Acórdão nº 140/15.1GBABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução12 de Julho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n. 140/15.1GBABF.E1 Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No Tribunal Judicial de Faro – Juízo Local Criminal de Albufeira- J 2 - correu termos o processo comum singular supra numerado, no qual é arguido BB, …imputando-lhe a prática de um crime de introdução em lugar vedado, previsto e punido pelo art. 191.° do Código Penal e um crime de furto, previsto e punido n." 1 do art.

203.° (ex vi al. e) do n." 2 e n." 4 do art. 204.°) do Código Penal A final foi lavrada sentença em 19-06-2017 que absolveu o arguido.

*Inconformada, interpôs o presente recurso, a Exmª Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal recorrido com as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos autos à margem identificados, no que tange à absolvição do arguido BB da prática de um crime de introdução em local vedado ao público e um crime de furto, p. e p. pelos arts. 191.° e n." 1 do art. 203.°, n." 1 (ex vi al. e) do n." 2 e n. 4 do art. 204.°), respectivamente, ambos do Código Penal; 2. Deveriam ter sido dados como provados os factos constantes da acusação e enumerados de alíneas a) a e) dos factos não provados, com excepção do ponto ii.; 3. Tal resulta do depoimento da testemunha CC, o qual deveria ter sido valorado, conjugado com a demais prova documental constante dos autos, em consonância com os princípios penais; 4. A testemunha CC, que por acaso é militar da GNR, na sessão realizada a 23.05.2017, cujo depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, com início pelas 10 horas e 07 minutos e o seu termo pelas 10 horas e 25 minutos, a instâncias da Magistrada do Ministério Público, disse entre o minuto 01:20 e 02:20: MP: É capaz de me relatar o que é que aconteceu, quando? Test.: Foi de um furto de um pólo da GNR, foi o mês de Janeiro de 2015, não sei precisar o dia, já tinha dado pela falta do pólo (. . .) 5. Entretanto na altura, nesse mês de Janeiro de 2015, uma patrulha deslocou-se a minha casa com esse Sr. BB e ele perante mim, perguntaram se me faltava um pólo, eu disse que sim e o Sr. BB lá na minha residência disse que tinha sido dali que tinha retirado o pólo da Guarda (. . .).

  1. Entre o minuto 02:50 a 04:42: MP: Onde é que mora, morava? Test.: Morava na Rua … nessa altura. (. . .) MP: A sua residência fica num local murado, fechado? Test.: Fechado. MP: Percebeu, consegue-nos descrever como é que ele poderá ter ido lá buscar o seu pólo, percebeu como é que isso aconteceu? Test.: Porque o prédio tem muro à volta, e tem um portão, mas o portão está sempre fechado. MP: Olhe o muro tem que altura, mais ou menos? Test.: Cerca de 1,50 m MP: 1,50 e tem um portão? Test.: Tem um portão. MP: Está equipado com fechadura? Test.: Sim, sim. MP: Costuma estar fechado? Test.: Sim, Sim. MP: Então como é que ele se poderia ter introduzido? Test.: Pronto, a única forma é saltar o muro e secar o pólo que estava a secar, normalmente (. . .) No estendal.

  2. Depois, disse entre o minuto 09:49 a 10:33: MP: "Tudo o que sabe relativamente aos factos em SI, a forma como ocorreram foi aquilo que o próprio arguido lhe relatou, o próprio Sr. BB que esteve perante si? Test.: Sim, Sim. MP: Olhe, ele pediu-lhe desculpa ou alguma coisa? Test.: Sim. Quando eu me desloquei posteriormente ao Posto ele pediu-me desculpa. MP: Apresentou-lhe alguma justificação para o ter feito, por ser o pólo da GNR? Test.: Não. Não disse nada. Só pediu desculpa pelo que aconteceu, explicou como o tinha feito, tinha tirado do estendal juntamente com outras peças. MP: Mas isso em conversa directa consigo? Test.: Sim, sim, comigo e pediu desculpa pelo que tinha acontecido, mais nada. Seguidamente, questionada pela defesa sobre o conhecimento que tinha dos factos, se apenas sabia dos factos por causa da confissão do arguido, do minuto 12:20 a 13:04, disse: Test.: Apenas sei que a patrulha tinha feito a apreensão do polo, que estava na posse do Sr. BB e que o pólo era meu e portanto que já tinha dado falta e que o pólo que eu tinha dado falta realmente era esse. Não sei como é que ele o fez, não ui, é só baseado no que ele realmente me disse e dele ter ado atrulha porque a patrulha perguntou-lhe de onde é que era o pólo, de onde é que ele o tinha retirado, colocaram o Sr. dentro da viatura e ele deu indicações, levou-os à minha casa, à minha residência." 8. O estendal, conforme o depoimento integral da testemunha encontrava-se colocado à porta de entrada da sua fracção, dentro da propriedade horizontal onde a mesma habita, devidamente murada em toda a sua extensão e cujo acesso se faz por um portão que se encontra fechado, só podendo ser aberto com uma chave. Mais acrescentou que nunca viu ou encontrou tal portão aberto; 9. Assim, do depoimento resulta, salvo o devido respeito, que o arguido, muito antes de assumir a qualidade de arguido e enquanto se indagava a origem e eventual propriedade do pólo, conversou directamente com a ofendida e testemunha CC, quando conduziu os militares da patrulha a casa desta e aí a informou que se tinha dirigido anteriormente e retirado do seu estendal várias peças de roupa, entre as quais, o referido pólo de manga comprida da GNR; 10. Logo, não estamos perante qualquer conversa, indirecta, que não possa ser valorada, ao contrário do que o Mmo. Juiz a quo entendeu na sua motivação; 11. Destarte, no tocante ao crime de furto e introdução em local vedado, o órgão de polícia indagava se efectivamente podia ter sido cometido um ilícito, em que circunstâncias e se por aquele indivíduo, sequer havia queixa, posteriormente apurou-se tratar-se de ilícitos penais, os quais são crimes de natureza semi-pública, mas poderia até não ter sido praticado nenhum crime ou não ser apresentada queixa-crime; 12. E, nesse sentido, ainda que estivéssemos efectivamente a falar de uma conversa mantida pelo arguido, à data ainda eventual suspeito a confirmar, podia ser valorada, por estarmos numa fase de eventual recolha de indícios da prática de ilícito e seu autor, como resulta do próprio trecho transcrito do Ac. do STJ de 15.02.2007, proc. 06P4593, em www.dgsi.pt.

