Acórdão nº 150/17.4YLPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelRUI MACHADO E MOURA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora
  1. 150/17.4YLPRT.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: (…) veio apresentar procedimento especial de despejo contra (…) e (…) para efectivação da cessação do arrendamento relativo ao prédio urbano sito em Arroteia de (…), actualmente União das Freguesias de Luz de Tavira e Santo Estêvão, concelho de Tavira, composto por moradia térrea com sala de estar, cozinha, quatro quartos, casa de banho, garagem e logradouro, com a superfície coberta de 140m2 e descoberta de 9260m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …/19860728 da freguesia da Luz, inscrito anteriormente na matriz urbana da freguesia da Luz de Tavira sob o artigo (…) e actualmente sob o artigo matricial (…), União das Freguesias de Luz de Tavira e Santo Estêvão. Cumulativamente, pede a condenação dos requeridos no pagamento da quantia de € 2.043,92 de rendas vencidas e não pagas, acrescida, a título de indemnização, de 100% da renda total devida, por cada mês, desde 01-08-2016 até à entrega do locado à Requerente e dos juros de moratórios à taxa legal de 4% ao ano sobre a totalidade dos referidos valores após a entrega do locado até integral pagamento. Fundamenta a sua pretensão na falta de pagamento das rendas devidas entre 01 de Maio de 2015 a 02 de Junho de 2016.

    Os Réus deduziram oposição, alegando, em síntese, que: - A requerente nunca emitiu um recibo de renda desde o início do contrato de arrendamento (em 01- 05-2011) até hoje, não obstante os requeridos repetidamente solicitarem, via telefone e correio electrónico, à requerente a emissão dos recibos de pagamento de renda, razão pela qual, encontrando-se a requerente em mora, podem os requeridos recusar o pagamento das rendas, enquanto a requerente não lhes entregar os recibos.

    - Estando a requerente/senhoria em mora, por se recusar a passar os recibos, não constitui fundamento de resolução do contrato a falta de pagamento das rendas no montante referido, nem a dívida importa a contagem de juros quer legais quer convencionais.

    - Sendo que os juros em questão, sempre deveriam ser contabilizados de harmonia com as taxas legais supletivas, nos termos do art. 559° do CC, ficando arredada qualquer hipótese de juros usurários, nos termos em que estes são definidos no art.º 1146°, n.º l, do CC, por referência ao art.º 559°-A do CC.

    Mais alegam: - A invalidade das cláusulas 4, 6, 7, 8, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 19 e 20 do contrato de arrendamento por se tratar de um contrato modelo em que a iniciativa da redacção das suas cláusulas não partiu do lado dos inquilinos, nem foi sujeita a uma discussão entre as partes, mas antes de um contrato previamente formulado pela senhoria, a que os arrendatários apenas aderiram, sem serem completamente informados do seu conteúdo na data da assinatura do mesmo e sem terem podido discutir o seu conteúdo.

    - A legislação aplicável ao contrato em questão é a lei portuguesa – e não a lei belga, escolhida pela requerente/senhoria para reger este contrato de arrendamento – por não corresponder a qualquer interesse sério da requerente e dos requeridos nem existir qualquer conexão entre a lei belga e o contrato, a não ser o facto da requerente residir em Bruxelas.

    - Não foram considerados no cômputo dos juros e das rendas pagas a cessação da mora com o pagamento no prazo de 8 dias a contar do seu começo nas diversas rendas pagas pelos requeridos para além do vencimento.

    - O recurso indevido ao procedimento especial de despejo com a consequente condenação da requerente no pagamento aos requeridos da quantia de € 4.500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos, e do valor dos honorários pagos às mandatárias dos requeridos, estimado em € 2.500,00 (+ IVA) e no pagamento de uma multa de valor não inferior a 10 vezes a taxa de justiça devida.

    Apresentados os autos à distribuição e recebidos estes, foi a Autora notificada para, no prazo de 10 dias, se pronunciar, querendo, sobre a matéria das excepções deduzidas.

    A Autora apresentou articulado de resposta nos termos e com os fundamentos de fls. 167 a 183, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos, pugnando pela improcedência da oposição e pela condenação dos Réus como litigantes de má-fé.

    Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida sentença que julgou verificada a excepção inominada da falta de pressupostos legalmente exigidos para a utilização do processo especial de despejo e, em consequência, absolveu os Réus da instância.

    Inconformada com tal decisão dela apelou a Autora, tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões:

  2. Não obstante o presente recurso ser sempre admissível independentemente do valor da causa e da sucumbência nos termos do disposto no art.º 15.º-Q do NRAU, a recorrente impugna o valor dado à causa pelo Tribunal, o qual deverá ser fixado em € 26.762,92 por força do disposto no art.º 26.º do DL n.º 1/2013, de 07.01.

  3. A sentença recorrida confunde a substância com a forma, confunde a lei reguladora da relação jurídica, com a forma de efectivar os direitos e as obrigações emanadas daquela relação jurídica. Os ritos das instituições competentes não mudam em função do direito aplicável.

  4. Quanto à determinação dos direitos e deveres recíprocos das partes na relação jurídica sub iudice (i.e., à substância) aplica-se a lei belga nos termos do Regulamento CE n.º 593/2008, de 17 de Junho de 2008 como refere a sentença recorrida; porém, quanto à forma de efectivar aqueles direitos, i.e., aos processos e procedimentos que o credor pode adoptar no país do foro competente (i.e., à forma), deve aplica-se a lei desse foro.

  5. Quando através das normas de conflitos se determina a aplicação de direito substantivo estrangeiro, apenas são aplicáveis dessa mesma lei estrangeira as normas que, pelo seu conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado pela regra de conflitos (art.º 15.º do C.C. e art.º 12.º do REGULAMENTO (CE) N.º 593/2008 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 17 de Junho de 2008 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I).

  6. Tendo determinado que ao caso sub iudice era aplicável o direito substantivo belga, deveria o Tribunal ter aplicado as normas substantivas deste ordenamento jurídico, nomeadamente a norma e princípio geral de direito de que qualquer das partes pode resolver o contrato com base em incumprimento da outra parte bem como a norma e o princípio geral de direito pacta sunt servanta e os seus corolários (o que não fez) em vez de ter declarado inaplicáveis ao caso concreto os art.ºs 1083º, n.ºs 3 e 4 e 1084º, n.ºs 1 e 2, do C.C..

  7. As disposições dos n.ºs 3 e 4 do art.º 1083.º do C.C. não podem ser entendidas a se mas têm antes de ser integradas ou consideradas em desenvolvimento do princípio geral de direito segundo o qual qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito, com base em incumprimento da outra parte previsto no n.º 1 do mesmo preceito legal.

  8. Em face das normas jurídicas e princípios gerais de direito acabados de enunciar, que correspondem a princípios de direito em geral vigentes (pelo menos) nas legislações ocidentais, as normas contidas nos n.ºs 3 e 4 do...

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