Acórdão nº 9002/16.4T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelANA MARGARIDA LEITE
Data da Resolução12 de Abril de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: 1.

Relatório AA intentou a presente ação declarativa, com processo comum, contra BB, pedindo: a) a condenação da ré a pagar ao autor o montante de € 7089,22, acrescido de juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento e dos montantes que se apurarem em audiência de julgamento, sem prejuízo do direito à indemnização suplementar que se entenda devida, nos termos prescritos no n.º 2 do artigo 71.º. do DL n.º 317/2009, de 30-10; b) caso assim se não entenda, deve a ré ser condenada a restituir ao autor a quantia de € 5089,22, acrescida de juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento e dos montantes que se apurarem em audiência de julgamento, sem prejuízo do direito à indemnização suplementar que se entenda devida, nos termos prescritos no n.º 2 do artigo 71.º. do DL n.º 317/2009, de 30-10; c) caso assim se não entenda, deve a ré ser condenada a restituir ao autor a quantia de € 5089,22, acrescida de juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento, sem prejuízo do direito à indemnização suplementar que se entenda devida, nos termos prescritos no n.º 2 do artigo 71.º. do DL n.º 317/2009, de 30-10.

Alega, para o efeito, que é titular de uma conta bancária aberta em balcão de atendimento da ré sito em Setúbal e aderiu ao serviço de homebanking, o qual foi utilizado por terceiros para movimentar a indicada conta sem autorização do autor, tendo-lhe sido subtraídas as quantias de € 1998 e € 2000, retiradas na indicada conta e creditadas em conta bancária da titularidade de pessoa que identifica, mas que desconhece; sustenta que as operações em causa ocorreram por violação dos sistemas de segurança da ré e causaram-lhe danos patrimoniais e não patrimoniais, que pretende sejam indemnizados, como tudo melhor consta da petição inicial.

A ré contestou, impugnando parte da factualidade alegada pelo autor e imputando-lhe a responsabilidade pelo acesso de terceiros à respetiva conta bancária, pedindo a absolvição do pedido.

Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador e fixado o valor da causa, tendo igualmente sido dispensada a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido formulado pelo autor.

Inconformado, o autor interpôs recurso desta decisão, pugnando para que seja revogada e substituída por outra que julgue a ação procedente, terminando as alegações com a formulação das conclusões que se transcrevem: «I. O presente Recurso vem interposto de Sentença do dia (…) 28.06.2017, aquando da subsunção dos factos ao direito, conclui o Tribunal a quo, em síntese, que, não obstante o Autor tenha sido vítima de uma conduta ardilosa praticada por terceiros, criando no mesmo a convicção de estar a aceder à sua conta bancária no verdadeiro site da Ré, atuou o mesmo com negligência grosseira ao fornecer as coordenadas do seu cartão matriz.

  1. Nesta senda, entende a Sentença ora em crise, tendo a Ré logrado provar a aludida negligência grosseira, por força dos avisos de segurança que dispõe no seu site, os quais merecem a atenção do utilizador diligente, conclui-se que, cabe ao mesmo utilizador, in casu, o Autor, «de acordo com o regime previsto no supra citado art. 72.º do D.L. n.º 217/2009, suportar as perdas resultantes de operações de pagamento não autorizadas até ao limite do saldo disponível».

  2. A final, e «[e]m face dos fundamentos de facto e de direito supra expostos, o Tribunal julga a ação totalmente improcedente e, consequentemente, decide absolver a ré BB do pedido formulado pelo autor». (Destaque no original) IV. Contudo, não pode o Autor e ora Recorrente conformar-se com tal decisão.

  3. Porquanto, entende o ora Recorrente que a douta Sentença encontra-se viciada na apreciação da matéria facto assente, em conformidade com o exposto infra, devendo ser aditada e alterada a matéria de facto dada por assente. Vejamos, VI. Entende o Recorrente que resultou claro do depoimento da Testemunha Pedro …, o qual foi direto e conciso nas suas respostas enunciadas em sede de audiência de julgamento e, portanto, manifestamente credível que «[o] computador doméstico do autor estava dotado do sistema operativo Microsoft XP, e devidamente munido por programa de antivírus.» VII. Mais disse aos autos, que ele próprio, mestrando em sistemas de informação, foi quem construiu e tomava conta do computador, tendo portanto, perfeito conhecimento das condições em que o mesmo se encontrava. E, por seu turno, não provou a Ré, nos termos do artigo 499.º do Código Civil, que o evento lesivo se havia registado por força de vírus informático no computador do Recorrente VIII. Ora, considerando que a prova é reputada por livremente apreciada quando sujeita ao escrutínio das regras da lógica e da experiência, as quais requerem uma racional justificação e não uma intuída constatação, em conformidade com o disposto no artigo 607.º, n.º 4 e n.º 5, do CPC, e que a Sentença ora em crise não fundamenta cabalmente o motivo pelo qual considera a testemunha pouco crível, mais não será de concluir do que o facto de o computador do Recorrente estar munido de sistema de antivírus atualizado.

