Acórdão nº 517/16.5T8BJA.E1.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelPAULA DO PA
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

P.517/16.5T8BJA.E1.E1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] 1. Relatório BB intentou ação declarativa, com processo comum, contra Banco CC, S.A.

e Fundo de Pensões do Grupo Banco CC, pedindo que lhe seja reconhecido o direito de obter, dos Réus, a pensão de sobrevivência, por morte do seu companheiro DD.

Alegou, em breve síntese, que desde 1984, viveu em condições análogas às dos cônjuges, com o falecido DD, que foi funcionário do Réu Banco e pensionista do segundo Réu, o que lhe confere o direito a receber uma pensão de sobrevivência, em consequência da sua morte.

Realizada a audiência de partes, não foi possível obter uma solução conciliatória que colocasse termo ao litígio.

Os Réus contestaram, sustentando, no essencial, que na concreta situação dos autos não se encontram preenchidos os pressupostos definidos no ACT celebrado entre o Banco CC, S.A. e o Sindicato dos Bancários do Norte e Outros para a atribuição de pensão de sobrevivência à Autora.

Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar.

Identificou-se o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

Fixou-se à ação o valor de € 30.000,01.

Após a realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolveu as Rés do pedido formulado pela Autora.

Não se conformando com esta decisão, veio a Autora interpor recurso da mesma, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: «1- No presente processo degladiam-se duas posições, diríamos, que antagónicas.

2- Assim, em apertada síntese, a recorrente entende que o facto de ter vivido comprovadamente durante mais de 30 anos em união de facto com um pensionista do primeiro Réu, tal circunstância confere-lhe o direito á pensão de sobrevivência.

3- Por seu turno, os recorridos, fundando-se para o efeito na interpretação conjugada do n.º 3 com o n.º 8 da cláusula 124 A do ACT celebrado entre o Banco CCC SA e o Sindicato dos Bancários do Norte, entende que tal direito não assiste á recorrente.

4- A douta sentença, pelas razões que expendeu, entende, também ela, que tal direito não assiste á recorrente devido ao facto de não ter completado o período de dois anos que se encontra estabelecido no normativo referenciado no artigo anterior.

5- Mais se refere na douta sentença que as convenções coletivas terão, necessariamente, de ser aplicadas em bloco.

6- No que tange ao primeiro argumento, entende a recorrente, e fá-lo devidamente amparada na sentença sob recurso, que ficou provada a sua vivência em união de facto com DD, pensionista do primeiro Réu, vide-se matéria provada de 1 a 5.

7- A prova produzida em sede de audiência de julgamento deve sobrepor-se ao que é exigido pelos RR, cumprindo acrescentar que foram razões de natureza fortuita que levaram ao não cumprimento daquele prazo.

8- Por outro lado, a exigência fixada pelos RR no tocante á atribuição de pensões aos viúvos de facto, é recente e a recorrente logo que da mesma teve conhecimento dirigiu-se ao Banco no sentido de lhe dar cumprimento, o que evidencia um comportamento diligente da sua parte.

9- Por outro lado, sustenta a sentença recorrida o entendimento que o ACT não pode ser cindido, tem de ser aplicado em bloco, o que conflitua com o argumento expendido no Acórdão 1560/11 TVLSV .L1S1 prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça.

10- Nesse aresto, defende-se que a aplicação em bloco de uma convenção coletiva não impede a combinação de aspetos de regime geral que se revelam mais favoráveis.

11- Noutro contexto, importará averiguar se o ACT em questão cumpre os princípios constitucionais que protegem as uniões de facto e, bem assim, as demais normas legais, de carácter imperativo, que visam tornar efetivos tais direitos, no caso vertente a recorrente entende que não.

12- Cotejados os prazos para a concessão da pensão ao viúvo de facto comparativamente ao viúvo tout court, é mais longo o prazo do viúvo de facto que necessita de dois anos para poder aceder á pensão ao invés, para os viúvos estabelece o prazo de apenas um ano.

13- Como assim, a cláusula em causa, colide com os princípios constitucionais que conferem o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.

14- Ao que acresce, por outro lado, que a referida cláusula também viola o princípio da igualdade de direito á segurança social, sem esquecer o princípio da dignidade da pessoa humana, o que constituem princípios estruturantes do Estado-de-Direito democrático, proclamando o artigo n.º 2 da Constituição da República que Portugal é um Estado-de-Direito democrático.

15- Contudo, pese embora a prova produzida perante o Tribunal, Órgão de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, assim o refere o n.º 1 do artigo 202 da Constituição, essa prova foi completamente menosprezada, focando-se a douta sentença na circunstância de não ter decorrido o período de dois anos entre a entrega da declaração solicitada pelos RR e o decesso de Jorge Ribeiro, e não transcorreu por razões absolutamente fortuitas.

