Acórdão nº 896/16.4T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução17 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 896/16.4T8FAR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro Juízo Central Cível de Portimão - Juiz 4 I. Relatório (…) – Associação de Socorros Mútuos, com sede na Rua (…), n.º 220, 2.º direito, em Lisboa, instaurou acção declarativa de condenação, a seguir a forma única do processo comum, contra (…) Associações Cristãs da Mocidade de Portugal, com domicílio na Estrada Municipal, n.º (…), lote 14, apartado 132, … (cfr. fls. 178), pedindo a final a condenação da demandada no pagamento da quantia de € 490.286,03, sendo € 85.000,00 a título de indemnização para reparação dos danos de natureza não patrimonial, acrescida de juros legais contados da citação. Alegou para tanto, em síntese, ter recebido da ré, mediante negócio de dação em pagamento com esta celebrado e para liquidação de empréstimo antes concedido, direitos reais de habitação periódica, mediante os quais aquela se obrigou a proporcionar à demandante o gozo, durante 308 semanas por ano, das fracções localizadas nos prédios urbanos sitos na Quinta da (…) integrados no empreendimento turístico “Jardins da (…)”. Mais alegou que dada a violação, por banda da ré, dos seus deveres de manutenção e conservação do empreendimento, o complexo habitacional em causa foi-se degradando desde o ano de 2005, o que culminou com o seu encerramento no ano de 2011 por acção da ASAE, vendo-se a autora impedida de, como até então, ceder o uso dos direitos de que é titular aos seus associados, cobrando a correspondente contrapartida. A descrita situação afectou ainda a sua imagem, provocando os danos de natureza patrimonial e não patrimonial cujo ressarcimento aqui reclama. * Citada a Ré, defendeu-se por excepção, arguindo a nulidade do negócio por preterição da formalidade imposta pelo art.º 11.º do DL 130/89, de 18 de Abril, regime dos direitos reais de habitação periódica em vigor à data, sendo em todo o caso nulo por impossibilidade e indeterminabilidade do seu objecto. Invocou ainda a excepção da prescrição no que respeita à peticionada indemnização pelos danos de natureza não patrimonial, atento o disposto no n.º 1 do art.º 498.º do CC (cf. art.ºs 27.º e 28.º da contestação), reputando de abusivo o exercício pela autora de eventual direito, uma vez que se recusa a actualizar o valor da taxa anualmente paga pela utilização das instalações, a qual é insuficiente, pelo menos desde o ano de 2000, para cobrir os gastos com água, gás, serviços de limpeza, produtos de higiene, taxas e outras despesas de administração e manutenção do empreendimento inerentes às unidade de alojamento objecto dos direitos de que é titular. Tendo finalmente impugnado quanto foi alegado pela autora em suporte dos pedidos formulados, justificou a degradação do empreendimento com as deteriorações inerentes ao seu uso ininterrupto durante décadas e também com o uso imprudente que os associados da ré vinham fazendo das instalações, concluindo pela sua absolvição. Respondeu a autora, pronunciando-se pela improcedência das excepções invocadas. * Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador no qual se relegou para final o conhecimento das excepções, prosseguindo os autos com identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova (cfr. fls. 555 a 557 v.º). Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, após o que veio a ser proferida sentença que, na parcial procedência da acção, condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 185.416,88 (cento e oitenta e cinco mil, quatrocentos e dezasseis euros e oitenta e oito cêntimos), acrescida dos juros contados à taxa supletiva legal desde 21 de Dezembro de 2016 até integral pagamento. Inconformadas, apelaram a autora e também a ré e, tendo desenvolvido nas alegações que apresentaram os fundamentos da sua discordância com o decidido, formularam a final as seguintes conclusões: A. A autora: 1.ª A sentença recorrida julgou prescrito o direito à indemnização pelos danos sofridos pelo Apelante anteriores a 11 de Abril de 2013, porquanto considerou que, apesar da R. recorrida apenas ter arguido a prescrição do direito à indemnização por danos não patrimoniais, poderia estender a apreciação da excepção também aos danos patrimoniais, dado que o A. Apelante na sua resposta terá alegado que sendo a obrigação da R. de natureza obrigacional estaria sujeita ao prazo prescricional de 20 anos e não de 3. 2.ª Porém, e conforme se alega, a referência da A., no art.º 21.º dessa reposta, quanto ao prazo de 20 anos para a prescrição do direito à indemnização pelos danos patrimoniais causados não supõe a sua invocação pela R. recorrida, para os efeitos do art.º 303.º do Código Civil, nomeadamente pela restrição efectuada pela R. quanto aos direitos não patrimoniais e por não ser de conhecimento oficioso. 3.ª Assim, salvo melhor e douto entendimento, a sentença violou o disposto no art.º 303.