Acórdão nº 715/17.4T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 - Relatório.

Em 16.09.2016 no cartório da Sr.ª Dr.ª Maria Helena Afonso foi celebrado um contrato de promessa de constituição de direito de superfície sobre o prédio sito na rua do …, números …-… e rua do …, freguesia da … concelho do Funchal.

Em 18.09.2016, foi dada entrada pela Sr.ª Notária do pedido de registo daquele contrato promessa.

Em 23.09.2016, foi a Sr.ª Dr.ª Maria Helena Afonso notificada para suprir as insuficiências de pedido de registo do contrato.

Por despacho de 30.09.2016, a senhora Conservadora recusou o pedido de registo.

BB, Lda. apresentou recurso hierárquico.

No recurso hierárquico, foi requerida a anulação do despacho de 30/09/2016 proferido pela Conservatória do Registo Predial de Santarém e que fosse ordenada a renovação do registo, nos termos requeridos, com data do primeiro pedido de registo (19/09/2016).

Em 07/02/2017 o Presidente do Conselho Directivo do IRN proferiu despacho que indeferiu liminarmente o recurso hierárquico apresentado pela recorrente, com base no Parecer Técnico e/ou Jurídico da Sr.ª Conservadora CC, proferido na mesma data, invocando a intempestividade da apresentação do recurso hierárquico e a ilegitimidade da recorrente BB, Lda., para interpor recurso hierárquico.

Perante aquela decisão, em 06/03/2017, BB Lda.

interpôs impugnação judicial da decisão proferida pelo Presidente do Conselho Directivo do Instituto dos Registos e notariado (IRN) que indeferiu liminarmente o recurso hierárquico apresentado.

Para tal alega que o indeferimento se sustentou no parecer da Conservadora CC que invocou a intempestividade da apresentação do recurso e a ilegitimidade da apresentante.

Pede que a impugnação seja procedente e, em consequência, se anule o despacho de 07.02.2017 e se anule o despacho de 30.09.2016 proferido pela Conservatória do Registo Predial de Santarém e se ordene a realização do registo do direito de superfície.

O Ministério Público, a fls.110, emitiu parecer, onde pugna pelo não provimento do recurso por extemporaneidade do recurso hierárquico apresentado.

Por decisão de 13.05.2017, foi julgado parcialmente procedente o recurso e decidido (decisão ora recorrida): - Considerar tempestiva a apresentação do recurso hierárquico; - Manter o despacho proferido pela Sr.ª Conservadora que decidiu recusar o registo provisório do direito de superfície.

Custas pela recorrente.

É desta decisão que a BB, Lda. agora recorre, formulando as seguintes conclusões: ”I. O tema a decidir nos presentes autos é apenas um: saber se a ora Recorrente tem ou não legitimidade para impugnar por via hierárquica ou por via judicial a decisão do conservador de 30.9.2016 que recusou o pedido de registo apresentado pela Notária Dra. DD em 19/9/2016, da promessa de constituição do direito de superfície sobre o prédio na Rua do …, n.ºs …-… e Rua do …, freguesia da …, concelho do Funchal, que é um lote de terreno para construção, com a área de 1.029M2, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo …, e descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob a ficha n.º …/….

  1. Para a sentença recorrida, proferida em 13/05/2017, com a referência nº 75145718, a Recorrente, que é o sujeito activo do facto sujeito a registo, não tem legitimidade para impugnar por via hierárquica ou por via judicial a decisão do conservador que recusou o referido registo.

    Para o Tribunal, só a Notária que fez o reconhecimento das assinaturas no contrato em causa e pediu o registo ... , é que tem legitimidade para levar a cabo essa impugnação ...

  2. Julga a Recorrente que a sentença recorrida patenteia um entendimento meramente formalista das normas que regulam a impugnação dos actos dos conservadores, enforma de uma muito má interpretação e aplicação do direito no que respeita à fixação dos pressupostos da acção, mais concretamente quanto ao pressuposto da legitimidade da ora Recorrente, e constitui uma má decisão, que ignora a realidade que o Direito visa regular.

  3. Na sua decisão, o Tribunal a quo limitou-se a aderir à fundamentação do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 19/02/2013, não tendo sido feita qualquer interpretação das normas aplicáveis, em confronto directo com o caso concreto.

  4. O Tribunal a quo fez tábua rasa das disposições legais aplicáveis, desrespeitando a lei e os direitos dos sujeitos que com as conservatórias se relacionam: VI. É verdade que nos termos do artigo 8.º-B, do CRP, introduzido pelo DL n.º 116/2008, de 4/7, os Notários que celebrem escritura pública, autentiquem documentos particulares ou reconheçam as assinaturas neles apostas, são sujeitos da obrigação de registar.

  5. Mas também o é que a obrigação a cargo do Notário só abrange os factos ... que nos termos do artigo 8º-A sejam de registo obrigatório. E no caso dos autos, tratando-se de um simples registo provisório de aquisição, o mesmo não se enquadra nos factos de registo obrigatório, sendo antes meramente facultativo; confira-se, artigos 8º-A, nº 1, alínea i) e 92º, nº 1, alínea g), ambos do CRP.

  6. Quer isto dizer que, no caso dos autos, a Sra. Notária DD não pediu o registo ao abrigo de um dever legal de registar, inexistente no caso; antes pediu o registo ao abrigo de mandato, que a lei até presume tácito nos termos do artigo 39º, nº 2 do CRP.

  7. Mas ainda que no caso estivéssemos perante uma situação de registo obrigatório, e não estamos como acima ficou demonstrado, nem assim o dever da Notária, e a intervenção desta, esgotaria a legitimidade para registar, nem isso faria sentido, pois é evidente que o registo visa também a tutela dos direitos dos sujeitos activos dos factos sujeito a registo. Ou seja, a legitimidade do Notário em caso de registo obrigatório não exclui a legitimidade do sujeito activo dos factos, isto é, a ora Recorrente.

  8. Que o apontado dever legal do notário em nada prejudica o direito dos sujeitos da respectiva relação jurídica de pedir o registo dos factos a ele submetidos, resulta inequívoca e expressamente do artigo 36.º do próprio CRP, o qual confere legitimidade a "todas as pessoas que nele tenham interesse ou que estejam obrigadas à sua promoção". Com esse dever legal de pedir o registo, que como se disse só abrange os casos em que estejam factos sujeitos a registo predial obrigatório, pretendeu o legislador impor ao notário uma obrigação de diligência: ou assegura que os interessados pedem ou registo, ou pede ele próprio o registo. É esse inequivocamente o sentido do disposto no artigo 8º-B, nº 5 do CRP, que afasta o dever do Notário, quando os próprios sujeitos activos dos factos pedem o registo.

  9. Dúvidas não podem restar de que, nos casos em que o pedido de registo é subscrito por notário o sujeito activo dos factos levados a registo tem legitimidade para os termos do contencioso previsto nos artigos 140º e seguintes do CRP, ou seja, para impugnar as decisões que venham a ser tomadas quanto ao pedido de registo ... Nesses casos, a legitimidade não se resume ao Notário.

  10. E isto vale seja nos casos de factos sujeitos a registo predial obrigatório, seja nos casos de registo predial não obrigatório.

  11. Quanto aos casos, como o dos autos, de registo predial não obrigatório: a) Nestes casos, de registo predial não obrigatório, o Notário age única e exclusivamente como representante do sujeito activo dos factos sujeitos a registo.

    b) Quer isto dizer que no caso dos autos, a Dra. DD ao pedir o registo provisório por natureza da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT