Acórdão nº 3098/15.3T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução09 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: 1. Os honorários de advogado devem obedecer ao princípio geral da adequação aos serviços prestados, independentemente da ocorrência de um acordo prévio com o cliente acerca do seu modo de fixação.

  1. Acordado o pagamento de honorários de advogado à razão de valor/hora, tal refere-se ao trabalho intelectual complexo que geralmente caracteriza a actividade do advogado, não se devendo remunerar pelo mesmo valor o trabalho meramente burocrático.

  2. É dever do advogado prestar ao cliente, sempre que este o solicitar, informação sobre o andamento das questões que lhe estão confiadas, e não cessar, sem motivo justificado, o seu patrocínio.

    Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo Local Cível de Faro, (…) – Sociedade de Advogados, RL, demandou (…), pedindo o pagamento de honorários, despesas e IVA no valor de € 5.572,90, bem como juros já vencidos no valor de € 210,70, mas a final, após contestação e julgamento, viu ser proferida sentença de absolvição.

    Inconformada, a A. recorre e remata com conclusões onde, nas seis iniciais efectua um resumo da causa e da decisão proferida; e da sétima à décima segunda impugna a matéria de facto, efectuando uma longa transcrição do depoimento da testemunha (…), e terminando com os seguintes pedidos: · dever ser julgado como provado o facto vertido no n.º 2 dos factos não provados – que tenha sido em resultado do árduo e empenhado trabalho por parte da A. accionando a Convenção de Haia, que a filha do R. regressou a Portugal; · ser aditado aos factos provados que a A. elaborou, a pedido do R., uma queixa-crime de subtracção da menor, a qual só não deu entrada no Ministério Público por instruções deste; · ser aditado aos factos provados que, de acordo com instruções do R., foram apresentadas reclamações junto de dois hospitais, pela actuação de um médico, o Dr. (…).

    A análise dos factos e a discussão do aspecto jurídico da causa é efectuada a partir da 13.ª conclusão, nos termos que seguem: 13. Resulta da prova documental junta aos autos e da prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento que a A. prestou ao R., a pedido deste, serviços de assessoria e consultadoria jurídico-legal, designadamente: 1) Participação à Autoridade Central Portuguesa para accionamento da Convenção de Haia relativamente à subtracção da menor, filha do R., por parte de sua mãe do território nacional e actos processuais subsequentes; 2) Queixa-crime por subtracção de menor; 3) Acção de regulação das responsabilidades parentais e actos processuais subsequentes; 4) Divórcio sem consentimento do outro cônjuge e actos processuais subsequentes; 5) Procedimento cautelar não especificado para entrega de computador portátil furtado pela esposa do R.; 6) Queixa-crime por furto do computador portátil; 7) Reclamações apresentadas contra o Médico Dr. (…).

  3. Os serviços jurídicos foram prestados entre Julho de 2014 e Dezembro de 2014.

  4. Para acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais foram fixados honorários no montante de € 3.500,00 e para a acção de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge foi estabelecido um montante de honorários entre os € 5.000,00 e os € 10.000,00.

  5. O R. pagou uma provisão para despesas e honorários no montante de € 5.000,00.

  6. Os assuntos confiados pelo R. à A. eram complexos, urgentes e trabalhosos, não só por estar em causa o rapto de uma menor para o estrangeiro, como pela postura adoptada pelo R. perante a A. com sistemáticas solicitações por e-mail, alterações aos articulados processuais e junção de documentos aos autos, apesar de advertido pela A. de a sua conduta não ser adequada aos fins pretendidos.

  7. Acresce que sempre foram prestados ao R. todas as informações sobre o andamento dos processos, como aliás é a postura da A. perante todos os seus clientes.

  8. Foram realizadas reuniões com o R., elaboradas e remetidas múltiplas comunicações para o R. e efectuadas deslocações junto de diversas entidades por conta do R.

