Acórdão nº 105/17.9TBOLH-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelRUI MACHADO E MOURA
Data da Resolução18 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

P. 105/17.9TBOLH-A.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: Banco Comercial Português, S.A., Sociedade Aberta, credor reclamante nos autos supra indicados em que são insolventes, (…) e (…), inconformado com a sentença de verificação e graduação de créditos, que graduou os créditos da Segurança Social em segundo lugar, graduando em terceiro o crédito do aqui reclamante, veio apelar de tal decisão, tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões: Primeira) Nos termos do artigo 686°, nº 1, do Código Civil, o direito de crédito garantido por hipoteca só cede perante os créditos que disponham de privilégio imobiliário especial ou prioridade no registo, e isso porque dos privilégios creditórios só os especiais, porque envolvidos de sequela, se traduzem em garantia real de cumprimento de obrigações, limitando-se os gerais a constituir a mera preferência de pagamento e sendo apenas susceptíveis de prevalecer em relação a titulares de créditos comuns, conforme se refere no Acórdão do STA, datado de 21 de Janeiro de 2009.

Segunda) Ora, a hipoteca, cujo registo é da natureza constitutiva, nos termos do disposto no artigo 687° do Código Civil, confere ao credor que dela beneficia "(...) o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo". Nos termos deste preceito, sem prejuízo dos créditos que gozem da prioridade de registo, só os créditos com privilégio especial podem obter pagamento antes dos créditos hipotecários. Os créditos com privilégio imobiliário especial são apenas os previstos nos artigos 743° (por despesas de justiça feitas relativamente aos bens imóveis em causa) e 744° (por contribuição predial e por impostos de transmissão dessas coisas), ambos do Código Civil.

Terceira) Sendo que, as contribuições devidas à Segurança Social apenas fruem de privilégio geral (mobiliário ou imobiliário), conforme decorre do disposto no artigo 204º do Lei 110/2009, de 16 de Setembro.

Quarta) O concurso entre uma garantia geral (privilégios gerais) e uma garantia especial (hipoteca) terá de ser resolvido pela prevalência da garantia especial. Mais acresce que, Quinta) Foi declarada inconstitucional, com força obrigatória geral a norma contida no artigo 11° do Decreto-Lei nº 103/80, de 9 de Maio, na interpretação segundo a qual o privilégio imobiliário geral nele conferido à Segurança Social prefere à hipoteca, nos termos do artigo 751° do Código Civil, por violação do artigo 2° da Constituição da República Portuguesa, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional nº 363/2002, publicado no Diário da República nº 239, Série l-A, de 16 de Outubro de 2002.

Sexta) Acontece que, o princípio da confiança é violado na medida em que, gozando o privilégio de preferência sobre os direitos reais de garantia, de que terceiros sejam titulares, sobre os bens onerados, esses terceiros são afectados sem, no entanto, lhes ser acessível o conhecimento da existência do crédito, protegido que está pelo segredo fiscal, quer do ónus do privilégio, devido à existência de registo.

Sétima) Sendo assim o artigo 11° do Decreto-Lei 103/80 materialmente inconstitucional por violar o princípio da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito (artigo 2° da Constituição) e por violar o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18°, nº 2, da Constituição, conforme menciona o Acórdão 697/2004 do Tribunal Constitucional.

Oitava) Tal inconstitucionalidade decorre do facto de quem compra, penhora ou aceita como garantia real imóveis às entidades empregadoras não tem possibilidade de saber primeiro se existem dívidas à Segurança Social, até porque a violação do sigilo sobre a sua situação contributiva é punida por lei.

Nona) Mais, o legislador do artigo 11° do Decreto-Lei 103/80, de 9 de Maio, não podia equiparar as contribuições para a Segurança Social aos impostos referidos no artigo 748° do Código Civil, sob pena de causar, como no caso sub judice causou uma grave violação do princípio da confiança legítima contido no princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2° da Constituição.

Décima) A solução consagrada no artigo 11°, do Diploma Legal, supra mencionado, é portanto desproporcionada, pois pode lesar gravemente terceiros de boa-fé caso a Segurança Social não tenha feito uso da garantia prevista no artigo 12° do mesmo Diploma.

Décima Primeira) Ora, a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral proferida pelo Tribunal Constitucional, possui força de lei e vincula, para além de outras entidades, todos os tribunais que, na resolução dos processos pendentes, não podem aplicar normas que infrinjam a Constituição ou os princípios nela consagrados, nos termos e para os efeitos do artigo 204° da Constituição.

Décima Segunda) E tendo as declarações de inconstitucionalidade ou de ilegalidade com força obrigatória geral, os efeitos previstos no artigo 282° da Constituição (artigo 66° da Lei 28/82, de 15 de Novembro) e sendo as decisões do Tribunal Constitucional obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecendo sobre as dos restantes tribunais e de quaisquer outras autoridades, nos termos do artigo 2° da Lei 28/82, de 15 de Novembro, é de aceitar que, contrariamente ao entendimento...

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