Acórdão nº 688/15.8T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução18 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 688/15.8T8FAR.E1 Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório No âmbito dos presentes autos de contra-ordenação foi a arguida CC, Lda, notificada pela autoridade administrativa (Autoridade para as Condições do Trabalho, doravante ACT), nos termos dos artigos 17.º e 19.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09 (Lei que aprovou o regime processual aplicável às contra-ordenações laborais e de segurança social), para proceder ao pagamento da coima e dos créditos laborais em dívida aos trabalhadores (€ 5.089,73), bem como à segurança social (€ 1.987,29).

Na sequência de tal notificação, em 20-06-2014 a arguida procedeu ao pagamento voluntário da coima, mas já não dos créditos laborais em dívida aos trabalhadores, bem como à segurança social, supra referidos.

O processo administrativo prosseguiu então os seus termos, com proposta de decisão e decisão, ambas no sentido de notificação da arguida para proceder ao pagamento ou depósito das já aludidas quantias em dívida aos trabalhadores (€ 5.089,73), bem como à segurança social (€ 1 987,29), num total de € 7.077,02, com a advertência de que se assim não procedesse a decisão se transformaria em título executivo.

*A arguida impugnou judicialmente tal decisão da autoridade administrativa, mas por sentença de 30-03-2017, da Comarca de Faro (Juízo do Trabalho de Faro – J2) foi negado provimento ao recurso e confirmada a decisão administrativa impugnada.

*De novo inconformada, a recorrente interpôs recurso para este Tribunal da Relação, tendo na respectiva motivação formulado as conclusões que se transcrevem: «I. O pagamento da coima determina, nos termos do n.º 3 do artigo 19.º da Lei n.º 107/2009, de 14.09, o arquivamento do processo, salvo se à contraordenação for aplicável sanção acessória, caso em que prossegue restrito à aplicação da mesma.

  1. Tendo a Arguida procedido ao pagamento da coima, o presente processo contraordenacional deveria ter sido arquivado extinguindo-se a responsabilidade contraordenacional, pelo que não deveria ter existido qualquer decisão final.

  2. O Tribunal a quo considerou, na Sentença recorrida, que o pagamento dos salários em atraso e respetivas contribuições para a segurança social integram a responsabilidade contraordenacional sancionatória a título de sanção acessória e, como tal, seriam suscetíveis de execução.

  3. Este entendimento é errado, porquanto sendo verdade que o artigo 26.º da Lei n.º 107/2009 e o artigo 89.º do regime geral das contraordenações conferem o efeito executório à coima e sanções acessórias, não é correto qualificar o pagamento dos salários como uma sanção acessória pois não consta do elenco de sanções previstas na lei.

  4. Admitir tal qualificação significaria aceitar que as sanções acessórias não estariam sujeitas a um princípio da legalidade ou, ainda, que os referidos artigos constituíam apenas um elenco exemplificativo das sanções acessórias possíveis, deixando ao critério da autoridade administrativa a aplicação de outras sanções não expressamente previstas – interpretações que seriam inconstitucionais por violação do princípio da legalidade das penas.

  5. Por outro lado, a decisão não pode ter um efeito executório quando o que está em causa uma quantia devida a um particular que não tem participação no processo (é apenas denunciante) e não é abrangido pela decisão – i.e. não pode ter efeito executório para terceiros.

  6. Por sua vez a ACT não tem legitimidade (nem interesse processual) para executar, em nome de pessoas individuais, a dita decisão, pois tal poder resulta da sua lei orgânica onde constam elencadas a sua missão e atribuições (cfr. artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31.07.

  7. O não pagamento de salários constitui uma situação de incumprimento contratual que nunca poderá ficar definitivamente resolvida, com força de caso julgado, por via administrativa, apenas podendo ser reconhecida judicialmente e no âmbito de uma ação própria emergente de contrato de trabalho.

  8. Uma entidade administrativa não pode impor, coercivamente, a um particular o pagamento de quantias cuja origem e natureza é meramente obrigacional e devidas a outro particular.

  9. Admitir-se esta interpretação significaria admitir que uma entidade administrativa poderia imiscuir-se em funções que integram o núcleo exclusivo da função judicial, o que violaria o princípio constitucional da separação de poderes sendo, por isso, inconstitucional – inconstitucionalidade que, para os devidos efeitos, aqui expressamente se invoca.

  10. Em suma, a decisão da contraordenação não pode, pelas razões acima aduzidas, ter força executiva quanto aos salários em dívida, uma vez que o processo contraordenacional se extinguiu com o pagamento da coima, pelo que o processo deveria ter sido arquivado com tal pagamento.

    A tudo isto acresce, ainda, o seguinte: XII. Os créditos que a ACT pretende que a Arguida pague já se encontram prescritos.

  11. O que a Arguida já havia alegado em sede de impugnação judicial da decisão administrativa, tendo a prescrição sido recentemente reconhecida no âmbito do processo de insolvência da Arguida, no apenso de reclamação de créditos, o qual correu termos no Juízo de Comércio de Olhão, sob o n.º de processo 1097/15.4T8OLH-B - Reclamação Créditos – Juiz 1 e que já transitou em julgado.

  12. Se os créditos estão prescritos, se os próprios titulares renunciaram à sua cobrança dentro do longo prazo que tiveram para o fazer, não pode a ACT vir cobrá-los em nome dos seus titulares em relação aos quais a Arguida não tem qualquer obrigação de pagamento.

  13. Como tal, não pode a ACT exigir coercivamente, no contexto de um processo contraordenacional, o pagamento de tais créditos, quando...

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