  4. Acresce ainda que, entende o Recorrente que, da prova produzida nos presentes autos, em concreto, em declarações de parte bem como, em depoimentos prestados pelas testemunhas da Recorrida, resultou claro que o autor não foi advertido sobre a possibilidade de os sistemas da ré virem a ser corrompidos ou foi instruído no sentido de compreender como detetar essa (tentativa de) fraude informática.

  5. Assim, esclarece o Autor que em dezembro de 2014, ao celebrar o contrato de adesão, apenas lhe foi entregue o clausulado, nada lhe tendo sido advertido quanto às regras de segurança, para mais, após o mesmo ter logrado descrever que o seu acesso tinha sido bloqueado após aceder à sua conta por um link do seu email, como sempre o fez, e depois de algumas tentativas foi o mesmo acesso bloqueado. Por seu turno, a Testemunha José …, funcionário através do qual foi celebrado o contrato de adesão, não manifestou certeza de ter cumprido com os deveres de informação impostos pelo disposto nos artigos 5.º a 7.º da Lei das Cláusulas contratuais Gerais.

  6. Ademais, Testemunha Pedro … após confrontado sobre o facto de os documentos juntos aos autos pela Recorrida, print screen´s dos avisos no seu site institucional, consubstanciarem informação atualizada com data posterior ao evento lesivo, e inquirido sobre se tinha a certeza de que aqueles eram os mesmos que se encontravam publicados site da Ré à data dos factos esclarece que não se recorda se eram os mesmos a data dos factos objeto da ação dos autos.

  7. Acresce ainda que, a Recorrida não logrou provar, nos termos do disposto no artigo 70.º do RSPME e artigo 799.º do Código Civil, que, por um lado, não foi vítima de qualquer ataque informático aos seus site, limitando-se nesta sede, ao depoimento de Daniel …, técnico informático do departamento de auditoria da Ré, não obstante o Recorrente comprovar que 85 clientes da recorrida foram alvos de ataques no período de um ano.

  8. Entende ainda o Recorrente que dos autos não resulta qualquer prova, pela qual se encontra onerada a Recorrida, de que o Recorrente forneceu na internet todas as coordenadas que se encontram inscritas no cartão matriz, o que achou estranho porque não conseguiu concretizar a operação bancária que pretendia nem recebeu a mensagem de bloqueio de sistema.

  9. Entende ainda o Recorrente que, da conversa a Ré detetou a situação fraudulenta, - inclusivamente, antes do Autor se conseguir aperceber de que havia sido realizada uma transferência bancária, operação essa que apenas foi detetável pelo Autor através de uma busca específica na sua conta on-line, quando instruído pela Ré, porquanto já havia tomado conhecimento do modus operandi dos agentes do crime XV. Bem como, do depoimento das testemunhas da recorrida, que a mesma tem acesso às contas bancárias dos clientes, podendo manter cativo montantes ali creditados, bem como, reverter os mesmos e, in casu, informou o Autor que ia interditar os montantes transferidos.

  10. Resulta ainda quer do mesmo contacto telefónico quer do depoimento da Testemunha José … que a Recorrida tinha conhecimento do modus operandi da titular da conta bancária acima identificada e que aquela conta servia de veículo (money mules) para satisfazer outros fins, que não os da própria titular.

  11. Assim, a Recorrida, através de funcionária de cal center, comprometeu-se, desde logo, ainda que verbalmente, a não permitir a movimentação, a partir da conta da titularidade de Alexandra …, do montante que havia sido indevidamente debitado da sua conta, o que decorre quer do contacto telefónico gravado, quer das declarações do Recorrente.

  12. E, no referido contacto telefónico, cuja gravação se encontra nos autos, a Recorrida tomou conhecimento, expresso, portanto, foi devidamente notificada pelo cliente na manhã de 12.01.2015, que a referida operação bancária não havia sido concretizada com a autorização do seu aparente ordenante.

  13. A qual, não logrou adotar qualquer procedimento para bloquear a conta da beneficiaria da operação bancária porque, em conformidade com o testemunho do funcionário da Recorrida Pedro …, de acordo com as regras de procedimento interno, necessitavam da cópia do auto policial da denuncia do Recorrente.

  14. Em suma, resulta claro dos autos que a Recorrida sabia que os seus clientes estavam a ser alvo de ataques informáticos e que outros dos seus clientes eram «mulas», isto é, utilizavam contas bancárias tituladas na Ré para produção dos eventos lesivos e, quando se deparou com uma transferência suspeita, o caso em apreço nos autos, nada fez.

  15. Pretende, assim, o Recorrente que sejam aditados ao elenco da matéria de facto julgada por provada, os factos que a seguir se descrevem: 9. O computador...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT