Acórdão nº 115/14.8NJLSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução12 de Julho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 115/14.8NJLSB Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: Nestes autos de Inquérito que correu termos Tribunal Judicial da Comarca de Faro - Juízo de Instrução Criminal de Faro, J 1 - em 07.02.2018, a Mmª. Juíza de Instrução lavrou despacho de não pronúncia do arguido BB relativamente ao RAI do assistente que peticionava a sujeição a julgamento de BB pela prática de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 143º do Código Penal.

*CC requerera a intervenção hierárquica (fls. 503 e ss.), tendo na sequência da mesma sido declarada a nulidade do despacho de arquivamento e determinado seja proferido novo despacho apreciando, designadamente, a eventual prática pelo arguido BB de um crime p. e p. pelo art. 86º do CJM (fls. 510 e ss.).

Nessa sequência, foi proferido novo despacho de arquivamento, com fundamento em falta de indiciação suficiente, em relação aos seguintes crimes (fls. 651 a 659): - crime de insubordinação por ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 86º do Código de Justiça Militar (que consome o crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 143º, nº 1 do Código Penal) que o Cabo CC imputa ao Guarda Principal BB; - crime de abuso de autoridade por ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 93º do Código de Justiça Militar que o Guarda Principal BB imputa ao Cabo CC; - crime de abuso de autoridade por ofensa, p. e p. pelo art. 95º do Código de Justiça Militar que BB imputa a CC; - crime de incumprimento dos deveres de serviço, p. e p. pelo art. 67º, nº 1, al. d) do Código de Justiça Militar praticado pelo Cabo CC; - crime de dano em bens militares ou de interesse militar, p. e p. pelo art. 70º, nº 1, al. d), por referência ao art. 79º, nº 1, al. r), ambos do Código de Justiça Militar, praticado pelo cabo CC; - crime de uso ilegítimo de armas, p. e p. pelo art. 100º do Código de Justiça Militar, imputado ao Cabo CC (este por falta de preenchimento dos elementos objetivos do tipo).

Não se conformando com o despacho de arquivamento, CC veio requerer a abertura de instrução, imputando ao arguido BB a prática de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 143º, nº 1 do Código Penal, por em seu entender os autos reunirem indícios suficientes da sua prática (fls. 670 a 676).

Por despacho de fls. 715 foi admitida a instrução, admitida a requerida tomada de declarações ao assistente e notificado o assistente para se pronunciar quanto às razões de facto que justificam a reinquirição da testemunha, sob pena de indeferimento.

O assistente pronunciou-se, nos termos de fls. 723.

Não obstante, por despacho de fls. 728 foi indeferida a inquirição da testemunha com fundamento em a considerar um ato inútil, face à entretanto detetada omissão no RAI da atuação em liberdade por parte do arguido.

Na sequência de tal despacho, veio o assistente a desistir da sua tomada de declarações, tendo, no entanto, arguido a nulidade do indeferimento da inquirição da testemunha, tendo por despacho proferido em acta sido indeferida a nulidade arguida.

Não foi, assim, produzida prova em sede de instrução.

* Inconformado o assistente recorre concluindo: I. O requerimento da abertura da instrução formulado pelo assistente deu integral cumprimento ao disposto no artigo 283º do CPP, mormente ao aí plasmado no seu nº 3, alínea b); II. Ao contrário do decidido, do predito requerimento constam todos os elementos subjectivos do tipo do crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 143º do Código Penal.

  1. A fórmula utilizada pelo assistente no RAI, não obstante não seja a habitual, consubstancia a “livre determinação de vontade do arguido”.

  2. Quem actua com o propósito concretizado de praticar um crime, conhecendo do desvalor da sua conduta, actua de modo livre, voluntário e consciente.

  3. Na factualidade narrada no RAI está ínsita a livre determinação da vontade do arguido (este determinou a sua vontade de praticar o crime e praticou-o, bem sabendo que a sua conduta era penalmente sancionada).

  4. Fez o tribunal recorrido errada interpretação do disposto no artigo 283º nº 3 al. b) do C.P.P, violando-o.

  5. Entendimento diverso do disposto no artigo 287º nº 3, alínea b), do C.P.P. como a que resulta da decisão recorrida, é inconstitucional, por violação do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, devendo em consequência ser afastado.

  6. Razão pela qual deve a decisão instrutória ser revogada e substituída por outra que ordene a realização dos actos de instrução requeridos e já admitidos.

