Acórdão nº 646/12.4TATVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Julho de 2018
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 12 de Julho de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I. RELATÓRIO 1. Nos autos de processo comum com intervenção do tribunal singular com o número em epígrafe que correm termos no Juízo de Competência Genérica de Tavira do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o MP deduziu acusação contra A…, Lda., com sede em Tavira, e AA, de nacionalidade espanhola, nascido em 2.04.1976, casado, empresário Imputando-lhes a prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. nos termos do artigo 107º, nºs 1 e 2 do RGIT, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, com referência ao artigo 105º, nº 1, do mesmo diploma legal, e artigos 30º, nº 2 e 79º, ambos do Código Penal, sendo a sociedade arguida responsável nos termos do artigo 7º do RGIT.
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Realizada a Audiência de Discussão e Julgamento, o tribunal a quo julgou improcedente a acusação, e, em consequência, absolveu os arguidos A…Lda. e AA da prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. nos termos do artigo 107º, nºs 1 e 2 do RGIT, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, com referência ao artigo 105º, nº 1, do mesmo diploma legal, e artigos 30º, nº 2 e 79º, ambos do Código Penal.
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Daquela sentença absolutória veio o arguido interpor o presente recurso, extraindo da respetiva Motivação as seguintes «C – Conclusões 1. Por sentença proferida nos presentes autos foi decidido absolver os arguidos “A.. Lda.” e AA da prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. nos termos do artigo 107º, nºs 1 e 2 do RGIT, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, com referência ao artigo 105º, nº 1, do mesmo diploma legal, e artigos 30º, nº 2 e 79º, ambos do Código Penal).
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A decisão sob recurso baseou a sua decisão no facto de entender que a notificação realizada ao abrigo do art.º 105.º, n.º4, al. b) do RGIT não foi correctamente efectuada.
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Não concordamos com o teor de tal decisão, uma vez que em nosso entender a notificação realizada no dia 10 de Abril de 2013 respeitou a finalidade prevista na norma citada.
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Com efeito, a condição objectiva de punibilidade ínsita no citado art.º 105.º, n.º4, al. b) do RGIT foi plasmada em norma com o objectivo de impelir o agente faltoso e omissivo a agir e a ter uma atitude activa, diligenciando junto dos Serviços da Segurança Social para proceder ao pagamento das quantias em dívida e regularização da sua situação.
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Tal norma visa dar a conhecer ao arguido faltoso omissivo de que existe uma norma legal que lhe permite conceder uma oportunidade de cumprir com as suas obrigações e de não incorrer dessa forma na prática de um crime.
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Acresce que a notificação efectuada em 10-04-2013 contém os elementos essenciais para que se cumpra a finalidade da norma em apreço: a. Indicação da norma legal aplicável – art.º 105.º, n.º4, al. b) do RGIT; b. Indicação do tipo de crime em causa; c. Indicação dos períodos a que diz respeito a quantia em dívida; d. Quantias em dívidas à Segurança Social; e. Informação do prazo concedido – 30 dias – para regularizar a situação; f. Indicação do que o agente deverá fazer para regularizar a situação, ou seja, deslocar-se aos Serviços da Segurança Social.
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Considerando o texto da notificação, temos de concluir que a finalidade pretendida pelo art.º 105.º, n.º4, al. b) do RGIT foi atingida, fornecendo ao arguido todas as informações indispensáveis para que o mesmo regularizasse a sua situação.
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Em face do exposto, deverá o Venerando Tribunal da Relação revogar a decisão sob recurso e condenar os arguidos AA e a sociedade comercial “A”, em penas de multa, no caso do primeiro da pena de 120 dias de multa e na segunda a pena de 240 dias de multa.
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Caso não se concorde com o entendimento supra exposto de que a notificação foi correctamente efectuada, sempre se dirá que deveria a Mm.ª Juiz a quo sanar a irregularidade em causa, tendo em conta que em nenhum momento processual foi invocada tal irregularidade e tendo em conta o disposto no art.º 123.º, n.º2 do CPP que prevê que a irregularidade seja sanada oficiosamente 10. Nesta hipótese, pede-se que o Venerando Tribunal da Relação que ordene a remessa dos autos à 1ª instância a fim de ordenar o suprimento da aludida irregularidade e consequente notificação dos arguidos nos termos que entender correctos.
Termos em que, e nos mais que V. Excelências doutamente suprirão, dever-se-á revogar a sentença proferida nestes autos e condenar-se os arguidos,» 4.
