Acórdão nº 14/18.4GDEVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelANA BACELAR CRUZ
Data da Resolução22 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I. RELATÓRIO No processo sumário n.º 14/18.4GDEVR, do Juízo Local Criminal de Évora [Juiz 1] da Comarca de Évora, o Ministério Público acusou JJ, solteiro, vaqueiro, nascido a 20 de setembro de 1967, em Évora, filho de…, residente no Monte …, Valverde, em Évora, pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 292.º e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.

Não foi apresentada contestação escrita.

Realizado o julgamento, perante Tribunal Singular, por sentença proferida e depositada a 1 de fevereiro de 2018, foi decidido: «(…) julgo improcedente a acusação deduzida pelo Ministério Público e, consequentemente:

  1. Absolvo o arguido JJ pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.

    Sem custas processuais criminais.» Inconformado com tal decisão, o Ministério Público dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1. Impugna-se o Facto A) constante da factualidade provada, na redação que lhe é dada na douta sentença recorrida - o que se consigna para efeitos do disposto no art. 412º, n.º 3, aI. a) do CPP.

    1. O Tribunal tia quo" incorreu em erro de julgamento porquanto deveria ter julgado PROVADO que "No dia 29 de Janeiro de 2018, pelas 19J{39, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matricula -TQ nas proximidades do Hospital 'Veterinário da 'Universidade de Évora sito na zona da Mitra, sendo a condução exercida mais concretamente na estrada principal que liga 'Valverde à EN 380”.

    2. Aquele facto, nesses termos (isto é, quanto ao local onde o arguido exercia a condução ao momento da interceção pelo OPC), resulta da prova produzida em julgamento, indicando-se, em cumprimento do disposto no art. 412.º, n.º 3, aI. b), do Cód. Proc. Penal. as seguintes passagens das declarações prestadas pelo arguido e pela testemunha, salientando as seguintes passagens: a.

      declarações do arguido, gravação da audiência entre o minuto 2' 16" e o minuto 2' 56", resultando destas que a fiscalização policial ocorreu, por palavras do próprio arguido, "Na Mitra. Ao pé de Valverde. Não é uma rua. É uma estrada principal. É de '«Valverde para Évora.” b.

      declarações da testemunha PP, militar da GNR, gravação da audiência entre os minutos 01’ 07" e 1’ 18", 01’ 45" e 2' 40", 3' 18" e 3' 38", 3' 48" e 4' 28", resultando destas que a fiscalização policial ocorreu, “junto ao Hospital Veterinário da Universidade de Évora, portanto, em Valverde”, “Aquilo é (impercetível) localidade de Valverde, portanto em direção ao Hospital Veterinário (…); caminho “Público, público”; em termos de definição de estrada, “é a que liga Valverde à Nacional 4. Não se ignora que a redação daquele facto naqueles termos traduz um facto novo relativamente à acusação deduzida.

    3. A lei admite, porém, que a sentença considere factos novos entre a factualidade assente desde que sejam introduzidos mediante o cumprimento dos mecanismos previstos no arts. 358.º e 359.º do CPP, consoante se tratem, respetivamente, de factos que alterem não substancialmente ou substancialmente os descritos na acusação.

    4. Nesta medida, e porque o facto enunciado na conclusão 2) configura uma alteração não substancial de factos, bastaria que a Mm" Juiz cumprisse o estatuído no art. 358.º, n.º 1 do CPP previamente à introdução do mesmo na douta sentença - isto é, comunicasse aquele ao arguido, concedendo-lhe prazo para defesa - aceitando-se até a desnecessidade de tal comunicação por força do estipulado no n.º 2 do mesmo preceito legal, tendo em consideração que o mesmo facto resultou dos esclarecimentos prestados pelo arguido, sendo corroborado pelas declarações da testemunha.

    5. Mais se impugna o Facto 2) constante da factualidade não provada da douta sentença recorrida - o que se consigna para efeitos do disposto no art. 412.º, n.º 3, aI. a) do CPP.

    6. O Tribunal “a quo" incorreu em erro de julgamento porquanto deveria ter julgado PROVADO que "o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, ciente que a sua conduta lhe estava legalmente vedada".

    7. Tal facto concretiza a descrição do elemento subjetivo do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, o qual não poderá deixar de se ter por verificado face à demais factualidade provada, às regras da experiência comum e às próprias declarações prestadas pelo arguido - indicando-se. em cumprimento do disposto no art. 412.º, n.º 3, aI. b), do Cód. Proc. Penal, a gravação daquelas ao minuto 2' 08"/2' 09", das quais resulta que, a instâncias da Mm" Juiz sobre a verdade do relatado na acusação que lhe foi lida, incluindo na leitura a afirmação de agiu daquele modo e naquela convicção, respondeu “É verdade".