  9. Posteriormente ao acordo de fixação de honorários, A. e R. acordaram na alteração da estipulação dos honorários que passaram a ser debitados ao montante de € 100,00 acrescido de IVA à hora, acordo que foi aceite pelo R. conforme resulta expressamente do pagamento dos dois primeiros relatórios intercalares de despesas e honorários, bem como das declarações de parte prestadas pelo R. na audiência de julgamento, o qual confessou tal factualidade.

  10. Mais ficou provado que foram remetidos ao R. três relatórios intercalares de despesas e honorários, sendo que este apenas pagou os montantes correspondentes ao primeiro e segundo relatórios, estando em dívida o montante de € 5.572,90, acrescido dos juros moratórios.

  11. Provou-se, ainda, que existe um registo informático na A. para registar o tempo despendido com os processos e os clientes, sendo que, neste caso, existiram algumas diligências que nem sequer foram registadas e, como tal, não debitadas ao R.

  12. O R. pagou o montante total aproximado de € 20.000,00, não tendo pago o montante de € 5.572,90, correspondente ao terceiro relatório intercalar de despesas e honorários, apesar de devidamente interpelado para o efeito.

  13. Aliás, o R, comprometeu-se perante a A. a pagar os honorários devidos, só não o tendo feito em virtude de problemas financeiros, pedindo a A. para aguardar a recepção do pagamento, nunca tendo demonstrado insatisfação pelos serviços jurídicos prestados pela A.

  14. Ficou, ainda, provado que o escritório principal da A. fica em Lisboa, conforme era do conhecimento do R., sendo que o Dr. (…) reuniu-se pontualmente com o R. no escritório de Faro.

  15. Por último, face ao não pagamento dos honorários devidos, a A. viu-se forçada a renunciar ao mandato nos processos judiciais que lhe foram confiados pelo R.

  16. Da prova produzida, não restam dúvidas que da importância dos serviços prestados pela A., ora Recorrente, ao R., ora Recorrido, à dificuldade e urgência dos assuntos confiados pelo R. à A., ao enorme tempo despendido pela A. face às solicitações do R., bem como às elevadas responsabilidades assumidas, estando em causa, designadamente, a subtracção de uma menor do território nacional, entre outras questões jurídicas relevantes.

  17. Acresce que foram prestados pela A. serviços jurídicos ao R. que não foram sequer considerados pelo Meritíssimo Juiz a quo, designadamente uma queixa-crime de subtracção da menor, a qual só não deu entrada no Ministério Público por instruções do R., ora Recorrido, bem como, de acordo com instruções do R., ora Recorrido, foram apresentadas reclamações junto de dois hospitais, pela actuação de um médico, o Dr. (…), facto, igualmente, ignorado pelo Meritíssimo Juiz a quo.

  18. A A., ora Recorrente, cumpriu escrupulosamente para com o R. os deveres de informação e zelo impostos pelo E.O.A.

  19. O Meritíssimo Juiz a quo tinha ao seu dispor a faculdade de solicitar o laudo de honorários à Ordem dos Advogados, optando, contudo, por um critério discutível e discricionário como é o caso do Princípio da equidade, com manifesto prejuízo patrimonial da A., ora Recorrente.

  20. Salvo melhor opinião, quando seja usado o instituto da equidade, o Julgador terá sempre de justificar essa equidade, não a podendo utilizar sem mais, sem que realmente as partes consigam entender o porquê da utilização de tal critério ao invés de outro, designadamente, no caso concreto, da opção de não solicitar o laudo sobre honorários à Ordem dos Advogados.

  21. Ora, com o devido respeito, o critério de equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim um critério para a correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto.

  22. Na verdade, a lei não dá qualquer conceito de equidade, mas tem-se aceite a mesma como a consideração prudente e acomodatícia do caso, e, em particular, a ponderação das prestações, vantagens e inconvenientes que concorram naquele.

  23. A fixação da indemnização em termos de equidade deve levar em conta as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida, o que, deve dizer-se, não sucedeu no presente caso.

  24. O que se discute aqui é o facto de se ter atendido ao instituto da equidade em detrimento do laudo sobre honorários que constitui parecer técnico e juízo sobre a qualificação e valorização...

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