Acórdão nº 1184/08.5TBCTX.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução07 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 1184/08.5TBCTX.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Competência Cível do Cartaxo – J1 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na presente acção de condenação proposta por (…) e (…) contra (…) e (…), os Autores vieram interpor recurso da sentença final.

* Os Autores pediram a condenação dos Réus no pagamento do custo da reparação dos defeitos de construção da moradia (no valor de € 12.260,00 acrescido de IVA), no pagamento de quantia mensal não inferior a € 600,00 por cada mês de privação de uso e habitação desde Maio de 2007 a final Agosto de 2008, no pagamento da quantia de € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais, juros sobre as referidas quantias. * Os Autores alegaram para o efeito ter adquirido um imóvel para habitação aos Réus e que, logo após a entrega, o mesmo apresentava diversos defeitos, que repararam por sua conta e custo e que, além do mais, isso os privou do uso da referida residência e lhes causou diversos incómodos.

* Os Réus apresentaram articulado de contestação, onde admitiram que venderam aos Autores o prédio misto identificado mas não foram eles os construtores da moradia nele implantado e que celebraram um contrato de empreitada com a sociedade “(…) – Construções, Lda.” e que o técnico responsável da obra foi (…).

* Os Autores suscitaram o incidente de intervenção de terceiro de “(…) – Construções, Lda.” e de (…), que foi deferido.

* O chamado (…) contestou a acção, aderindo à contestação dos Réus, acrescentando ainda que, enquanto director técnico da obra, cumpriu todas as obrigações técnicas a que está vinculado por efeito do previsto no Decreto-Lei nº 555/99, de 16/12.

* Foi apresentado requerimento de ampliação de pedido, o qual foi deferido.

* Realizado o julgamento, o Tribunal «a quo» decidiu: I – Absolver os Réus (…) e (…) dos pedidos contra si formulados.

II – Condenar “(…) – Construções, Lda.” no ressarcimento aos Autores da quantia de € 9.432,42 despendida na reparação de defeitos na construção.

III – Condenar, solidariamente, “(…) – Construções, Lda.” e (…) no pagamento da quantia de € 5.000,00 aos Autores a título de indemnização por danos não patrimoniais.

IV – Absolver os chamados do mais peticionado.

* Os recorrentes não se conformaram com a referida decisão e as suas alegações continham as seguintes conclusões: «I – A decisão recorrida faz, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação dos artigos 331º, nº 2 e 916º, nº 3, do Código Civil ao julgar caducado o direito dos Autores em exigirem a eliminação dos defeitos e a correspondente indemnização contra os vendedores e o técnico responsável da obra.

II – Provado ficou que a moradia foi entregue aos Autores em 11/04/2007 e os defeitos foram denunciados em meados de Maio de 2007.

III – O que significa portanto que, ainda não havia decorrido o prazo de 5 (cinco) anos de que os Apelantes dispunham para o exercício desse direito, nem sequer se havia esgotado o prazo de 1 (um) ano, a partir da denúncia.

IV – Para além disso, resultou confessado pelos próprios vendedores na sua contestação que as reparações foram levadas a cabo por estes e que os mesmos reconheceram assim a sua culpa ao mandarem reparar parte das deficiências encontradas da moradia.

V – O que se traduz num reconhecimento concreto, preciso e inequívoco dos defeitos que não oferece quaisquer dúvidas, impedindo definitivamente a verificação da caducidade do direito invocado pelos Autores.

VI – Quanto aos defeitos supervenientes o artigo 918º do Código Civil manda aplicar as regras gerais do não cumprimento.

VII – Assim, relativamente aos segundos defeitos, estamos perante uma situação de cumprimento defeituoso de um contrato de compra e venda, imputável aos vendedores, que não ilidiram a presunção de culpa que sobre si recaía, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 799º e 342º, nº 2, ambos do Código Civil.

VIII – Provou-se ainda que o Arquitecto (…) foi o autor do projecto de arquitectura e ao mesmo tempo o técnico responsável da obra.

IX – Sendo por isso mesmo solidariamente responsável pelo ressarcimento dos danos causados aos Apelantes verificados que se mostram os pressupostos da responsabilidade extracontratual por factos ilícitos decorrentes da violação culposa dos seus deveres no exercício da actividade a que estava obrigado.

X – De facto da prova produzida resultou assente não ter sido feita a ligação da laje do alpendre à estrutura da casa, conforme estava previsto no projecto de estabilidade.

XI – Não há pois dúvida nenhuma de que ocorreu um erro técnico na execução imputável ao Arquitecto não só porque não acautelou a colocação das sapatas e respectivas fundações à profundidade necessária, como também não executou (ou mandou executar) a referida ligação, não cumprindo assim o projecto de estabilidade, incorrendo desse modo em responsabilidade civil perante os Autores em consequência dos evidenciados erros de construção.

