Acórdão nº 1543/17.2PULSB.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | CALHEIROS DA GAMA |
Data da Resolução | 07 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam, em conferência, na 9a Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1.
No âmbito do processo comum n.º 1543/17.2PULSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo Central Criminal de Lisboa - J18, foi submetido a julgamento, com intervenção de Tribunal Coletivo o arguido AA, filho de BB e de CC, natural da freguesia de xxx, concelho de Moura, nascido a xxx de outubro de 1980, solteiro, pedreiro-ladrilhador, residente na Rua xxx, Lisboa, atualmente detido no Estabelecimento Prisional de Lisboa, acusado, como autor material, em concurso efetivo de infrações, enquanto reincidente, de 1 (um) crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152.º, n.ºs 1, al. d), e 2, do Código Penal (doravante CP); 1 (um) crime de perseguição p. e p. pelo art. 154.º-A do CP; e 1 (um) crime de resistência e coação sobre funcionário p. e p. pelo art. 347.º, n.º 1, do CP; pela prática dos factos constantes da acusação de fls. 428 a 438, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
Realizado o julgamento, por acórdão proferido e depositado em 12 de outubro de 2018, foi decidido (e passamos a transcrever): A) - PARTE CRIMINAL: --julgar a acusação parcialmente improcedente, por não provada, e, em consequência, absolver o arguido AA da prática do crime de violência doméstica de que vinha acusado; --julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condenar o arguido AA pela prática em autoria material e em concurso efectivo de infracções de: --1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p.
pelos arts. 132.º, n.º 2, al. a), 143.º e 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, todos do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão.
--1 (um) crime de perseguição p. e p. pelo art. 154.º-A do CP, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
--1 (um) crime de coacção e resistência sobre funcionário p. e p. pelo art. 347.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano de prisão.
* Decide ainda este tribunal colectivo em condenar o arguido AA na pena única conjunta de 3 (três) anos de prisão, uma vez efectuado o cúmulo jurídico das penas parcelares acima impostas (vide art. 77.º, n.ºs 1 e 2, do CP).
* Mais se decide condenar o arguido em 3 Ucs. de taxa de justiça, nos termos do disposto no art. 8.º, n.º 9, do RCP, em conjugação com a Tabela III anexa a este diploma.
* B)-Parte Cível: --julgar a acção cível enxertada parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condenar o demandado AA a pagar ao demandante “HOSPITAL HH”, a quantia global de € 124,57, acrescida de juros de mora, contados à taxa anual de 4 %, desde a data da notificação do pedido até integral e efectivo pagamento.
Custas da instância cível enxertada a cargo do demandante e do demandado na proporção dos respectivos decaimentos.
* Ao abrigo do disposto no art. 82.º-A do CPP, condena-se ainda o arguido AA a pagar à ofendida CC a quantia de € 500 (quinhentos euros), a título de reparação dos danos não patrimoniais sofridos.” (fim de transcrição).
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O arguido, inconformado com a mencionada decisão, interpôs recurso extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: “13.°[1] O Acordão de que se recorre conclui em oposição às regras legais estabelecidas no art.° 127.° do C.P.P. ao dar como provados alguns factos instrumentais dos quais, com toda a segurança e sem margem para qualquer dúvida, cumpria retirar a conclusão do não preenchimento de todos os factos conclusivos do tipo de crime pelo qual o Recorrente foi condenado.
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Ora, temos como regra basilar da livre apreciação da prova em processo penal, que não se confunde com a apreciação arbitária, discricionária ou até caprichosa da prova, de todo em todo imotivável: O julgador, ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material, deve observância a regras de experiência comum utilizando como métodos de avaliação a aquisição de conhecimento, critérios objectivos, genericamente susceptiveis de motivação e controlo... e; 15.° Do que emana o Acordão recorrido, tal ensinamento não foi seguido, na medida em que da convicção formada pelo Tribunal a quo, havendo de ser sempre uma mera convicção pessoal, transparece que a mesma não é "uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos demais, só por si mesma".
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O Tribunal a quo interpretou restritivamente o disposto no n.° 2 do art.° 374.° do C.P.P., e consequentemente não apresentou uma exposição completa dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame critico das provas ou factos provados e não provados, que serviram para formar a convicção do Tribunal, em objectiva contradição factual entre eles mesmos, não se dando justificação plausível para a aplicação de pena de prisão efectiva.
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Não se entende porque se condena o Ora Recorrente a uma pena efectiva de 3 anos de prisão, quando do seu relatório social, resulta que de acordo com os dados recolhidas, que Arguido vive do seu trabalho, quando o crime cometido, foi feito em estado de embrieguez com sua mãe e companheira que o desculparam e perdoaram expressamente.
