Acórdão nº 175/18.2TELSB.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelCRISTINA SANTANA
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I Relatório 1.

Em 27.6.2018, A vem recorrer do despacho proferido pelo Senhor Juiz de Instrução do Tribunal Central de Instrução Criminal, proferido em 22.5.2018 no âmbito do inquérito nº 175/18.2TESLB, que corre termos no Departamento Central de Investigação e Acção Penal, que determinou a manutenção da medida de suspensão de todas as operações bancárias referentes à conta bancária de que é titular com o nº PT… do Banco...

Transcrevem-se as conclusões do recurso que apresentou: V - CONCLUSÕES

  1. Recai este recurso sobre a decisão proferida pelo Tribunal a quo no dia 22/05/2018, determinando a manutenção da medida de suspensão de movimentação sobre a globalidade do saldo da conta da titularidade do Recorrente (conta n.º PT… titulada junto da entidade bancária …").

  2. A decisão é ilegal, por violação do disposto no artigo 47.

    º e na alínea b) do n.º 3 do artigo 48.°, aplicável ex vi n.º 2 do artigo 49.º, todos da Lei n.º 83/2017, de 18 de Agosto.

  3. Exige o regime legal que as operações bancárias estejam, pelo menos, associadas a fundos provenientes ou relacionados com a prática de actividades criminosas, o que não resulta, de forma alguma, quer da decisão recorrida, quer da promoção que a antecedeu.

  4. A decisão em causa, atenta a jurisprudência vertida pelo Tribunal da Relação de Lisboa (P.º 169/10.6TELSB-A.Ll, 5.ª Secção, de 10/0l/2012) ultrapassa os limites inultrapassáveis ( ... ) de um qualquer meio de recolha de prova, é manifesta c exacerbadamente onerosa para o Recorrente na medida em que, como demonstrado, é excessiva e desproporcional.

  5. Em primeiro lugar, há que ter em consideração que o Juiz de Instrução em causa concluiu aquilo que o próprio Ministério Público percebeu não estar em condições de concluir, ou seja, que os fundos em causa "são produto relacionado com a prática de ilícitos" (aquela promoção limita-se a afirmar que o pai do Recorrente é arguido em um processo crime; nunca refere ou demonstra - o que seria manifestamente impossível e sem correspondência à verdade - que os montantes em causa, as concretas quantias, provêm daqueles crimes indiciados.

  6. lnexiste qualquer nexo de causalidade entre, de um lado, a suposta prática dos crimes de que vem acusado o pai do Recorrente como a origem dos fundos movimentados e, de outro lado, que esses mesmos fundos são os fundos transferidos para a conta do Recorrente; tudo o resto são meras presunções vagas e, em absoluto, desligadas da realidade; afirmar, vagamente, que o pai do Recorrente é arguido em um processo crime e que existem movimentações de dinheiro de contas suas para contas do Recorrente é insuficiente para aplicar a medida de suspensão de operações bancárias.

  7. Ganha aqui actualidade o entendimento acolhido pelo citado Acórdão nos termos do qual: só se "branqueia" dinheiro se provier de actividades primitivamente ilícitas, pelo que será sempre necessário, mesmo para efeitos de aplicação da medida de suspensão cm causa, demonstrar que este concreto dinheiro proveio daquelas concretas infracções, o que não sucede, manifestamente, in casu; exige aquele Acórdão o esclarecimento da origem de todo o dinheiro movimentado, "importando apurar se, pelo menos, parte desses valores têm origem em fraude fiscal" (exercício manifestamente inexistente in casu, não resultando, quer da promoção do Ministério Público, quer da decisão recorrida).

  8. Em segundo lugar, considerar-se-á que a argumentação acolhida pela decisão recorrida e promoção que a antecedeu é intrinsecamente contraditória: refere-se aí que os fundos em questão "são produto relacionado com a prática de ilícitos"; contudo, atenta a própria promoção do M.P., os fundos em questão (fls. 130) têm a sua radical origem em uma "liquidação e reaplicação de fundos vencidos em depósito a prazo, no valor de € ……………,00", o que ocorreu, como dali resulta, em "Janeiro de 2018".

  9. Decorre que os fundos que acabaram na conta do ora Recorrente têm origem, segundo a própria investigação, em um depósito a prazo, perfeitamente identificado, em entidade bancária nacional, que se venceu, foi liquidado e posteriormente reaplicado em igual forma.

  10. Em terceiro e último lugar, relembre-se que o que se entende ser nuclear em toda a situação sub judice é "a existência de intenção por parte de B em desenvolver, com a colaboração de familiares - entre os quais o ora requerente A - manobras de dissimulação de fundos pecuniários, obtidos ao que tudo indicia, de forma ilícita, com reintrodução dos mesmos no circuito bancário e na economia legítima".

  11. Ora, existe aqui manifesta confusão conceitual e conceptual: como afirmar que (i) as condutas em análise visam dissimular fundos pecuniários e (ii) fazê-lo com reintrodução dos mesmos no circuito bancário e na economia legítima? L) Nunca pode estar em causa uma suposta dissimulação de fundos pecuniários porque, desde logo, como resulta de todos os elementos processuais em causa, os fundos tiveram sempre existência dentro do sistema bancário; como o próprio M.P. esclarece, os fundos provêm de depósitos a prazo, são transferidos através de transferências interbancárias, entre entidades bancárias portuguesas, perfeitamente rastreáveis e controláveis por quem quer que seja.

