiros manuais gozam de protecção idêntica à prevista nos números anteriores, nos termos da Iei.».

    Nos termos da Lei 109/2009, de 15/09, verifica-se que o legislador distinguiu três situações: as pesquisas informáticas; a apreensão de dados informáticos; e a apreensão de correio electrónico e previu, para cada uma delas, um regime específico.

    Assim, no artigo 15°, quanto à pesquisa de dados informáticos, diz-se o seguinte: 1- Quando no decurso do processo se tomar necessário à produção de prova, tendo em vista a descoberta da verdade, obter dados informáticos específicos e determinados, armazenados num determinado sistema informático, a autoridade judiciária competente autoriza ou ordena por despacho que se proceda a uma pesquisa nesse sistema informático, devendo, sempre que possível, presidir à diligência.

    2- O despacho previsto no número anterior tem um prazo de validade máximo de 30 dias, sob pena de nulidade.

    3- O órgão de polícia criminal pode proceder à pesquisa, sem prévia autorização da autoridade judiciária, quando: a) A mesma for voluntariamente consentida por quem tiver a disponibilidade ou controlo desses dados, desde que o consentimento prestado fique, por qualquer forma, documentado; b) Nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa.

    4- Quando o órgão de polícia criminal proceder à pesquisa nos termos do número anterior: a) No caso previsto na alínea b), a realização da diligência é, sob pena de nulidade, imediatamente comunicada à autoridade judiciária competente e por esta apreciada em ordem à sua validação; b) Em qualquer caso, é elaborado e remetido à autoridade judiciária competente o relatório previsto no artigo 253.° do Código de Processo Penal.

    5- Quando, no decurso de pesquisa, surgirem razões para crer que os dados procurados se encontram noutro sistema informático, ou numa parte diferente do sistema pesquisado, mas que tais dados são legitimamente acessíveis a partir do sistema inicial, a pesquisa pode ser estendida mediante autorização ou ordem da autoridade competente, nos termos dos nºs 1 e 2.

    6- À pesquisa a que se refere este artigo são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as regras de execução das buscas previstas no Código de Processo Penal e no Estatuto do Jornalista.

    Por sua vez, o artigo 2º al. b) define: «Dados informáticos», qualquer representação de factos, informações ou conceitos sob uma forma susceptível de processamento num sistema informático, incluindo os programas aptos a fazerem um sistema informático executar uma função; Quanto à apreensão de dados informáticos, diz o artigo 16° o seguinte: l- Quando, no decurso de uma pesquisa informática ou de outro acesso legítimo a um sistema informático, forem encontrados dados ou documentos informáticos necessários à produção de prova, tendo em vista a descoberta da verdade, a autoridade judiciária competente autoriza ou ordena por despacho a apreensão dos mesmos.

    2- O órgão de polícia criminal pode efectuar apreensões, sem prévia autorização da autoridade judiciária, no decurso de pesquisa informática legitimamente ordenada e executada nos termos do artigo anterior, bem como quando haja urgência ou...

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