Acórdão nº 101/12.2PATNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelANA BARATA BRITO
Data da Resolução21 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal: 1.

No Processo n.º 101/12.2PATNV, da Comarca de Santarém, foi proferida sentença em que se decidiu condenar o arguido AP como autor de um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal do art. 3º, nº 2, com referência ao nº1, do D/L nº 2/98, de 3/1, na pena de 1 (um) ano de prisão efectiva.

Inconformado com o decidido, recorreu o arguido, concluindo: “1. O Tribunal a quo não refere se deu cumprimento ao disposto no artigo 333º, n.º 1 do Código de Processo Penal (CPP), na parte em que este preceito dispõe que «o presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência».

  1. Não obstante ter sido expedida notificação para a morada constante do termo de identidade e residência (TIR) prestado pelo Arguido, a verdade é que o ora Recorrente já não residia na morada constante do mesmo.

  2. Apesar de ter elementos suficientes para conhecer que o Arguido, ora Recorrente, não tinha efectivo conhecimento das datas de julgamento, o Tribunal a quo não ordenou a realização de qualquer diligência com vista a obter a comparência do Arguido, que não estava presente na hora designada para o início da audiência de julgamento.

  3. Enquanto o disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 61.º do CPP confere ao Arguido o direito a estar presente nos actos processuais que lhe disserem respeito, o n.º 1 do art.º 332.º do CPP estabelece a obrigatoriedade da presença do Arguido na audiência de julgamento.

  4. Donde resulta que a obrigatoriedade da presença do Arguido na audiência de julgamento só cessa com a observância do disposto nos referidos preceitos, e é imperativa quer para o Arguido, quer para o Tribunal, uma vez que as normas constantes do n.º 1 do art.º 332.º e dos n.ºs 1 e 2 do art.º 333.º do CPP são de interesse e ordem pública, prendendo-se com o cerne das garantias do processo penal e, por conseguinte, com a validade e eficácia do sistema legal processual penal.

  5. Pelo que, nos presentes autos não se verificaram os requisitos que excepcionassem a obrigatoriedade da presença do Arguido na audiência.

  6. Uma vez que, entende o Arguido, ora Recorrente, que o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 332.º, n.º1 e 333.º, n.º1, ambos do CPP ao determinar o início da audiência na ausência do Arguido sem ordenar a realização de qualquer diligência para obter a sua comparência.

  7. Tanto mais que já existiam no processo elementos que permitissem ao Tribunal pelo menos desconfiar que o Arguido já não residia na morada indicada no TIR.

  8. Não tendo o Arguido conhecimento das datas da audiência de julgamento, uma vez que a carta para a sua notificação não lhe foi entregue.

  9. Da análise do n.º 1 do art.º 333.º do CPP resulta, que na data designada para a realização da audiência de julgamento, se o Arguido regularmente notificado não estiver presente na hora designada para o início da audiência, o Tribunal ou adia a audiência, ou toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do Arguido na audiência.

  10. Não sendo adiada a audiência, por o Tribunal não considerar absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material a presença do Arguido na mesma, deve o presidente tomar as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do Arguido faltoso.

  11. Conforme já decidido no douto aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 02/05/2007, no processo 07P1018 em que foi relator o Ilustre Conselheiro Pires da Graça.

  12. Apesar de o Arguido não ser obrigado a prestar declarações sobre os factos, não deixa de ser obrigatória a sua presença na audiência de julgamento, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 333.º e nos n.ºs 1 e 2 do art.º 334.º do CPP, a verdade é que o mesmo pode querer prestar declarações sobre os factos, colaborar com a realização da justiça e com a descoberta da verdade material e fornecer ao Tribunal os demais elementos necessários à ponderação de uma eventual pena, como sejam as suas condições socioeconómicas.

  13. Sendo a responsabilidade criminal meramente individual, e estando o Tribunal precisamente a avaliar essa responsabilidade criminal, a comparência obrigatória do Arguido torna-se necessária ao exercício do contraditório.

  14. A realização da audiência no circunstancialismo em que ocorreu, colide com o exercício pleno do direito de defesa do Arguido e do princípio da procura da verdade material que se impõe ao julgador.