Os arguidos não apresentaram resposta ao recurso.
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– Nesta Relação o MP pronunciou-se pela procedência do recurso.
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Notificados, os arguidos nada disseram.
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A sentença recorrida (transcrição parcial): «1.
Factos provados Da acusação 1. A " A, Lda.", é uma sociedade comercial por quotas, com sede social na Av…,em Tavira, que se dedica à construção e engenharia civil, construção de edifícios, obras públicas, reparação manutenção e serviços de assistência de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, arrendamento, administração e gestão de imóveis, promoção imobiliária.
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O arguido AA é um dos gerentes de facto e de direito da sociedade arguida desde 13/12/2007, obrigando-se a sociedade com a assinatura de dois gerentes que devem intervir conjuntamente.
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A sociedade arguida encontra-se inscrita como contribuinte na Segurança Social nos regimes contributivos "000", correspondente ao Regime Geral dos Trabalhadores por conta de outrem e "669" - Regime dos Membros dos Órgãos Estatutários 4. A sociedade arguida, no exercício da sua actividade, entre os meses de Setembro de 2008 a Agosto de 2010, inclusive, procedeu ao desconto das contribuições devidas à Segurança Social nos salários dos seus trabalhadores, num total de vinte e três meses: Setembro de 2008 1.579,71€ Outubro de 2008 1.100,33€ Novembro de 2008 1.092,48€ Dezembro de 2008 2.011,84€ Janeiro de 2009 1.102,60€ Fevereiro de 2009 1.102,60€ Março de 2009 1.122,08€ Abril de 2009 1.109,64€ Maio de 2009 1.109,64€ Junho de 2009 1.100,21€ Julho de 2009 1.383,56€ Agosto de 2009 1.081,67€ Setembro de 2009 1.158,82€ Outubro de 2009 1.081,67€ Novembro de 2009 1.158,82€ Dezembro de 2009 1.081,67 € Janeiro de 2010 1.081,67€ Fevereiro de 2010 2.163,33€ Março de 2010 1.089,59€ Abril de 2010 1.089,59€ Maio de 2010 1.084,36€ Junho de 2010 932,89€ Julho de 2010 1.114,39€ Agosto de 2010 787,69€ Tudo no valor global de 28.055,74 € (vinte e oito mil e cinquenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos).
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No período de Setembro de 2008 a Abril de 2011 a sociedade arguida, no exercício da sua actividade, deduziu dos valores das remunerações pagas aos seus sócios gerentes, relativas às contribuições devidas à Segurança Social no regime dos sócios gerentes e membros dos órgãos estatutários, num total de trinta e dois meses, os seguintes valores: Setembro de 2008 158 € Outubro de 2008 158 € Novembro de 2008 158 € Dezembro de 2008 158 € Janeiro de 2009 160,40 € Fevereiro de 2009 160,40 € Março de 2009 160,40 € Abril de 2009 160,40 € Maio de 2009 160,40 € Junho de 2009 160,40 € Julho de 2009 160,40 € Agosto de 2009 160,40 € Setembro de 2009 160,40 € Outubro de 2009 160,40 € Novembro de 2009 160,40 € Dezembro de 2009 160,40 € Janeiro de 2010 162,90 € Fevereiro de 2010 162,90 € Março de 2010 162,90 € Abril de 2010 162,90 € Maio de 2010 162,90 € Junho de 2010 162,90 € Julho de 2010 162,90 € Agosto de 2010 162,90 € Setembro de 2010 162,90 € Outubro de 2010 162,90 € Novembro de 2010 162,90 € Dezembro de 2010 162,90 € Janeiro de 2011 152,43 € Fevereiro de 2011 152,43 € Março de 2011 152,43 € Abril de 2011 152,43 € No valor total de 5.121,32 € (cinco mil, cento e vinte e um euros e trinta e dois cêntimos).
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O arguido AA, actuando em nome e representação da sociedade arguida, procedeu à entrega das declarações de remunerações dos trabalhadores ao seu serviço e dos sócios gerentes, dentro do prazo legal.
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Porém, após ter descontado e retido as referidas contribuições relativas ao regime geral dos trabalhadores por conta de outrem, a sociedade arguida não procedeu à entrega dos montantes devidos à Segurança Social, no valor total de 28 055,74 € (vinte e oito mil e cinquenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos), nem até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que respeitavam, nem nos 90 dias imediatos após o decurso daquelas datas, nem no prazo de 30 dias após as notificações efectuadas no dia 10 de Abril de 2013, quer ao arguido quer à sociedade.
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