    na sentença recorrida; 13. Ademais, o facto é que o arguido, à data poderia ser eventual suspeito, mas confessou os factos directamente à testemunha e ofendida CC. Assumiu a sua prática, explicou como o fez e, inclusive, pediu desculpa por o ter feito.

  3. Destarte, não é uma conversa informal nos termos da lei processual penal e, consequentemente pode e deve ser devidamente valorada.

  4. Não é meio indirecto de prova, de depoimento de ouvir dizer aos militares da patrulha que se deslocaram com o arguido ao local. Saliente-se, foi dito directamente pelo arguido à ofendida e testemunha, ainda que na presença dos militares; 16. Não há qualquer violação do disposto no art. 129.° do cód. Prac. Penal, pelo contrário, foi prestado depoimento em cumprimento, entre o mais, do disposto nos arts. 124.°, 125.°, 128.° e 131.°, todos do Cód. Prac. Penal e o próprio Mmo. considerou o depoimento "de sindicância impossível quanto à fiabilidade do que a mesma ouviu ", "dotado de muita genuinidade, sendo evidente a boa-fé da testemunha"; 17. Deverão assim ser dados como provados os seguintes os factos constantes da acusação e que onsta da sentença recorrida como factos não provados, a saber, elencados da alínea a) a e), com excepção do ponto ii.; 18. Por outro lado, os factos considerados não provados encontram-se em contradição com a fundamentação dos mesmos, a qual em si própria também entra em contradição em alguns pontos, não sendo coerente; 19. Com efeito, o Mmo. Juiz a quo diz que não pode valorar o depoimento de CC por ser por meio indirecto e, como tal, meio de prova proibido, no seu entendimento; uma vez que o que sabe é porque ouviu o agora arguido, na altura ainda eventual suspeito, em conversa com aquele OPC enquanto confessava a autoria e prática dos factos, entendendo que naquele momento o mesmo já deveria assumir a qualidade de arguido e tal confissão não pode por isso ser valorada sem violação do direito ao silêncio 20. Todavia, em nota de rodapé com o n." 6, ao invés de na fundamentação e por referência a este facto, apresenta uma conclusão que mais não revela do que um pré-juízo, suposições lançadas pelo julgador para justificar e sustentar as razões pelas quais considera que se trata de uma conversa informal mantida entre OPC e o arguido; 21. Com efeito, da única prova testemunhal ouvida em sede de audiência de julgamento resultou que o ora arguido, então ainda suspeito, conduziu a patrulha até ao local de onde teria subtraído as peças de vestuário, desconhecendo estes assim como a própria ofendida, o local de onde este teria retirado o referido pólo até ao momento em que aí chegaram; 22. Tal conclusão é muito mais verosímil, face ao teor do depoimento prestado pela testemunha, assim como da própria postura de surpresa desta face à presença dos OPC e do arguido, até da própria prática do ilícito e do local do mesmo sobre a sua propriedade do que a do Mmo. Juiz a quo; 23. Saliente-se que a ofendida já tinha efectivamente dado pela falta do pólo, mas desconhecia de onde teria este desaparecido, se no local de trabalho, se em casa ou outro local como seja do estendal e se teria algum colega, inclusive, levado o mesmo por engano; 24. Acresce que, o Mmo. Juiz a quo na fundamentação entende que ficou provado que o pólo da testemunha CC e outra peça de roupa foram efectivamente levados do seu estendal "e tendo em conta as características do local descritas pela testemunha, não nos parece possível que as duas peças de roupa tenham ido parar à posse de um terceiro sem que tenha ocorrido um ilícito."; 25. Desde logo, tal facto não consta da matéria de facto dada como provada, embora conste da fundamentação, o que é contraditório; 26. Ora, não é possível firmar convicção de que o pólo foi levado do estendal, se não valorarmos as declarações da testemunha, a qual só tem conhecimento...

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