º do Código Civil e porque assim, deverá decidir-se, com este fundamento, que não se verificou a prescrição dos direitos patrimoniais reclamados e que se constituíram posteriormente a 1996 (a acção deu entrada em 6 de Abril de 2016). 4.ª Mas, e para o cálculo temporal da prescrição, a sentença considerou que a “responsabilidade que possa existir em virtude do incumprimento das obrigações da entidade proprietária/exploradora do empreendimento perante os titulares, é uma responsabilidade extra-contratual, prescrevendo o direito de indemnização no prazo de 3 anos – art.º 498.º, n.º 1, do Código Civil”. 5.ª Porém, e conforme supra se contraditou, a relação entre o titular do DRHP (Apelante) e o proprietário do empreendimento (Apelada) tem natureza contratual, e a responsabilidade da R. recorrida resultará do incumprimento dos seus deveres de proprietário do empreendimento ex vi dos art.º 25.º e seguintes do Dec-Lei n.º 275/93. 6.ª Pelo que, ao aplicar as normas relativas à responsabilidade aquiliana, a sentença recorrida violou o disposto nos art.ºs 483.º e 498.º do Código Civil. 7.ª Decidindo nesse sentido e anulando nessa parte a sentença, deverá o Tribunal ad quem nos termos dos art.º 662.º e 665.º do Código Processo Civil, fixar o valor indemnizatório correspondente a esse período e nos termos referidos no n.ºs 21 e 22 supra, ou seja, fixar o valor da indemnização por danos patrimoniais em € 418.145,84 (€ 185.416,88 + € 232.779,72). 8.ª E quanto aos danos não patrimoniais, que devem ser considerados porquanto não se verificou a alegada prescrição, deverá nessa parte alterar-se a sentença e proceder-se à sua fixação no montante mínimo de € 85.000,00, conforme se alegara na p.i. Com os aludidos fundamentos concluiu pela procedência do recurso, com a revogação da sentença recorrida e sua substituição por outra que condene a ré na totalidade do pedido. * B. A ré: 1.ª Conclui-se na sentença recorrida que, tendo ficado provado que o empreendimento foi encerrado em 1 de Outubro de 2011 e que ulteriormente reabriu em parte, face às circunstâncias do encerramento cabia à Recorrente o dever de comunicar à Recorrida a reabertura e a possibilidade dos titulares virem a exercer os seus direitos de novo, considerando-se que, não o tendo feito, agiu com culpa, razão por que se entende que é responsável pelos danos daí resultantes. 2.ª No domínio da responsabilidade contratual, estabelece o artigo 798.º do Código Civil que “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”, dispondo o nº 1 do artigo 799.º do mesmo código que “incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua”, fazendo o legislador impender sobre o devedor uma presunção de culpa, que pressupõe este incumpriu ou cumpriu defeituosamente uma obrigação. 3.ª No caso sub judice a aqui Recorrente não tinha a obrigação, contratual ou legal, de comunicar à Recorrida a reabertura do empreendimento, pelo que não incorreu em incumprimento contratual. 4.ª Do anexo V do contrato celebrado em 21 de Janeiro de 1991 (pontos 6 e 7 da tábua de factos provados) constam os principais direitos e obrigações do proprietário dos imóveis objecto dos D.R.H.P. constituídos a favor da Recorrida, sendo que não consta da panóplia de obrigações do proprietário dos aludidos imóveis a de comunicar aos titulares de D.R.H.P. a reabertura do empreendimento, mesmo que este tenha sido encerrado em circunstâncias excepcionais ou não previsíveis. 5.ª Da factualidade dada como provada não resulta, pois, que sobre a Recorrente impendia a obrigação, legal ou contratual de comunicar à Recorrida a reabertura do empreendimento onde esta é titular de D.R.H.P. 6.ª A não comunicação por parte da Recorrente à Recorrida da reabertura do empreendimento não consubstancia, assim, incumprimento ou cumprimento defeituoso de qualquer obrigação, contratual ou legal, emergente do contrato de dação em cumprimento dos D.R.H.P. em causa nos presentes autos, pelo que a Recorrente não incorreu, por esse facto, em responsabilidade civil e no consequente dever de indemnizar a Recorrida. 7.ª Ainda que assim não se entenda – no que não se concede e só por mera cautela de patrocínio se admite -, da factualidade dada como provada não resulta que entre tal omissão de comunicação e os danos patrimoniais invocados pela Recorrida, que aquela foi condenada a ressarcir, exista nexo de causalidade. 8.ª Na responsabilidade contratual há uma presunção legal “juris tantum” da culpa do contraente faltoso, mas é sobre o contraente cumpridor que recai o ónus da prova dos restantes pressupostos: violação contratual, dano e nexo causal. 9.ª O dano que a Recorrente foi condenada a indemnizar consiste no montante global pelo qual a Recorrida poderia ter arrendado, em 2013 (parte), 2014, 2015 e 2016, os apartamentos do empreendimento sobre os quais é titular de D.R.H.P., deduzido o valor da taxa de utilização que deveria ter pago – e não pagou – à Recorrente, ou seja, os lucros cessantes. 10.ª Ainda que a falta de comunicação da...

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