Acórdão nº 125/15.8GFELV-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA ISABEL DUARTE
Data da Resolução06 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. N.º 125/15.8GFELV-A.E1 Reg. N.º 1036 Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1.

Nos autos de Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular, n.º 125/15.8GFELV, do Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre - Juízo Local Criminal de Elvas, foi interposto o recurso, pelo arguido, BB, do despacho proferido no decurso da sessão da audiência de discussão e julgamento, de 07 de Junho de 2017, que considerou como não verificada a nulidade insanável, invocada pelo recorrente, referente à obrigatoriedade de assistência de defensor em sede de constituição e interrogatório de arguido, pelo OPC, determinando o prosseguimento dos autos.

  1. As conclusões da motivação de recurso, são as seguintes: ”1. Foi proferido despacho judicial, a 07 de Junho de 2017, no Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, Juízo Local Criminal de Elvas, de indeferimento, relativamente a requerimento apresentado pela defesa, em acta, no qual se arguia a nulidade insanável, nos termos dos Arts. 119, alínea c) e 64º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Penal, por via da condição de analfabetismo declarado espontaneamente pelo Recorrente, BB, porquanto, este não se fazia acompanhar de defensor, em sede de interrogatório, junto do respectivo OPC, desconhecendo tal obrigatoriedade à data; 2. Tal nulidade, na sequência de promoção da Digna Senhora Magistrada do Ministério Público, tendo não obstante admitido a sua existência, foi por si absolutamente desvalorizada desde logo, salvo elevadíssimo respeito; 3. Por seu turno, o Tribunal a quo suporta e sufraga o seu despacho, não fundamentado, aliás, que ordena o prosseguimento da Audiência de Discussão e Julgamento, em sede da literacia do Recorrente, tendo por base, uma simples fotocópia também ela simples, de uma licença de condução caducada, de que este havia sido titular, que fez juntar posteriormente ex officio aos autos, no início da segunda sessão, a 07 de Junho de 2017; 4. Foi requerido pela defesa, também em acta, a submissão do arguido Recorrente a perícia científica forense, no sentido de se aferir da sua literacia, promovendo, desde logo, a Digna Senhora Magistrada do Ministério Público pela ineficácia desta requerida perícia, porquanto o arguido seria capaz de enganar facilmente o perito nomeado (termos da responsabilidade da defesa mas que reproduzem o conteúdo, latitude e alcance da referida promoção, conforme melhor se alcança da gravação da Audiência de Discussão e Julgamento, não reproduzida nem transcrita em acta, mas para ela remetendo), 5. O Tribunal recorrido sufragou a douta promoção, indeferindo o requerido; 6. A M.ma Juiz a quo, face ao elemento junto oficiosamente aos autos (cópia simples de licença de condução caducada, de que havia sido há anos titular o Recorrente), conclui, tout court, que o arguido não é analfabeto; 7. Para o douto Tribunal a quo, implícita mas obviamente, teria o Recorrente logrado «enganar» o Tribunal (expressão nossa, jamais proferida pelo Tribunal) ao invocar essa sua situação; 8. No entendimento do Tribunal a quo, a titularidade pretérita de uma licença de condução seria, pois, elemento suficiente para afastar de todo e imediatamente a condição de analfabetismo do Recorrente; 9. Entende, o arguido Recorrente, não serem suficientes os pressupostos tidos pelo Tribunal em consideração para afastar a arguida nulidade insanável da aludida diligência e consequente processo na sua plena amplitude em superveniência; 10. O arguido declarou peremptoriamente ser analfabeto, não saber ler nem escrever, portanto, mas apenas assinar, apesar de ter frequentado a antiga 2ª classe; 11. Mais declarou que, quando o senhor agente da G.N.R., do Posto de …, lhe exibiu o auto, contendo as suas declarações, o informou que não ia assinar «uma coisa» cujo conteúdo e teor desconhecia por ser analfabeto, oferecendo resistência a tal subscrição, mas tendo porém sido ameaçado se o não fizesse; 12. O senhor agente, segundo declarou, tê-lo-á «obrigado», a assinar tal documento, mais o ameaçando de que se o não fizesse «levaria mais»; 13. As declarações prestadas e lavradas em auto de interrogatório, segundo declarou o Recorrente, também não lhe foram lidas; 14. As declarações do arguido, com gravíssimo impacto, aliás, do ponto de vista do escrupuloso cumprimento do formalismo jurídico-processual penal e da salvaguarda dos mais elementares direitos penais e constitucionais que ao Recorrente assistem, enforma um vício insanável no processo com o qual não pode conformar-se; 15. Tendo em conta que, consultados os autos, se verifica não ter o arguido sido acompanhado de defensor no âmbito do interrogatório prestado perante OPC (Posto da GNR de …), o que foi objecto de requerimento da defesa, que suscitou e arguiu a nulidade (insanável) da diligência, com todas as consequências legais subjacentes; 16. Perante tal, o douto Tribunal a quo, interrompeu os trabalhos a 08 de Maio e, em 07 de Junho de 2017 (data da segunda sessão), declarou reaberta a Audiência e retomou, assim, os trabalhos, não proferindo qualquer despacho fundamentado, a saber. Sem mais!; 17. Fez juntar aos autos uma fotocópia simples de uma carta de condução caducada, cuja titularidade era, de facto, do arguido Recorrente, mas não lha exibindo sequer, sendo certo que a defesa não se opôs a tal junção e prescindiu também do prazo de vista; 18. O Tribunal recorrido partiu de um falso pressuposto, ressalvado devido respeito, para si lógico e «matemático-jurídico» tendo como conclusão de que quem detém ou deteve uma licença de condução sabe, necessária e obrigatoriamente, ler e escrever; 19. Conclusão, aliás, no modesto entendimento do Recorrente, absolutamente errada e desprovida de fundamento com suficiência bastante que lhe imprima e ofereça suporte jurídico e consubstancie uma certeza factual inabalável; 20. Não tendo, como aludido, interpelado o arguido sobre tal matéria, exibindo-lhe o documento (cópia simples da sua carta de condução caducada), com o qual não foi confrontado, a fim de aferir se, de facto, lhe era pelo menos familiar tal documento e exigir esclarecimentos relativamente à titularidade de uma carta de condução, embora antiga e caducada, em face das suas declarações no que ao seu analfabetismo concerne; 21. O Tribunal a quo, deveria ter pedido, salvo melhor entendimento e elevado respeito, ao arguido Recorrente, que explicasse como se afirmava analfabeto «hoje», havendo sido portador e titular de uma carta de condução há anos, sem, contudo, o ter feito e concluindo pela literacia (não analfabetismo) do Recorrente peremptoriamente; 22. O despacho proferido pela M.ma Juiz a quo, objecto do presente Recurso, que desvalorizou as declarações do arguido Recorrente nesta latitude processual e permitiu a continuação da Audiência de Discussão e Julgamento, carece de qualquer fundamentação; 23. Sendo que, no modesto entendimento do Recorrente, possuir, ou ter possuído, um título de condução válido, não pode conduzir à ideia sumária mas conclusiva de que alguém sabe ler e escrever!; 24. Nenhum Tribunal português, salvo devido respeito, poderá assim concluir taxativamente; 25. O Tribunal a quo, ora recorrido, assim concluiu desde logo, com certeza, não considerando sequer a dúvida acerca do analfabetismo declarado pelo Recorrente, sem fundamentar o seu douto despacho; 26. Ora, é consabido que existem em Portugal, sobretudo em indivíduos de etnia cigana, mas não...

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