Acórdão nº 524/14.2 PBSTR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR BOTELHO
Data da Resolução10 de Abril de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I – RELATÓRIO 1. 1. – Decisão Recorrida No processo comum colectivo nº 524/14.2 PBSTR do Juízo Central Criminal de Santarém – J4 do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, mediante acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento o arguido PG, melhor identificado nos autos, pela prática de um crime de abuso sexual de crianças agravado de trato sucessivo, p. e p. pelos artºs 171.º, n.ºs 1 e 2, e 177.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal.

Realizado o julgamento, foi proferido acórdão que, a final, decidiu nos seguintes termos: «Condenam o arguido PG como autor material e em concurso real, de cinco crimes de abuso sexual de criança, p. e p. pelo art. 171º nº 2 e 177º nº 1 al. a) do CP, nas penas parcelares de quatro anos e seis meses de prisão, para cada um desses crimes; Em cúmulo jurídico destas penas parcelares, condenam o mesmo arguido, na pena única de nove anos e seis meses de prisão.

Mais, condenam o arguido nas custas, fixando a Taxa de Justiça em 4 Ucs - arts. 513º e 514º do CPP e art. 8º nº 9 do Regulamento das Custas Processuais.

Julgam o pedido cível formulado por IG parcialmente provado e procedente e, em consequência, condenam o responsável civil PG a pagar à lesada a quantia de € 40.000,00, a título de compensação por danos não patrimoniais, acrescidos dos juros de mora, desde a data do trânsito em julgado da presente decisão, até integral pagamento, absolvendo o responsável civil do remanescente do pedido.

Custas, nesta instância cível, a cargo do responsável civil e da lesada, na proporção dos respectivos decaimentos – art. 526º do CPC».

1. 2. – Recurso 1.2.1. – Inconformado com essa decisão, dela recorreu o arguido, pugnando pela sua revogação e substituição por outra que altere parte da factualidade considerada provada e o condene tão só pela prática de um crime de abuso sexual de criança agravado de trato sucessivo, p. e p. pelo n.º 1 do art.º 171.º e art.º 177.º, n.º 1, alínea a), do C. Penal, em pena de prisão não superior a 5 anos, suspensa na sua execução. Quanto à indemnização civil, sustenta o recorrente que deve ser fixada em valor que não ultrapasse os cinco mil euros.

Finaliza a sua motivação com as seguintes conclusões: «I - O recorrente PG foi condenado pela prática de cinco crimes de abuso sexual de criança, p. e p. pelo art.º171 n.º 2 e art.º 177 n.º 1 al. a) do Código Penal, nas penas parcelares de quatro anos e seis meses de prisão, para cada um desses crimes, e em cúmulo jurídico dessas penas parcelares, foi o arguido condenado na pena única de nove anos e seis meses de prisão. E, bem ainda, a pagar à lesada IG a quantia de €40.000,00 a título de compensação por danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora desde a data do transito em julgado, até integral pagamento.

II – Entende o arguido que foi incorretamente julgada a matéria de facto, o que determinou que fosse condenado num tipo de crime e pena, que se a matéria de facto tivesse sido corretamente julgada impunha decisão diversa. O Tribunal a quo deu como provados, vários factos constantes da acusação, tendo sido produzida prova em sentido contrário, por outro lado omitiu ainda factos que deveriam ter sido dados como provados e não o foram.

III - O Tribunal a quo deu como provado os seguintes factos: 9. …. despiu I. da cintura para baixo; 12. …. colocou o pénis dentro do ânus da filha; 15. Esta situação repetiu-se mais quatro vezes…; 16. … numa desta cinco ocasiões distintas, a penetração do ânus … pelo pénis do arguido …..; 20. …. introduziu o seu pénis no ânus da filha; 25. O arguido quis praticar os actos … penetrar o ânus da filha, com o seu pénis…; 32. O arguido confessou grande parte dos factos, ….. introduziu o seu pénis erecto no ânus da sua filha,…; 45. Em resultado dos actos sexuais praticados pelo arguido e descritos em 8. A 31., a I. sofreu dores na zona genital;46. A I. chora de forma intensa, quando instada a recordar tais acontecimentos; 47. O seu percurso escolar foi afectado, tendo ficado retida no 2.º ano de escolaridade. 61. A I. não voltou a estar com o pai; 62. E não quer voltar a estar com ele.

IV – O tribunal formou a sua convicção na análise comparada das declarações do arguido; nas declarações para memória futura da menor; das testemunhas, complementadas com a reportagem fotográfica de fls. 72 a 76; ficha de sinalização de fls. 47 e 48; relatório completo de urgência de fls. 50 e 51; perícia médico-legal de fls. 88 a 92, de fls. 241 a 245 e de fls. 248 a 252; e exame de avaliação psicológica de fls. 336 a 344.