XII – Mais resultou provado dos pontos 26 e 28 da sentença recorrida que a moradia se tornou inabitável, e, em consequência, os Autores ficaram impossibilitados de usar o imóvel, designadamente, pelo perigo e risco de derrocada do alpendre e ainda pela falta de apoios estruturais ao nível da varanda, o que sucede desde meados do ano de 2007.

XIII – A privação do direito de uso e fruição integrado no direito de propriedade configura, por si só, uma desvantagem económica que se reflecte necessariamente no valor do mesmo.

XIV – Se como se refere na decisão recorrida, os Autores não lograram provar a frustração efectiva do arrendamento do imóvel, lograram, pelo menos, provar os danos emergentes resultantes da impossibilidade de habitar na moradia, nos termos do artigo 564º, nº 1, do Código Civil.

XV – Essa privação constitui um facto gerador da obrigação de indemnizar, uma vez que impede o seu dono do exercício dos direitos inerentes à propriedade, isto é, de usar, fruir e dispor do bem, nos termos consentidos pelo artigo 1305º do Código Civil.

XVI – Posto isto, ainda que não tenha provado, em concreto, o prejuízo relativo à privação do uso da moradia por parte dos Apelantes afigura-se-nos não se encontrar afastado o direito a serem indemnizados considerando o valor locativo mensal do imóvel, o qual deveria ter sido fixado equitativamente pelo Tribunal «a quo», nos termos do artigo 566º, nº 3, do Código Civil.

XVII – No caso sub judice resultou provado do ponto 20 da sentença recorrida que «por via dos defeitos referidos os Autores ficaram impedidos de se mudar para o prédio referido em 1 desde Maio de 2007».

XVIII – Tendo ficado igualmente provado que aquela moradia representava para os Apelantes um projecto de vida e um esforço financeiro que ainda mantêm ao continuarem a assumir o pagamento do empréstimo contraído junto da Caixa Geral de Depósitos para aquisição do imóvel, no montante de € 125.000,00.

XIX – Mais se acrescenta que não possuindo a moradia as mínimas condições de habitabilidade, nunca poderiam os Autores dar sequer o imóvel de arrendamento. Aliás, no caso em apreço, o dano não se traduz no facto de os Apelantes terem deixado de arrendar o imóvel devido aos defeitos da obra, pois que a construção em causa não se destinava ao arrendamento, mas sim a sua habitação própria e permanente.

XX – Do exposto conclui-se que os Autores têm direito a serem ressarcidos dos danos consubstanciados na privação do uso da moradia mediante o pagamento de uma indemnização correspondente ao seu valor locativo mensal a ser contabilizado desde Maio de 2007 e até à completa remoção dos defeitos que a impedem de habitar, em montante a fixar segundo juízos de equidade, ou, se assim se não entender, em quantia que se vier apurar em sede incidente de liquidação.

XXI – Pelo que, ao decidir da forma como o fez, o Tribunal «a quo», salvo o devido respeito, violou o disposto nos artigos 331º, nº 2, 342º, nº 2, 483º, 497º, 564º, nº 1, 566º, nº 3, 799º, 916º, nº 3, 918º e 1035º, todos do Código Civil.

Nesta conformidade deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida na parte que julgou caducado o direito dos Autores em exigirem a eliminação dos defeitos e a correspondente indemnização contra os vendedores e o Arquitecto (…), bem como na parte que não lhes reconheceu o direito de serem indemnizados pela privação do uso da moradia, substituindo-a por outra que condene solidariamente os Réus e o identificado chamado em tais pedidos e nos termos supra descritos, mantendo-se, em tudo o mais, o decidido, assim se fazendo Justiça!».

* Houve lugar a resposta que afirma que, perante a factualidade provada e face à sua fundamentação fáctica e jurídica, o recurso deve ser julgado improcedente.

* * Observados os vistos legais, foi admitido o recurso. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.

Analisadas as alegações de recurso, a questão que se suscita neste recurso é apurar se ocorreu erro de direito na interpretação das normas relativas à caducidade e à aplicação do regime de responsabilidade civil relativamente à privação do direito de uso.

* III – Factos com interesse para a decisão da causa: 3.1 – Matéria de facto provada[1]: Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos: 1 – Por escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca, datada de 11/04/2007, os Réus venderam aos Autores em comum e partes iguais, pelo preço de € 125.000,00, o prédio misto sito em Vale de (…), freguesia de (…), Concelho do Cartaxo, descrito na...

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