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O dever de fundamentação é uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de Direito Democrático ao menos quanto às decisões judiciais que tenham por objecto a solução da causa em juízo, como instrumento de ponderação e legitimação da própria decisão judicial e de garantia do direito ao recurso. Nestes casos, particularmente, impôe-se a fundamentação ou motivação fáctica dos actos decisórios através da exposição concisa, clara, lógica, coerente, encadeada factual e cronologicamente, assim como completa dos motivos de facto, bem como as razões de direito que justificam a decisão.
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A fundamentação do Acorsão, não tem que ser uma espécie de "assentada" em que o Tribunal reproduza as depoimentos dos testemunhos ouvidos, ainda que de forma sintética. Pretende-se que, de uma forma sucinta, seja tanto quanto possível transparente e explícito o processo lógico-racional que levou à convicção do Tribunal, com base no princípio da livre apreciação da prova (art.° 127 do C.P.P.) em ordem a facilitar o autocontrole da decisão pelo julgador, a viabilizar a exigível sindicabilidade da decisão e a reforçar a sua compreensibilidade pelos destinatários directos e da comunidade em geral, como elemento de relevo para a sua aceitação e legitimação.
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A fundamentação em apreço no Acordão, de modo algum preenche o conteúdo referido, antes se limitando a um puro e simples repositório da prova produzida, provada e não provada, em total contradição entre si, na parte dos factos pelo qual o Recorrente foi condenado, desconhecendo-se qual o exame crítico e racional da mesma pelo Tribunal.
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Relativamente à pena de 3 anos prisão efectiva, aplicada ao Arguido ora Recorrente, este, encontra-se inserido socialmente, tem uma família estruturada, tem trabalho, embora não sendo primário, é manifestamente exagerada, desproporcinal ao ilicito que o arguido cometeu e foi condenado, sendo-lhe eventualmente revogada a liberdade condicional, acrecida da presente pena de 3 anos, teria que cumprir mais 5 anos de reclusão, o que é contrário aos principios basilares do nosso Direito Penal, que visa ressocializar, intregar e não ser meramente punitivo aritemeticamente. O arguido tem um projecto de vida em espanha onde tem emprego garantido e uma companheira.
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Não tendo tais pressupostos sido devidamente ponderados e valorados pelo Tribunal a quo, pelo que o simples facto de não ser primário e jovem, foi penalizado e condenado em prisão efectiva, quando esse factor deveria ser tido em conta e ser relevado em sede de Recurso e suspensa a execução da pena, com regime de prova apertado e adequado aos vicios de consumo excessivo de alcool,.
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Tudo isto, e em face aos fins a que a pena se propõe, a dimensão originária da culpa, as formas subsequentes da actuação do arguido no seu processo regenerativo, de que tem dado mostras, permite que nos termos que o Tribunal ad quem Nestes termos, repugna-nos acreditar que o Tribunal ad quem não se decida, pela suspensão da execução da pena com regime de prova, ou pelo cumprimento da pena em dias livres, nos termos dos art. 45.° e 50.° do Código Penal, permitindo que dessa forma seja, efectivamente, feita JUSTIÇA” (fim de transcrição).
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Foi proferido despacho judicial admitindo o recurso, como se alcança de fls. 618.
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O Ministério Público na 1.ª instância apresentou resposta ao recurso, concluindo que ao mesmo deverá ser negado provimento, como consta de fls. 619 a 634, que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
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Subidos os autos, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação emitiu parecer, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso interposto pelo arguido, adiantando nada mais se lhe oferecer acrescentar à posição assumida pelo Ministério Público na primeira instância (cfr. fls. 642/643).
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Foi cumprido o preceituado no art. 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (doravante CPP), não tendo havido resposta.
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Efetuado o exame preliminar foi considerado não haver razões para a rejeição do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.
II – Fundamentação 1. Questão prévia Veio o arguido requerer a realização de audiência neste Tribunal da Relação.
Porém, não especificou os pontos da motivação do recurso que pretendia ver debatidos na audiência, de acordo com o estabelecido no n.º 5, do art. 411.º, do CPP.
Assim sendo, e porque a omissão em causa não integra qualquer das situações a que alude o art. 417.º, n.º 3, do CPP, em que deva haver lugar a despacho de aperfeiçoamento, o recurso será julgado nesta conferência.
Neste mesmo sentido se pronunciou o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 163/2011.
Indefere-se, assim, a realização do julgamento do recurso em audiência oral neste tribunal da Relação.
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Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da...
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