Acórdão nº 10/18.1GATVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução22 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Recurso n.º 10/18.1GATVR.

Acordam, em Conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.

Nos autos de Inquérito, com o n.º 10/18.1GATVR, a correrem temos pela Comarca de Faro – Juízo de Instrução Criminal de Faro – J2, veio o arguido BB arguir a nulidade do acto de autorização de busca ao veículo por si conduzido e do acto de busca ao veículo e do acto de apreensão, com o fundamento de que sendo de nacionalidade Espanhola e, consequentemente, desconhecedor da Língua Portuguesa, deveria ter sido em todos os ditos actos assistido por Defensor, nos termos do disposto no art. 62.º, n.º 1, al. d), do Cód. Proc. Pen., e que, não tendo sido observada tal formalidade, estamos perante a nulidade dos preditos actos processuais, nos termos do artigo 119.º, al.ª c), do mesmo diploma adjectivo.

Por despacho da M.ma Juiz de Instrução Criminal, datado de 30 de Julho de 2018, veio entender-se que concluir-se pela inexistência das invocadas nulidades, já que foram respeitadas todas as garantias e direitos do visado pela busca e apreensão de bens, razão pela qual será de manter a apreensão dos bens bem como o estatuto coactivo do arguido.

Inconformado com o assim decidido traz o arguido Rúben Perez López o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões: A. Este despacho é ilegal, porque viola as obrigações expressamente consagradas como tal, no disposto nos artigos 58.º n.º 1 alínea a) e d) e 64.º n.º 1 alínea d), 119.º n.º 1 alínea c) e 120.º n.º 1 do Código de Processo Penal, e viola-o, quando assume que o órgão de policia criminal que suspeitava que o ora recorrente transportava haxixe e considerava suficientemente indiciada a prática de crime de trafico de estupefacientes antes da solicitação da autorização para busca à viatura referenciada nos autos (como o auto de noticia bem elucida, identifica e concretiza fundamentando-se em observação directa e em conversas informais para concretizar essa suspeita de prática de crime pelo recorrente imediatamente antes da solicitação da autorização de busca), estando o ora Arguido desconhecedor da língua portuguesa detido/retido sob custódia do órgão de policia criminal, e já existindo procedimento criminal numerado; B. Tendo sido solicitado ao detido/retido que prestasse declarações e informações, e tendo este prestado (sem acesso à prestação de informação prévio do direito ao silêncio) confirmando supostamente as suspeitas que já sobre si incidiam, nem assim foi constituído arguido para que fosse assistido por defensor, na prestação de autorização de buscas, nas ditas buscas, nem na formalização dos autos de busca e de apreensão decorrentes, e se Julgou que não tendo sido constituído arguido e não tendo sido assistido por defensor nestas circunstâncias em que a Lei reputa como obrigatórias, se considera que as garantias e direitos do Arguido foram respeitados.

C. Porque no mesmo despacho se julgou que o ora Arguido não tinha direito à presença obrigatória de defensor na prestação de autorização de buscas, nas ditas buscas, nem na formalização dos autos de busca e de apreensão decorrentes, sendo realizados actos previstos exclusivamente na lei processual penal, e fundados em suspeitas mais que fundadas e identificadas contra si, que terão advindo da mera observação dos agentes policiais e de declarações prestadas sem advertência para o direito ao silêncio que não lhe foi comunicado, precisamente porque ainda não tinha sido constituído arguido.

D. O despacho recorrido viola as obrigações expressamente consagradas como tal no disposto nos artigos 58.º n.º 1 alínea a) e d) e 64.º n.º 1 alínea d) 119.º n.º 1 alínea c) e 120.º n.º 1 do Código de Processo Penal, quando entende que a violação da obrigação legal da constituição de arguido que serviu para o Arguido desconhecedor da língua portuguesa, não conhecesse do seu direito ao silêncio, serve para justificar que não fosse assistido nos actos processuais de tomada de declarações, de prestação e formalização de autorização de busca, de realização de busca, de realização de apreensão e de formalização de auto de apreensão, é motivo para se considerar legal que, como o ora Arguido era desconhecedor da língua portuguesa não tendo sido constituído como tal, não precisa nem lhe assiste direito legal de ser assistido por defensor antes da realização dos actos processuais de tomada de declarações, de prestação e formalização de autorização de busca, de realização de busca, de realização de apreensão e de formalização de auto de apreensão.