16- Como assim, entende a recorrente que a sua situação não foi devidamente sopesada pelo douto Tribunal.

17- Aqui chegados, importará questionar se a prova que é produzida perante o Tribunal é menos valiosa do que a prova que é produzida perante o banco.

18- O nosso direito adjetivo tem vindo a sofrer assinaláveis mutações, apontando as mesmas no sentido de privilegiar, cada vez mais, a substância em detrimento da forma, metodologia que, salvo o devido respeito por entendimento mais douto, não foi de em todo seguida.

19- Por outro lado, importará frisar que o viúvo de facto de qualquer trabalhador beneficiário do regime geral, não deixaria de ter direito á pensão de sobrevivência, não constituindo a circunstância de se encontrar sujeito ao regime especial, justificativa bastante para tal diferença de tratamento.

20- Ao que acresce, por outro lado, que o normativo em apreço é omisso no que tange a questões como a que aqui se discute, em que o prazo fixado no ACT não foi cumprido por razões de natureza fortuita.

21- Assim sendo, é defensável o entendimento que estamos em presença de uma lacuna, lacuna que urge integrar.

22- Considerando que o ACT deverá respeitar os princípios e valores fundamentais do sistema, a integração da lacuna deverá processar-se de harmonia com o estatuído no artigo 10º do Código Civil.

23- No já citado acórdão sufraga-se no entendimento que relativamente á integração da lacuna se deverá proceder a uma extensão teleológica, o que tendo em conta os fins almejados pelos outorgantes da referida convenção e, sobretudo, a circunstância de se fixar para o viúvo de facto o prazo de dois anos a contar da entrega da declaração, tendo a recorrente vivido em união de facto comprovadamente durante 30 anos, é de concluir que, em obediência aos valores fundamentais do sistema e dos quais as convenções se não devem desviar, sempre seria de concluir que a recorrente tem direito á pensão de sobrevivência.

24- Por outro lado, o entendimento que se encontra sufragado na sentença recorrida viola o direito a uma segurança social universal e, bem assim, o princípio da igualdade, princípios plasmados nos artigos 63 e n.º 13 da Lei Fundamental.

25- Ensina Rui Medeiros que a universalidade do direito á segurança social significa que a efetivação do direito á segurança social através de um sistema organizado, coordenado a subsidiado pelo Estado deve prima facie abranger todos os cidadãos independentemente da sua situação profissional (Acórdão n.º 5 17/98 e 634/98, não se compadecendo com um sistema que deixa arbitrariamente de fora alguns trabalhadores ou parte da população.

26- O nosso ordenamento reconhece a existência de um sistema de segurança social especifica (privado) e, bem assim, de regras diversas no que tange aos cálculos das respetivas pensões.

27- O que ora se discute em saber se a recorrente tem ou não direito á pensão de sobrevivência decorrente da vivência em união de facto com o seu companheiro, pensionista dos RR, durante mais de 30 anos! 28- Não se encontrando esta situação prevista especificamente na convenção coletiva aqui em causa, o que consubstancia a existência de uma lacuna que deverá ser integrada nos moldes já propugnados no presente recurso.

29- De qualquer modo, mesmo que assim não fosse, a referida cláusula, pelas razões apontadas não deixaria de ser nula por violar os princípios constitucionais a que se já fez referência.

30- O Tribunal Constitucional tem sucessivamente advertido para o dever do legislador não esvaziar a tutela que a Constituição consagra quanto ao núcleo essencial do direito á segurança social, certo sendo que a família não se circunscreve apenas e só aquela que resulta do matrimónio, outro entendimento se não pode extrair do artigo 36 n.º 1 da Constituição.

31- O que importa salvaguardar é que a diferenciação estabelecida seja objeto de tratamento razoável racional e objetivamente fundadas, tal como se defende no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 552/2006 de 26 de Setembro de 2006.

32- Todavia, não se lobriga, e este é o cerne da questão, qual a justificação para que os unidos de facto com trabalhadores bancários sejam objeto de um tratamento de desfavor, comparativamente aos demais cidadãos, que viveram em união de facto com outros trabalhadores, que não os do sector bancário.

33- A sentença recorrida justifica-se com a natureza convencional do ACT em que se encontram consagradas as condições em que o viúvo de facto poderá aceder á pensão e, bem assim, que por se tratar de um regime especial apenas consente uma aplicação em bloco não podendo o mesmo ser complementado.

34- Todavia, importará não esquecer que as convenções coletivas podem ser objeto de portaria de extensão que, como é consabida, pode estender o âmbito de aplicação da convenção no todo ou em parte.

35- O que contraria o entendimento que a convenção não é...

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