Acórdão nº 590/17.9T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMATA RIBEIRO
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA AA, na qualidade de herdeiro de BB, intentou em 28/03/2017, ação declarativa comum, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Évora (Juízo Central Cível e Criminal de Évora – J1), destinada a efetivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação ocorrido em 06/01/2011, contra CC – Companhia de seguros, S. A.

, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 138 278,06, acrescida de juros de mora.

Como sustentáculo do peticionado alega que CC (entretanto falecido em 09/11/2011, vítima de assassinato) era transportado num veículo seguro na ré, conduzido por DD, veículo este que se despistou devido à velocidade a que seguia e à imperícia e imprevidência do condutor, tendo em consequência do despiste o BB sofrido politraumatismos (craniano, facial, dos membros e coluna vertebral), ficando incapacitado durante muito tempo, sido sujeito a intervenções cirúrgicas e sofrido dores.

Citada a ré, por carta expedida em 26/04/2017, veio esta contestar invocando, além do mais, a prescrição do direito do autor. Em sede de audiência prévia foi proferido despacho saneador no qual foi julgada procedente a exceção perentória da prescrição do direito do autor e a ré absolvida do pedido. * Irresignado com esta decisão, veio o autor interpor o presente recurso e apresentar as respetivas alegações, terminando por formular as seguintes conclusões, que se transcrevem: “1ª - A douta decisão de Fls. lavra em equívoco, pois, por um lado, o prazo aplicável é o de cinco anos, e, por outro lado, ocorreram causas de interrupção e de suspensão do prazo de prescrição do direito.

  1. - Além disso, e decisivamente, não foi atendida a especial condição do Autor para se aferir a partir de que momento se inicia a contagem do prazo de prescrição.

  2. – O A. alegou os factos que caracterizam a culpa do condutor do veículo na produção do acidente (artºs 29º a 36º da p.i. de Fls ), alegou que a essa culpa pertenceu ao condutor (cfr. artºs 37 e 38º da P.I. de Fls.) e alegou que em consequência do sinistro o BB sofreu inúmeros danos corporais (cfr. artºs 42º a 82º da sua p.i. de Fls), 4ª - “Se o facto ilícito constituir crime” (artº 498º nº 3 do CC) significa isso mesmo, e não impõe a propositura de queixa criminal em separado. Basta que os factos tenham sido alegados para o tribunal aferir se o facto ilícito constituiu crime; 5ª - FOI DEVIDAMENTE CARACTERIZADA a culpa do condutor do veículo, de modo que o facto ilícito gerador de responsabilidade e integrador dessa culpa configura o crime de ofensas à integridade física grave, previsto no artigo 144º do Código Penal, cuja moldura penal é uma pena de prisão de dois a dez anos.

  3. - O artigo 118º nº 1 alínea c) do Cód. Penal dispõe que o procedimento criminal extingue-se passados cinco anos sobre a prática do facto, sendo assim evidente que o facto ilícito caracterizado na petição inicial de Fls constitui crime para o qual a Lei estabelece um prazo de prescrição mais longo, no caso, o de cinco anos.

  4. - Basta que o facto ilícito caracterizado na petição inicial constitua crime para o qual a Lei estabelece um prazo de prescrição mais longo, e, desde logo, o prazo de prescrição passa a ser o de cinco anos, previsto no artº 498º nº 3 do Código Civil.

  5. – É o que sucede nos presentes autos e assim deve ser entendido.

  6. – A questão central do recurso prende-se com o disposto no artº 306º nº 1 do C.C: “O prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido (…)”.

  7. - O A. AA só pôde exercer o seu direito a partir do momento em que foi lavrado o Procedimento simplificado de Habilitação de Herdeiros e Registos” do passado dia 18 de Janeiro de 2017, e também só pôde intervir neste procedimento depois de lavrada a sentença do dia 7 de Dezembro de 2016, tudo por via dos factos explicitados nos artigos 1º a 19º da p.i. de fls (que aqui devem ser dados por reproduzidos) 11ª - A condição sine qua non para conseguir a declaração de indignidade sucessória do DD (filho do BB, sinistrado), era dispor de uma sentença do foro criminal, com trânsito em julgado, onde ficasse provado, como ficou, que o filho praticou o crime de homicídio qualificado do Pai, BB.

