Acórdão nº 56033/17.3YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução18 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 56033/17 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório.

  1. (…) – Associação de Utilizadores do Sistema de Tratamento de Águas Residuais de (…), com sede na Rua Engº (…), 46, C/E, em (…), instaurou contra Curtumes (…), Lda., com sede na Rua da (…), 146, (…), procedimento de injunção de obrigação emergente de transação comercial, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia € 61.663,81, proveniente da prestação de serviços de tratamento de águas residuais, resíduos sólidos e recuperação de crómio, juros e taxa de justiça.

    A Ré deduziu oposição excecionando a ilegitimidade da A. e a prescrição da dívida, e contradizendo os factos alegados pela A. considerou, em síntese, que as quantias peticionadas não são devidas por não haverem sido prestados os serviços a que as mesmas se reportam.

    Concluiu, na procedência da exceção da ilegitimidade da A., pela absolvição da instância, na procedência da exceção da prescrição da dívida, pela absolvição do pedido e, em qualquer caso, pela improcedência da ação.

    Finda fase dos articulados, a R. atravessou requerimento nos autos, suscitando a exceção da incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, na consideração que a jurisdição administrativa é competente para conhecer do litígio.

    A A. respondeu defendendo a competência dos tribunais comuns.

  2. Houve lugar a audiência prévia, no decurso da qual foi proferido despacho a reconhecer competência aos tribunais administrativos e ficais para conhecer do litígio, concluindo, a final, pela incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria e pela absolvição da Ré da instância.

  3. A A. recorre desta decisão e exara as seguintes conclusões: “1. Na sentença o Meritíssimo Juiz “a quo” refere que as relações entre os associados e utilizadores dos serviços prestados pela Autora terão de ser dirimidos na jurisdição administrativa e não nos tribunais comuns.

  4. Para fundamentar a sua decisão traz à colação o Dec.-Lei 379/93, de 05 de Novembro e considera, em nossa opinião erradamente, que a concessão está sujeita, em toda a sua amplitude, às normas do referido Decreto-lei.

  5. Manifestamos, desde já, a nossa discordância com essa interpretação, pois consideramos que a sujeição é meramente residual, não tendo a ora Recorrente quaisquer poderes de autoridade, nem prossegue fins de interesse público, continuando esses na esfera da Câmara Municipal de (…), não tendo sido transferidos pelo contrato.

  6. Tanto mais se analisarmos o art.º 39º do Regulamento de Águas Residuais (junto aos autos) verificamos que os diferendos serão resolvidos por um Tribunal Arbitral, exceção feita ao pagamento das faturas pela utilização do sistema.

  7. As partes quiseram maior celeridade e menos custos na cobrança das faturas, retirando-as do Tribunal Arbitral, podendo lançar mão de um meio mais rápido na constituição de título executivo.

  8. No parecer emitido pelo ESAR, que se encontra junto aos autos, conclui-se pelo carácter singular e atípico desta concessão.

  9. É o próprio parecer da ERSAR que refere: “A situação da (…), explicável pelo contexto histórico acima descrito pode considerar-se atípica na medida em que não se enquadra em nenhum dos quadros legais em vigor “ e mais refere, “Acresce que esta qualidade (ser utilizadora do domínio público hídrico) não será título suficiente para a prestação do serviço público de saneamento de águas residuais” concluindo que “A (…) nunca se assumiu como sendo uma entidade gestora do serviço público de saneamento de águas residuais” 8. Nos termos do Contrato de Concessão, à (…) foi atribuída, a manutenção, a exploração, a gestão e a respetiva melhoria do sistema municipal de (…) de coleta e tratamento de águas residuais.

  10. O Sistema de (…) gerido pela (…) apenas residualmente se encontra dedicado ao saneamento de águas residuais urbanas.

  11. O rácio de dedicação da ETAR de (…) aos setores industrial e urbano é de 7/3 e as infraestruturas de drenagem são fundamentalmente usadas pelas águas industriais, uma vez que é feita pela (…) a recolha destas junto das empresas utilizadoras, o mesmo já não sucedendo com as águas residuais urbanas que são canalizadas para o Sistema pelo próprio Município.

  12. Estes dados são de tal modo impressivos ao ponto de tornar incontornável, que se questione a sujeição da integralidade do Contrato de Concessão ao Decreto-Lei n.° 194/2009, de 20 de Agosto, e mesmo, ao seu tempo, ao Decreto-Lei n.° 379/93.

  13. O Decreto-Lei n.° 194/2009, em cujo preâmbulo pode ler-se, que "[a]s atividades de abastecimento público de água às populações, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos constituem serviços públicos de carácter estrutural, essenciais ao bem-estar geral, à saúde pública e à segurança coletiva das populações, às atividades económicas e à proteção do ambiente".

  14. Salienta-se, portanto, a alusão expressa a águas residuais urbanas.

  15. Maior relevância assume, naturalmente, o corpo normativo deste diploma legal, em especial os respetivos artigos 1.º e 2.º, respeitantes ao objeto e ao âmbito do diploma legal em apreço.

  16. A esse propósito, o legislador de 2009, declarou que, em matéria de saneamento, nele se estabelece o regime jurídico de “saneamento de águas residuais urbanas” (cfr. artigo 1.°) e que os serviços de saneamento de águas residuais urbanas compreendem “[a] gestão dos sistemas municipais de recolha, drenagem, elevação, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas, bem como a recolha, transporte, e o destino final de lamas de fossas sépticas individuais” (cfr. artigo 2.°).

  17. A alusão a águas resíduas urbanas é uma constante ao longo do diploma.

  18. O conceito de águas residuais urbanas encontra-se definido no nosso ordenamento jurídico, no Decreto-Lei n.º 152/97, de 19 de Junho, que se aplica à recolha, tratamento e descarga de águas residuais urbanas no meio aquático, procedendo à transposição da Diretiva 91/271/CEE, do Conselho, de 21 de Maio de 1991.

  19. Este diploma legal adota a definição de águas residuais que é também adotada pela mencionada diretiva europeia, decompondo o conceito em três outros conceitos operativos: a) as águas residuais domésticas: que são “as águas residuais de serviços e de instalações residenciais, essencialmente provenientes do metabolismo humano e de atividades domésticas”; b) as águas residuais industriais, que correspondem às “águas residuais provenientes de qualquer tipo de atividade que não possam ser classificadas como águas residuais domésticas nem sejam águas pluviais” e, finalmente c) as águas residuais urbanas que define como as “águas residuais domésticas ou a nústura destas com águas residuais industriais e ou com águas pluviais” (cfr. n.º 2 do artigo 2.º).

  20. Também prevê no artigo 9.° as condições de descarga de águas residuais industriais nos sistemas de drenagem e nas estações de tratamento de águas residuais urbanas.

  21. ...

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