  15. Repare-se que não só o Tribunal a quo não ordenou a realização das diligências necessárias a obter a comparência do Arguido na audiência, como não ponderou sequer sobre a viabilidade dessas diligências, e podia e devia ter ponderado, porque apuraria que o Arguido tinha mudado de residência, e se ordenasse a sua comparência sob detenção, tal seria conseguido.

  16. O Arguido mudou efectivamente de morada, sem que se tenha lembrado de o comunicar ao Tribunal. Mas esse esquecimento do Arguido não pode justificar que o presidente não tenha tomado as diligências necessárias para assegurar a sua comparência, quando lhe era imposto.

  17. Dispõe o art.º 118.º, n.º 1 do CPP que a violação ou a inobservância da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei.

  18. A alínea c) do art.º 119.º do CPP estabelece que constitui nulidade insanável, que deve ser oficiosamente declarada em qualquer fase do procedimento, a ausência do Arguido nos casos em que a lei exigir a sua comparência.

  19. Outra decisão não resta senão declarar nula a audiência de julgamento nos termos do art.º 119.º, alínea c), por violação do disposto nos artigos 332.º, n.º1 e 333.º, n.º 1, ambos do CPP.

  20. Não obstante, o Arguido ter sido julgado na sua ausência, os autos não contêm o relatório social sobre as condições pessoais do Arguido, nem qualquer outra prova foi obtida ou procurada obter sobre a personalidade do condenado.

  21. Os antecedentes criminais são assim os únicos factos pessoais provados que constam da Douta decisão condenatória.

  22. O Tribunal a quo desconhece a pessoa do Arguido e não fez qualquer esforço para adversar esse conhecimento, bastando-se com a informação constante no C.R.C.

  23. Quando o art.º 71 do CP manda atender, na determinação concreta da pena, “às condições pessoais do agente e a sua situação económica” e à “a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime.

  24. O Tribunal a quo quando encerrou a produção de prova, avançou de imediato para a elaboração do acórdão, sem pelo menos, tentar obter informação sobre o Arguido.

  25. Podendo ter obtido essa informação se tivesse designado nova data para a audição, ou se até inclusivamente tivesse insistido na elaboração do relatório social junto da DGRS - Direcção-Geral de Reinserção Social, recolhendo assim mais elementos necessários à boa decisão, podendo até inclusive descortinar a nova morada do Arguido.

  26. As necessidades de celeridade processual não se podem sobrepor nem prejudicar a averiguação da verdade material, nem sequer à eventual ponderação da decisão, e muito menos encerrar a discussão da causa, sem que se tivesse esgotado todas as possibilidades de averiguar factos relevantes para o douto acórdão.

  27. Pois, é auferível que um acórdão não se pode bastar com o conhecimento dos antecedentes criminais do condenado, ocorrendo uma omissão de factos relevantes para a determinação da sanção.

  28. Pelo que, o Tribunal lavrou acórdão ferido do vício de insuficiência da matéria de facto provada do art. 410.º n.º 2, al. a) do Código de Processo Penal.

  29. Deveria desse modo o Tribunal a quo, ter solicitado a realização do relatório social, e ao não o ter feito, encerrou a produção da prova sem os necessários elementos fáticos relativos às condições de vida e personalidade do Arguido, cometeu a nulidade prevista no artigo 120.º, nº 2, al. d) do Código de Processo Penal.

    Por mero dever de patrocínio, mas sem conceder nos argumentos anteriormente referidos, sempre se dirá que, 31. Da sentença a quo demonstra-se também, que apesar de o arguido ser condenado pela prática do crime de condução sem habilitação legal, a pena aplicada de 6 (seis) meses de prisão, deveria ter sido substituída pela pena de multa.

  30. Estando assim em causa até, a violação do art. 40º CP, na medida em que se encontra em causa a reintegração do arguido na sociedade, já que na aplicação da pena, além de não só se reforçar as expectativas da comunidade, que viu um bem jurídico ser desconsiderado, tem que se por em causa a reintegração social do arguido.

  31. Assim, além de o arguido já deter condenações anteriores...

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