V - Há contradição entre os factos provados, as declarações e documentos juntos, e bem ainda com a fundamentação apresentada pelo Tribunal a quo, senão vejamos: Das declarações do arguido resulta que “…Foi ela é que se despiu …”, “ Quanto aquilo que aqui se diz que o senhor introduziu o pénis no ânus da sua filha, isto é verdade? Não; Nunca aconteceu? Não” (20170202101515_2643844_2871704) – aos 8:55;16:19; 1:33; 5:20; 13:28 Das declarações para memória futura da menor resulta: “E pôs a pilinha a onde? No rabo; E magoou-te? Não; Fez do-doi?? Não; Nenhuma vez fez doi-foi? Não; Se alguma vez o pai mexeu em algum destes sítios que está aqui? Não, não mexeu em nada; Olha e era sempre igual as coisas que ele fazia ou às vezes era diferente? Era sempre igual; Olha e no rabinho não magoou? Não. (20150909101410_3606114_2871288) – aos 16:52; 17:44; 19:20; 20:49 Da reportagem fotográfica de fls. 72 a 76, não resulta que o mesmo “…despiu I da cintura para baixo”, tenha colocado “…o pénis dentro do ânus da filha…”, e que “…Esta situação repetiu-se mais quatro vezes…” Da ficha de sinalização de fls. 47 e 48 fluí “Sem sinais visíveis de lesões traumáticas recentes.”, nada mais sendo observado na menor, pela técnica, e com relevo para os autos.

Do relatório completo de urgência de fls. 50 e 51 brota “sem alterações visíveis, nomeadamente sugestivas de lesão traumática recente” Da perícia médico-legal de fls. 88 a 92; de fls. 241 a 245 e de fls. 248 a 252: Do exame objectivo de lesões e/ou sequelas relacionais com o evento, a nível da região anal e peri-anal, “Não se observam lesões ou sequelas sugestivas de traumatismo.” – fls. 91 (página 4 da Perícia Médico Legal) .

Do exame de avaliação psicológica de fls. 336 a 344 não resulta que o arguido tenha penetrado, com o seu pénis, o “…ânus da IG...” e muito menos em “…cinco ocasiões distintas...” Do depoimento da técnica R. resulta que (…) às vezes as crianças mais novas quando há, eu acredito pelo exame médico-legal, pelos resultados, não terá havido uma penetração completa, até porque pela idade uma penetração completa com o pénis erecto provavelmente deixaria outro tipo de sequelas. (…) terá havido aqui um contacto, com uma tentativa de penetração, o que ela sentiu foi por a pilinha no rabo. (…) elas não têm muita noção se entrou ou não entrou, (…) e dizem “meteu”. (…) Dentro não posso afirmar, (…), eventualmente até pode ter sido só encostar (…) Não há danos, não há sangramento e por tanto acredito, até pelo relatório médico-legal, que não tenha havido propriamente uma penetração, agora todo indica que terá havido um contacto.” (2017020220627_2643844_2871704) – aos 11:00 VI - Posto isto, não poderá o Tribunal a quo concluir que o arguido 9. …. despiu I. da cintura para baixo; 12. …. colocou o pénis dentro do ânus da filha; 15. Esta situação repetiu-se mais quatro vezes…; 16. … numa desta cinco ocasiões distintas, a penetração do ânus … pelo pénis do arguido …..; 20. …. introduziu o seu pénis no ânus da filha; 25. O arguido quis praticar os actos … penetrar o ânus da filha, com o seu pénis…; 32. O arguido confessou grande parte dos factos, ….. introduziu o seu pénis erecto no ânus da sua filha,…; sendo a prova produzida contraditória como vem vertido nos factos provados do, aliás, douto acórdão.

VII – Quanto à matéria de Facto Provada – Pontos 45., 46., 47., 61. e 62. resultou do depoimento da técnica R que “A I é uma criança com um desenvolvimento adquado e esperado para a idade que ela tinha na altura, que era 9 anos.”; Não há danos, não há sangramento e por tanto acredito, até pelo relatório médico-legal, que não tenha havido propriamente uma penetração, agora todo indica que terá havido um contacto.” (2017020220627_2643844_2871704) – aos 4:18; 12:35.; das declarações para memória futura da menor que “Tu não vais visitar o teu pai a Santarém? Não, só telefono, é muito longe.

(20150909101410_3606114_2871288) – aos 2:52 ; das declarações do arguido, que o aresto em crise é omisso nesta parte, “Desde então o senhor não voltou a estar com a sua filha sem ser na presença de 3.ªs pessoas ? Uma vez fui jantar com ela e com a mãe perto da casa delas, onde elas moram em Massamá; Já depois destes acontecimentos? Sim, foi no ano passado. E a mãe já sabia o que é que se estava a passar? Já, já, já estava o processo em tribunal (…) (20170202103509_2643844_2871704) – aos 7:35 VIII - É manifesta, pois, a violação do disposto nos artigos 127.º do C.P.Penal e 205.º, nº 1 da C. R. Portuguesa no aresto em crise, salvo melhor opinião, há erro notório na apreciação da prova, portanto as provas revelam um sentido e a decisão recorrida extrai ilação contrária, quanto à matéria de facto provada, de outra banda, os documentos juntos aos autos (relatório, perícias médicas e exame de avaliação) são insuficientes para a decisão da matéria de facto provada, IX - O arguido faz a impugnação ampla da matéria de facto, nos termos do art. 412.º n.º 3 e 4 do C. P. Penal, devendo a apreciação deste recurso alargar-se à análise da prova produzida em audiência, dentro dos limites do ónus de especificação imposto no supra citado preceito legal, considerando incorretamente julgados os factos dados como provados nos Pontos 9., 12., 15., 16., 20., 25., 32.,45., 46., 47., 61. e 62, que em qualquer caso, a dúvida sobre tal facto deverá ser sempre resolvida a favor do arguido, e não contra o...

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