*O Digno Procurador-Adjunto no tribunal recorrido apresentou resposta defendendo o decidido, com as seguintes conclusões: 1 - Nos presentes autos, o MP, na fase de inquérito, determinou o seu arquivamento, nos termos do artigo 277°, n. 2, do Código de Processo Penal por entender inexistirem indícios suficientes da prática dos crimes imputados ao denunciado; 2 - Não se conformando com este despacho, o Assistente requereu a instrução; 3 - Nesse requerimento, Assistente imputou ao arguido a prática de um crime de ofensas à integridade física simples p. e p pelos artigos 143°, todos do Código Penal, não indicando, contudo, factos integradores dos elementos subjectivos do crime, relativos à imputabilidade, designadamente que o arguido actuou livremente; 4 - Motivo porque a requerida instrução foi rejeitada, tendo deste despacho de rejeição o Assistente interposto o presente recurso; 5 - Contudo, não lhe assiste razão; 6 - Na verdade têm ensinado a Doutrina e a Jurisprudência que, regendo-se o processo penal pelos princípios do acusatório e contraditório, resulta que o requerimento de abertura de instrução requerida pelo assistente, porque é consequência de um despacho de arquivamento, deve conter todos os elementos de uma acusação com especial relevância para a matéria de facto que descreve o ilícito que é imputado ao arguido, tanto nos seus elementos objectivos como nos elementos subjectivos; 7 - Ora como o crime aqui em questão é doloso, deveriam ser alegados factos, pela assistente, de onde se retirassem os elementos objectivos e subjectivos, nomeadamente que os arguidos actuaram livre, deliberada e conscientemente, conhecendo o carácter proibido da sua conduta; 8 - Contudo no seu requerimento de abertura de instrução a assistente não alegou factos pertinentes à totalidade dos elementos subjectivos, designadamente que o arguido actuou livremente; 9 - Não é possível ao Juiz substituir-se ao Assistente, colocando, por iniciativa própria, os factos em falta que se revelarem essenciais para a imputação dos crimes ao arguido, sob pena de estarmos perante uma alteração substancial dos factos; 10 - A doutrina e a Jurisprudência também têm entendido que nestas situações não há lugar ao convite de aperfeiçoamento do requerimento apresentado pela Assistente, pois, a existir, tal convite colocaria em causa o carácter peremptório do prazo referido no artigo 287°, nO 1, do Código de Processo Penal, violando as garantias de defesa do arguido e a celeridade processual; 11- Assim sendo, bem andou a Exma. Juiz recorrida ao indeferir o aludido requerimento, nos termos do artigo 287°, n. 2, do Código de Processo Penal por inadmissibilidade legal, quer atenta a nulidade prevista no artigo 283°, n. 3 do mencionado diploma, quer atenta a falta de objecto, 12 - pelo que deve ser mantido o douto despacho recorrido.

*De igual forma o arguido apresentou resposta pugnando pelo decidido, concluindo: 1. O presente recurso vem interposto da douta decisão instrutória que não pronunciou BB pela prática do crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal.

  1. Recurso esse que está a nosso ver e salvo o devido respeito, totalmente destinado ao insucesso, não assistindo razão ao assistente, aqui Recorrente.

  2. Desde logo porque o recorrente, começa pela invocação de que o tribunal “a quo” não fez uma correcta aplicação do artigo 283.º, n.º 3, alínea b) do Código de Processo Penal, o que salvo melhor opinião não merece qualquer reparo por parte do tribunal “ad quem”.

  3. O Recorrente vem fazer uma alegação de direito não invocando qualquer vício, violação ou nulidade da sentença recorrida, pese embora o Recorrido entenda que a sentença é irrepreensível e não merece qualquer reparo.

  4. Sendo a decisão instrutória proferida pelo tribunal “a quo” particularmente bem feita, bem decidida, bem escrita e bem fundamentada.

  5. Não se considerando assim que a decisão instrutória mereça qualquer reparo ou qualquer alteração.

  6. Face ao exposto conclui-se que não se verifica a não correcta aplicação do direito invocado.

  7. Devendo manter-se na íntegra a decisão recorrida e em consequência deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente.

    *Nesta Relação o Exmº Procurador-geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso.

    Observou-se o disposto no nº 2 do art. 417° do Código de Processo Penal.

    Respondeu o arguido insurgindo-se...

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