  12. Actuando da forma como se actuou é objectivamente impossível afirmar-se que o que presidiu a essa conduta foi uma qualquer intenção de dissimulação: os montantes em causa sempre estiveram sob a luz da supervisão bancária necessária para realização das operações em causa porque esses fundos estiverem sempre, fosforescentemente, relevados em todas as operações que os tiveram como objecto.

  13. Em um outro prisma, nada se reintroduziu no sistema bancário, pela razão simples, mas decisiva, segundo a qual os fundos nunca de lá saíram, como resulta expressa e inequivocamente da promoção do M.P..

  14. Concluindo, não só a decisão recorrida não está fundamentada como, adicionalmente, a parca argumentação por si acolhida é insuficiente para efeitos de determinação da suspensão de operações bancárias.

  15. Subsidiariamente, caso assim não se conclua, entende o Recorrente que a medida de suspensão de operações bancárias não pode, de forma alguma, abranger as quantias que já se encontravam depositadas na conta em questão antes do dia 3 dc Abril de 2018, ou seja, os montantes anteriores às transferências efectuadas pelo pai do Recorrente.

  16. Tratam-se dc valores - cerca de € …..,00 - decorrentes do exercício da actividade profissional do Recorrente e respectivas poupanças que não estão de forma alguma relacionados com essas transferências, cuja impossibilidade de sua fruição transformam a medida recorrida em claro abuso injustificado, prejudicando de forma intolerável os mais elementares direitos do Recorrente.

  17. No que resulta do punho do próprio Recorrente em requerimento seu: "pois de outro modo não consigo movimentar a minha conta, não podendo fazer pagamentos ou levantamentos, nem tão pouco consigo aceder às poupanças que tenho vindo a fazer nos últimos anos". "Enfim, tenho, a minha vida completamente paralisada, pois é a partir desta conta que faço face às minhas despesas do dia-a-dia".

  18. Tem, pois, aqui plena aplicação a jurisprudência vertida no Acórdão desse Venerando Tribunal, citada mas não compreendida pela decisão recorrida, nos termos da qual a medida não pode ser aplicada quando excessiva ou demasiado onerosa: "Não pode olvidar-se que há limites inultrapassáveis e que quando se lança mão de um qualquer meio de recolha de prova, sobretudo quando se trata de um meio intrusivo, há que ter em conta que ele deve ser o menos oneroso possível para os direitos do visado e não excessivo relativamente às finalidades para que é produzido".

  19. Pelo que, subsidiariamente, entendendo-se que não deve ser revogada a decisão recorrida tendo como referente todas as operações sobre a conta bancária do Recorrente e todos os montantes ali depositados, deverá, ao menos, admitir-se que possa o Recorrente ser autorizado a movimentar as quantias que já se encontravam em tal conta antes de efectivadas as sindicadas transferências pelo seu pai, o que se roga.

    TERMOS EM QUE, RESPEITOSAMENTE, REQUER A REVOGAÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA, POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS E NORMAS IDENTIFICADAS, COM TODAS AS DEVIDAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, NOMEADAMENTE A CESSAÇÃO DA SUSPENSÃO DAS OPERAÇÕES DE QUE FOI OBJECTO A IDENTIFICADA CONTA BANCARIA TITULADA PELO RECORRENTE JUNTO DA ENTIUADE BANCÁRIA …".

    ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA! .JUNTA: duplicados legais e procuração forense.

    O recurso foi admitido por despacho proferido em 4.9.2018 e constante de fls 100 deste apenso.

    Em 12.9.2018, o Ministério Público junto do tribunal a quo veio apresentar resposta. Transcreve-se a resposta apresentada: RESPOSTA Ao recurso interposto, por A, do despacho proferido a fls. 138 a 140 dos autos, no qual O Mm, JIC do TCIC, determinou a manutenção da medida de suspensão de operações bancárias, relativamente a conta bancária da titularidade daquele.--- * O recorrente A formulou as seguintes conclusões: --''

  20. Recai este recurso sobre a decisão proferida pelo Tribunal a quo no dia 22/05/2018, determinando a manutenção da medida de suspensão de movimentação sobre a globalidade do saldo da conta da titularidade do Recorrente (conta PT… titulada junto da entidade bancaria …").

  21. A decisão é ilegal, por violação do disposto no artigo 47.

    Q e na alínea b) do n.

    Q 3 do artigo 48.

    Q, aplicavel ex vi n.

    Q 2 do artigo 49/, todos da Lei n." 83/2017, de 18 de Agosto.

  22. Exige o regime legal que as operações bancarias estejam, pelo menos, associadas a fundos provenientes ou relacionados com a prática de actividades criminosas, o que não resulta, de forma alguma, quer da decisão recorrida, quer da promoção que a antecedeu.

  23. A decisão em causa, atenta a jurisprudência vertida pelo Tribunal da Relação de Lisboa (P." 169/1 0.6TELSB-A.Ll, 5.,1 Seccao, de 10/01/2012) ultrapassa os limites...

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