  8. - Só com a prova da prática de crime em primeiro grau é que a indignidade sucessória pode vir a ser declarada (artº 2034º do CC), mas sucedeu que o arguido DD interpôs recurso da decisão, que só transitou em julgado no ano de 2014.

  9. – E na ação que seu Avô, ora autor, lhe moveu, para obter a declaração de indignidade sucessória, ainda recorreu da decisão que o condenou mas, em finais de 2016 aceitou transigir, nos termos do Doc. nº 4 anexo à p.i. de Fls. .

  10. - O A. não tem culpa quanto à prolongada marcha do processo criminal, nem, tão-pouco, quanto à demora do processo de indignidade sucessória.

  11. - Obtida a sentença da transação, em Dezembro de 2016, passados poucos dias promoveu o Procedimento de Habilitação de Herdeiros e Registos” de 18 de Janeiro de 2017, no qual passou a assumir a qualidade de único herdeiro de DD.

  12. – Logo propôs a presente ação, tendo a ré sido citada em 27 de Abril de 2017.

  13. - Encontram-se em causa um encadeado de factos, pressuposto uns dos outros, o que não foi valorizado pela Senhora Juíza a quo na sua justa medida.

  14. – Face ao disposto no artº 306º nº 1 do Cód. Civil, e a todas as circunstâncias do caso concreto, deve ser entendido que o Autor exerceu o seu direito em tempo, ou seja, deve ser entendido que o seu direito não se encontra prescrito.

  15. – ACRESCE QUE a ação proposta pela herança de BB em 2012, foi, precisamente, uma tentativa de exercer o direito face à pendência do processo criminal, e a previsível demora da subsequente ação de indignidade sucessória.

  16. – E quem representou a herança FOI O ORA AUTOR, que assumiu sempre, com a devida diligência, atos legítimos de exercício do Direito perante a ora ré – A MESMA RÉ, que na altura assumiu a responsabilidade pela liquidação dos danos.

  17. – E a circunstância da herança não dispor de personalidade judiciária apenas foi julgada em 2015, e, portanto, ano em que o Autor propôs a ação de indignidade sucessória, pois até aí mantinha-se pendente a ação movida pela herança de BB, a qual, em tese, poderia ser julgada procedente.

  18. - Nunca houve inércia da parte do autor.

  19. - ACRESCE AINDA QUE a Ré sabia da pendência do processo crime (cfr. se atesta pela leitura da contestação, ora junta, e então apresentada) e sabia que a decisão de absolvição da instância na ação anterior ocorreu em 2015, pois dela foi notificada.

  20. - A Ré chegou a referir que o Ministério Público deveria propor ação a declarar a indignidade sucessória – artº 44º dessa douta contestação - pelo que logo em Novembro de 2012 mostrou-se perfeitamente conhecedora das limitações da personalidade judiciária da então autora da ação, e sabia que era necessária a propositura de ação judicial a declarar a indignidade sucessória do DD.

  21. – E assim, caso o ora A. avançasse com uma ação como herdeiro em 2012 seria parte ilegítima e estaríamos perante uma questão – objetiva – de litispendência.

  22. - Não é conforme à boa-fé que a Ré venha agora, aquando da sua citação para os termos da presente ação, invocar a prescrição do direito do legitimo titular, que só pôde exercer o direito e só ganhou a devida legitimidade em 2017, pelos motivos que a mesma ré bem conhece e dos quais teve sempre plena consciência.

  23. - O princípio da boa-fé enforma todo o Direito Civil e todo o Direito Processual Civil – artºs 227º, 239º, 272º, 275º nº 2, 437º, e 762º nº 2 do Cód. Civil e artº 8º do CPC 28ª – De modo que tal alegação constitui abuso de direito (cfr. o disposto no artº 334º do Código Civil), devendo, assim, ser julgada improcedente a exceção invocada.

  24. - SEM PRESCINDIR, e considerando que o prazo de prescrição é de cinco anos, relevam as circunstâncias da Ré CC ter praticado atos que configuram assunção de responsabilidade pela liquidação dos danos emergentes do sinistro em Agosto de 2011 (cfr. carta junta como doc. nº 8 com a PI de fls), em Novembro de 2011 ( cfr. factos confessados nos artºs 34 e 35 da contestação de fls), e também a confissão expressa no artº 63º da contestação então apresentada (cfr. cópia junta).

  25. - Em Dezembro de 2012, a Ré declara que assumiu a responsabilidade pela liquidação dos danos emergentes do sinistro e...

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