E. O despacho recorrido viola as obrigações expressamente consagradas como tal no disposto nos artigos 58.º n.º 1 alínea a) e d) e 64.º n.º 1 alínea d) 119.º n.º 1 alínea c) e 120.º n.º 1 do Código de Processo Penal, quando aceita e julga respeitador de todas as garantias e direitos do visado nas buscas e apreensão de bens realizadas à ordem dos presentes autos, aceitando e inclusive utilizando esta subtileza. A subtileza de não constituir e atrasar o mais possível a constituição como Arguido, de cidadão estrangeiro desconhecedor da língua portuguesa contra quem impendiam suspeitas muito concretas de transportar substancia ilícita concreta e imediatamente identificada como haxixe, fazendo com que não tenha de ser acompanhado por defensor na tomada de declarações, na prestação e formalização de autorização de busca, na realização de busca, na realização de apreensão e na formalização de auto de apreensão, tudo actos previstos exclusivamente na lei processual penal, julgando-se esta subtileza, sinonimo de respeito de todas as garantias e direitos do visado pelas buscas e apreensão de bens.

F. Aceitando-se a subtileza do atraso na constituição de Arguido de suspeito débil pelo desconhecimento da língua portuguesa, como meio legalmente aceite para se permitir e validar a prática de actos processuais penais sem a presença de defensor, nos casos em que a Lei o obriga em função de debilidade e fragilidade do Arguido, tudo a pretexto de como não se constituiu arguido pode-se realizar actos processuais sem a presença de defensor quando a isso a Lei o obriga.

G. O órgão de polícia criminal considerava suficientemente indiciada a prática de crime de tráfico de estupefacientes antes da solicitação da autorização para busca à viatura referenciada nos autos (como o auto de noticia bem elucida, identifica e concretiza fundamentando-se em observação directa e em conversas informais para concretizar essa suspeita de prática de crime pelo recorrente, imediatamente antes da solicitação da autorização de busca), estando o ora Arguido desconhecedor da língua portuguesa detido/retido sob custódia do órgão de polícia criminal, e já existindo procedimento criminal numerado; H. No auto de notícia assume-se a detenção do ora recorrente e as suspeitas sobre o mesmo, e ainda assim não se constituiu como arguido, e assim não foi o mesmo assistido por defensor no acto de autorização de busca e no acto de realização da mesma, como decorre dos próprios autos, por isso, não se venha dizer que os actos de autorização de busca ao interior de veículo automóvel referenciado nos presentes autos, de realização de busca no interior do mesmo, e de apreensão de itens do interior do mesmo veículo, são válidos ainda que o ora recorrente fosse desconhecedor da língua portuguesa e não estivesse assistido por defensor nos mesmos actos.

I. A justificação do despacho ora recorrido para validar a autorização de busca, as buscas e as apreensões realizadas nos presentes autos, decorre de uma falácia. A falácia de como o ora recorrente ainda não era arguido, apesar de estar detido/retido sob custódia do órgão de policia criminal e de sobre ele impenderem fundadas suspeitas sobre ele, que levam a que seja denominado suspeito antes da realização de buscas, e destas terem sido determinadas pelos indícios da prática de crime de tráfico de haxixe (cheiro) sobre o ora recorrente (declarações do mesmo) resultantes da observação directa do órgão de policia criminal, e das declarações prestadas pelo recorrente antes do consentimento e antes da realização das bascas, J. Então o recorrente não sendo arguido, ainda que desconhecesse a língua portuguesa, não lhe assistia o direito e o dever do órgão de policia criminal de providenciar pela assistência e comparência de defensor nestes actos processuais exclusivamente previstos no Código de Processo Penal, assim constata-se que a questão sub judice do despacho recorrido e do presente recurso é similar à questão analisada no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de Janeiro de 2016 no Processo 360/15.9PBLRS - A.L1-9 tendo como relatora a Mert. Juiz Maria Guilhermina Freitas, e não com o douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora citado no despacho recorrido.

K. O sentido desta norma visa a protecção dos arguidos particularmente débeis, em razão da sua condição física, mental, da idade ou de simplesmente ser um estrangeiro que não conhece a língua portuguesa, posto que a exigência de assistência de defensor à prática de certos actos processuais (artigo 64.º, n.º 1 alínea d) do Código de Processo Penal, é uma garantia de defesa do suspeito/arguido, uma...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT