Acórdão nº 386/09.1TASLV.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 20 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Em conferência, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I. RELATÓRIO A.

  1. – Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correram termos na secção de competência genérica (J2) da Instância Local de Silves da Comarca de Faro, o MP acusou A., casado, gestor, natural da freguesia e concelho de Palmela, nascido em 27.06.1977, residente em Lagos, a quem imputara factos suscetíveis de integrarem a prática, como autor material, de um crime de falsificação de documentos, na forma continuada, p. e p. pelos arts 256º nº 1 alíneas b) e c) e 30°,2 do C.Penal.

  2. Por requerimento de fls. 876 a 878, o BANCO X deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 37 500 euros a título de indemnização por danos patrimoniais decorrentes do crime, acrescida de juros de mora vencidos de 7 668 euros.

  3. - Realizada a Audiência de discussão e julgamento, o tribunal singular decidiu: - Condenar o arguido como autor material de um crime de falsificação de documentos, pelo menos na modalidade de uso de documento falsificado, p. e p. pelo art. 256° n° 1 alíneas c), d) e e) do C. Penal, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), o que perfaz a quantia de € 2.000,00 [dois mil euros); - Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo BANCO X, procedente, por provado e, em consequência, condenar o demandado no pagamento ao demandante da quantia de € 37.500,00 (trinta e sete mil e quinhentos euros), a título de danos patrimoniais sofridos, acrescida dos juros de mora, contabilizados à taxa legal desde a notificação do demandado para contestar o pedido de indemnização; 4.

    – Inconformado, o arguido interpôs recurso da sentença condenatória, que foi julgado procedente por acórdão desta Relação de 13.09.2016, que determinou o reenvio do processo para novo julgamento pelo tribunal a que se reporta o art. 426º-A do CPP, relativamente aos pontos 4. a 15. da factualidade originariamente provada, com a consequente prolação de nova decisão absolutória ou condenatória, com fundamento na ocorrência do vício de Contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão previsto na al. b) do nº2 do art. 410º do CPP.

    B.

  4. Reenviado o processo e realizado novo julgamento parcial da causa, o tribunal a quo proferiu nova sentença, que condenou o arguido: - Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, na forma continuada, previsto e punido pelo artigo 256.° n. 1 alínea c) e e) e 30.° n. 2 do Código Penal, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de €8.00 (oito euros), o que perfaz a quantia de €2.000 (dois mil euros); - A pagar ao Demandante a quantia de €37.500, a título de danos patrimoniais sofridos, acrescidos de juros de mora, contabilizados à taxa legal, desde a notificação do Demandado para contestar o pedido de indemnização civil.

  5. Novamente inconformado, o arguido interpôs recurso desta nova sentença, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: «III – CONCLUSÕES 1 - Vem o presente recurso interposto da sentença de fls … que condenou o arguido pela prática de um crime de falsificação de documento previsto e punido pelo artigo 256.º n.º1 alínea c) e e) e 30.º n.º2 do Código Penal, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de €8.00 (oito euros), bem como nas custas do processo, do pedido de indemnização civil e a pagar ao Demandante a quantia de €37.500, a título de danos patrimoniais 2 - Entende o ora Recorrente, que face à factualidade decorrente de todos os meios de prova carreados para os autos, a decisão em causa não faz uma correcta interpretação dos factos, manifestando erro notório na apreciação da prova.

    3 – Considerou o Tribunal a quo como factos provados os elencados de 1 a 26 da sentença condenatória.

    4 – Deveriam ter sido considerados provados apenas os factos 1, 2, 3, 17, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26.

    5 – Todos os factos que deveriam ter sido considerados não provados resultam, ou são consequência, do facto provado n.º 5, segundo o qual “Para o efeito, o Arguido, em data não concretamente apurada, apôs nos talões referidos em 4. e 7. os dizeres “JFV” ou “JV” de forma a imitar a assinatura do representante legal da sociedade “FV& Filhos, Lda, entregando posteriormente os referidos talões de levantamento no balcão da agência referida em 1.º, já devidamente assinados, e apropriava-se do dinheiro respectivo.” 6 – Da conjugação da prova testemunhal com a documental não resultou matéria que permitisse considerar tal facto como provado.

    7 – Da prova documental, nomeadamente dos relatórios periciais, não se extrai a probabilidade mínima de ter sido o ora Recorrente o autor de tal(is) falsificação(ões), concluindo o respectivo relatório pela incerteza quanto ao autor da(s) mesma(s).

    8 – Na dúvida, o Tribunal a quo entendeu condenar o Recorrente como autor das falsificações.

    9 –Nunca resultou da prova produzida em audiência que o Recorrente se tivesse efectivamente locupletado com tais quantias.

    10 – Da prova documental, constam documentos que comprovam a situação pessoal e economicamente desafogada do Recorrente já em data anterior à dos factos.

    11 – Dos extractos e saldos bancários das contas do Recorrente à data dos factos juntos aos autos não se extrai nunca que o arguido se tenha apropriado das verbas referidas na acusação.

    12 – Toda a documentação relativa ao leasing constam dos autos, o que demonstra claramente que nunca, nem nada, foi feito à revelia da Instituição ou do cliente.

    13 – Nunca houve qualquer apropriação de verbas de quem quer que fosse, não tendo o contrário resultado provado em audiência de discussão e julgamento.

    14 – Sendo assim manifesto e evidente o erro notório na apreciação da prova.

    15 – A sentença de que ora se recorre faz tábua rasa de tudo o que foi alegado pelo Recorrente em sede de Contestação, ignorando os fundamentos da sua defesa.

    16 – Não colocando sequer a hipótese de o arguido ter sido, ele próprio, vítima de um logro por parte do representante legal da FV & Filhos, Lda., JV, e do construtor, JG.

    17 – Também o relatório pericial não demonstrou que o Recorrente tivesse sido o autor das falsificações de que vem acusado, devendo, por isso, beneficiar do princípio in dubio pro reu.

    18 - O próprio JV admitiu ele próprio ter assinado vários talões em branco.

    19 - É, de resto, o que resulta do seu depoimento aos 9 minutos e 4 segundos.

    20 – Aliás, decorre dessa parte do seu depoimento o facto de ter assinado alguns daqueles documentos apesar de não mostrar grande certeza e segurança sobre quais.

    21 - Assim, sem qualquer razão que o justifique, o Tribunal a quo deu prevalência à versão do Sr. João Vieira, em detrimento da apresentada pelo Recorrente.

    22 – Nesse sentido, o Tribunal a quo fez uma interpretação manifestamente errada da prova uma vez que não resulta, nem podia, resultar provado que o arguido, em primeiro lugar, tivesse forjado a assinatura de quem quer que fosse e, em segundo lugar, que tivesse feito suas as quantias alegadamente subtraídas à sociedade supra referida.

    23 - Os depósitos nas contas do Recorrente nada indiciam quanto à apropriação de quantias que não lhe pertencessem.

    24 - O Tribunal apenas pode concluir que no período entre 2 de Julho de 2008 e 20 de Janeiro de 2009 os depósitos em numerário na conta do Arguido se intensificaram e foram em montantes mais elevados que no período entre Julho de 2007 e Julho de 2008.

    25 – Mais nada! 26 - Não se alcança desde logo a relevância de tal conclusão, uma vez que não se provou qualquer ligação desses depósitos à prática de quaisquer actos ilícitos cometidos pelo Recorrente.

    27 - O Recorrente comprovou nos autos que tinha rendimentos de vários quadrantes e proveniências.

    28 - A relevância dada pelo Tribunal a quo aos mesmos constituiu, consequentemente, nova apreciação desacertada da prova, neste caso, documental.

    29 - O art.º 256.º/1 do Código Penal, para efeitos da qualificação do crime de falsificação de documento, determina a necessidade da intenção de causar prejuízo a terceiro, bem como obter para si ou para outrem benefício ilegítimo.

    30 – Nenhum desses dois elementos resultou provado em sede de audiência; 31 – Não houve qualquer intenção do Recorrente em causar prejuízo a quem quer que fosse, nem resultou qualquer prova de que o Recorrente tivesse feito sua a importância total de € 37.500,00.

    32 – O Tribunal a quo decide naquele sentido de forma conclusiva porque a ligação que faz entre a documentação junta aos autos e a conclusão a que chega não tem correspondência com a realidade.

    33 – E não se tendo provado que foi o Recorrido o autor da falsificação de documentos, nada também será devido ao demandante a título de indemnização por danos patrimoniais.

    Nestes termos e nos melhores de Direito...

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