    8. Em consequência do que antecede, ao absolver o arguido a Mmª Juiz violou o disposto no art. 127.º do Cód. Processo Penal e os arts. 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, aI. a) do CP.

    9. Porque assim o impõe a prova produzida, requer o Ministério Público que a correção do erro de julgamento ora invocado seja efetuada por Vªs Exas alterando a matéria de facto da sentença nos termos acima expostos, uma vez que os autos contêm todos os elementos para proferir decisão definitiva.

    10. Não olvidando a alteração de factos que aquela operação consubstanciará, tal alteração assume natureza "não substancial" por força do afastamento do preenchimento da previsão do art. 1.º, aI. f) do CPP, já que nenhuma imputação de crime diverso ou agravamento dos limites máximos das sanções aplicáveis (por referência à acusação) dela decorre.

    11. E tratando-se de alteração de tal natureza não se impõe que se dê ao arguido a possibilidade de (novo) exercício do contraditório porquanto, ao momento da Douta Decisão Superior, o exercício de tal direito já terá sido possibilitado pela apresentação de resposta ao presente recurso (cfr. decidido em situação semelhante à dos autos pelo recente e douto ac. do TRE de 12.9.2017, publicado in www.dgsi.pt).

    12. Perante a matéria de facto (provada e não provada) fixada em conformidade com requerido no presente recurso, preenchidos estarão tanto os elementos objetivos porque se imporá a conclusão de que o arguido conduziu em estado de embriaguez, na via pública, o veículo de matrícula - TQ - como os elementos subjetivos do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, impondo-se a condenação do arguido pela prática do mesmo.

    13. Na determinação da pena concreta a aplicar ao arguido, releva, a nível da culpa, a natureza dolosa da sua atuação.

    14. Atendendo ao grau de ilicitude dos factos, à culpa do agente e às fortes exigências de prevenção geral bem como as diminutas exigências de prevenção especial, entende-se que, dentro da moldura abstrata aplicável, será cumprido o disposto nos arts. 40.º, 47.º, 70.º e 71.º do Código Penal se for aplicada ao arguido uma pena de multa.

    15. In casu, o arguido conduziu com uma TAS de 1,786 gr./l, bem distante do mínimo legal considerado crime, premissa que, sendo objetiva, configura um grau de ilicitude mediano-elevado.

    16. Por outro lado, relevam as elevadíssimas exigências de prevenção geral derivadas da circunstância de estarmos perante um ilícito recorrente e que em muito contribui para o elevado número de mortes verificado a nível nacional.

    17. Releva igualmente, a nível da culpa, a natureza dolosa da atuação do arguido concretamente o dolo direto com que atuou.

    18. Releva em sede de pena acessória a acentuada necessidade de prevenção da perigosidade do agente, atento o efeito pretendido pela aplicação desta pena essencialmente dissuasor - não podendo a mesma deixar de ser fixada em função do grau de alcoolemia.

    19. No caso concreto, a TAS detetada é bastante superior ao mínimo previsto para efeitos de criminalização da conduta, não podendo a concreta pena acessória coincidir com o limite mínimo quando também não coincide com esse limite aquela taxa (neste sentido, AC. RC de 5.3.2000, in www.dgsi.pt).

    20. As penas, para o serem, têm que ser sentidas por quem as sofre, causando-lhes transtorno e sacrifício, sob pena de não produzirem qualquer efeito útil.

      23 In casu, só a condenação do arguido em 50 dias de multa à taxa diária de € 8 (considerando os rendimentos mensais do arguido e a ausência de despesas fixas) e em 4 meses de inibição de conduzir veículos serão ajustadas e adequadas, em conformidade com tudo o que fica invocado.

      Pelo exposto, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o arguido pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, em pena de 50 dias de multa, à taxa diária de € 8, e na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados por um período de 4 meses, fazendo-se, desta forma, JUSTIÇA!» O recurso foi admitido.

      Respondeu o Arguido, junto do Tribunal recorrido, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: «I) O recurso interposto é manifestamente improcedente.

      II) Efetivamente, a douta sentença, ora recorrida, não merece qualquer censura.

      III) E como consta da douta sentença “não resultou demonstrado o local onde o arguido conduzia o veículo, sendo que o mesmo tem, necessariamente, que corresponder a uma artéria de comunicação terrestre que preencha as características definidas no citado artigo 1.º, alíneas v) e x), do Código da Estrada.” IV) O próprio agente autuante não sabia de que estrada ou caminho se trata!! V) Acontece que como consta da sentença “É do conhecimento geral, ponderado o mapa da área que próximo ao Hospital...

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