Acórdão nº 4839/15.4T8LLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | ISABEL PEIXOTO IMAGIN |
Data da Resolução | 18 de Outubro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Autor: (…) Recorrido / Réu: Condomínio do Edifício (…) Trata-se de uma ação declarativa de condenação através da qual o A peticionou se declarasse resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre as partes, decretando-se o despejo imediato do locado, condenando-se o Réu a pagar € 7.333,00 relativos a rendas vencidas e o montante equivalente às rendas que se vencerem até ao trânsito em julgado da sentença que decrete o despejo, a que acrescem os juros de mora e as rendas que se vencerem até entrega do locado.
Alegou ter celebrado o contrato de arrendamento na qualidade de senhorio, dado ser possuidor da fração autónoma objeto do mesmo.
O R contestou, invocando, designadamente, que o A carecia de legitimidade para ter outorgado o contrato como senhorio.
II – O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida sentença conforme segue: «
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Declaro nulo o “Contrato de Arrendamento Para Fins Habitacionais Com Duração Limitada” referido no ponto 4 dos factos provados; b) Julgo a presente ação improcedente, por não provada e, em sua consequência, absolvo o Réu da totalidade dos pedidos contra si deduzidos pelo Autor; c) Julgo a Reconvenção improcedente, por não provada, e, em sua consequência, absolvo o Autor da totalidade do pedido reconvencional que contra si foi deduzido pelo Réu.» Inconformado, o A apresentou-se a recorrer da sentença na parte em que o considerou parte ilegítima no contrato e declarou a nulidade do contrato de arrendamento, pugnando pela revogação dessa decisão, a substituir por outra que decrete a procedência total da ação. Conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos: «1º - A presente acção tem natureza obrigacional, prendendo-se com a existência e validade entre as partes de um contrato de arrendamento e consequências do seu incumprimento; 2º - O A/ Recorrente esteva autorizado a celebrar com terceiros contrato de arrendamento definindo livremente a sua natureza e conteúdo, tendo o poder de a fruir como bem entender; 3º - Celebrou o contrato de arrendamento “sub judice”, sabendo a arrendatário que o locador se arrogava, não como proprietário, mas como titular do direito de retenção; 4º - Sabia ainda o locatário que a (…), Imóveis, S.A. havia já sido declarada insolvente; 5º - Pagou rendas e ocupou a fracção objecto do contrato enquanto quis, não tendo ainda procedido à respectiva entrega; 6º -Mais sabia o arrendatário que o administrador de insolvência não havia tomado posse efectiva de nenhuma das fracções autónomas integrantes da massa insolvente, que se mantinham, como hoje se mantêm, na posse dos promitente compradores: 7º - Assim, o arrendatário usufruiu do locado, constituindo-se na obrigação de pagar as correspectivas rendas; 8º - A questão de se apurar quais os direitos e obrigações do titular do direito de retenção, uma vez que a posse sobre o locado se manteve sempre na pessoa do A/Recorrente terá de ser decidida no processo de insolvência, onde já está suscitada, e não no presente processo, que tem natureza meramente obrigacional; 9º - Daí entendermos que o Meritíssimo Juiz “a quo” não podia tomar posição sobre tal questão, por lhe estar vedado neste processo e, assim, considerar o recorrente parte ilegítima por ter caducado o consentimento que a (…) Imóveis, S.A. que lhe concedera anteriormente; 10º - Outro factor a considerar é que só o administrador de insolvência poderia ter levantado tal questão, através da intervenção de terceiros, espontânea ou provocada, o que não foi feito; 11º - Pelo facto do arrendatário ter outorgado o contrato e ocupado a fracção autónoma, pagando rendas e fruindo-o, estava-lhe vedado vir invocar a ilegitimidade própria e do Recorrente, pois tal configura inquestionavelmente a figura do abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”; 12º - Pois estava-lhe vedado assumir posições contrárias a outras anteriormente tomadas de boa fé, com criação de expectativas legítimas e causando um dano; 13º - Constituem elementos do “venire contra factum proprium”, o factum próprio, no caso, o contrato de arrendamento assinado, a tomada de posição contrária à posição assumida anteriormente, no presente caso, a invocação da nulidade do contrato por ilegitimidade, a inexistência de qualquer causa que legitime tomada de posição diferente, não houve qualquer alteração das circunstâncias existentes à data da celebração do contrato, mais se verificando um dano, causado ao A./Recorrente – neste caso o não recebimento da renda acordada; 14º - Pelo exposto, deverá ser considerado válido o contrato de arrendamento e a Ré ser condenada reconhecer tal validade e no pagamento das rendas vencidas e vincendas já peticionadas; 15º - Se assim se não entender, o que se não se concede, tendo o Réu/ Recorrido ocupado e fruído o locado até ao termo do contrato e não tendo pago as rendas respectivas, enriqueceu-se sem causa que o justifique, nesse montante, encontrando-se o A/Recorrente empobrecido nesse mesmo valor; 16º - A sentença recorrido violou, entre outras, as disposições constantes dos artigos 334º e 473º e seguintes do C.C.;» Em sede de contra-alegações, o Recorrido pugna pela manutenção da sentença recorrida, salientando que não foi peticionado em 1.ª Instância o pagamento a título de responsabilidade civil ou de enriquecimento sem causa, que o direito de retenção não legitima o respetivo titular a gozar e a fruir da coisa retida, que o Recorrente estava obrigado a restituir à massa insolvente a fração que foi apreendida em benefício desta, que sendo o contrato de nulo (o que é de conhecimento oficioso) não faz sentido apelar ao instituto do abuso do direito.
Assim, atentas as conclusões da alegação de recurso, são as seguintes as questões a decidir: - da falta de fundamento para declaração de nulidade do contrato de arrendamento; - do abuso do direito; - do enriquecimento sem causa.
III – Fundamentos A – Os factos provados em 1.ª Instância 1. Na Conservatória do Registo Predial de Loulé encontra-se descrita sob o nº (…)/19920710 – AR, da freguesia de Quarteira, a fração autónoma assim designada pelas letras “AR”, destinada a habitação, correspondente ao 1º andar, do Bloco Central – 1º de norte para sul e 1º de poente para nascente –, do prédio urbano denominado Edifício (…), constituído no regime de propriedade horizontal, sito na Rua do (…), Lote 2.33 B, 8125 – 201 Quarteira, na cidade e freguesia de Quarteira, concelho de...
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