Acórdão nº 5863/17.8T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora *** I. Relatório.

A Caixa de Previdência de Advogados e Solicitadores (CPAS) intentou a presente ação executiva no Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, Juízo de Execução de Setúbal - Juiz 2, contra BB, solicitadora, com domicílio em Sesimbra, para cobrança da quantia de €65.952,7, apresentando como título executivo uma certidão de dívida emitida pela Direção da CPAS, referente a contribuições devidas pela executada àquela instituição de previdência, alegando que a mesma constitui título executivo nos termos do art 703º, nº 1 al. d-) do CPC e art. 81.º, n.º5, do Dec. Lei n.º 119/2015.

O tribunal indeferiu liminarmente o requerimento executivo, com fundamento na verificação da exceção da incompetência em razão da matéria, por entender que era ao tribunal administrativo/tributário que cabia a competência para tramitar o processo, exarando a seguinte fundamentação: “A questão que se coloca é saber se este Tribunal é competente em razão da matéria para conhecer o presente processo.

Nos termos do art. 129º, nº 1 da LOSJ, compete aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no CPC.

Ora, estando em causa a cobrança coerciva de contribuições devidas à Caixa de Previdência de Advogados e Solicitadores, ocorre a circunstância de tais contribuições não terem natureza civil, mas sim tributária, constituindo uma fonte de receita daquela instituição e inserindo-se no financiamento do subsistema de segurança social específico para os advogados e solicitadores, e dessa forma integrando a satisfação do encargo do Estado em garantir o direito à segurança social dos respetivos profissionais (vide Ac. do STA de 09.10.2003, proc. 01072/03 e do TCAN de 26.11.2009, proc. 01009/07.9BEPRT, www.dgsi.pt).

Não estamos perante um processo de execução de natureza cível, na medida em que a relação jurídica trazida a juízo é de natureza administrativa e está abrangida pela competência dos tribunais administrativos, nos termos da al. 0-) do nº 2 do art. 4º do ETAF.

Neste sentido temos, entre outros, os Acórdãos da Relação de Lisboa de 09.03.2017., proc. 17398/15.9T8LRS.L1-2, in www.dgsi.pt, Relação do Porto, de 20.06.2016.

A incompetência material implica a incompetência absoluta do tribunal (art. 96º, nº 1 al. a-) do CPC).

Trata-se de uma exceção dilatória não suprível e de conhecimento oficioso que, in casu, implica o indeferimento liminar do requerimento executivo – arts. 99º, nº 1, 577º, al. a-), 577º, al. a-), 578º e 726º, nº 2, al. b-) do CPC)”.

Inconformada com este despacho, veio a Exequente interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1. A CPAS “(…) é uma instituição de previdência autónoma, com personalidade jurídica, regime próprio e gestão privativa (…)”.

  1. A CPAS não está sujeita a um poder de superintendência do Governo, mas a um mero poder de tutela meramente inspectiva.

  2. A CPAS não faz parte da administração direta ou indireta do Estado.

  3. Os seus membros diretivos não são designados pelo Governo, mas eleitos «pelas assembleias dos Advogados e dos associados da Câmara dos Solicitadores».

  4. A CPAS não é financiada com dinheiros públicos, sejam oriundos do Orçamento do Estado e/ou do Orçamento da Segurança Social.

  5. A CPAS está sujeita a um regime jurídico específico, o que nos permite concluir pela autonomia do regime privativo de previdência aqui em causa.

  6. A CPAS tem uma forte componente privatística, sendo o litígio aqui em apreço de natureza privada.

  7. As contribuições para a CPAS não têm natureza tributária, na medida em que assentam na pessoalidade, pois emergem do facto do sujeito passivo ser Advogado ou Solicitador; resultam da vontade do beneficiário, que opta pelo montante da contribuição a pagar, para além do escalão mínimo; são estabelecidas com base numa relação sinalagmática, consubstanciada entre o montante das contribuições pagas e a futura pensão de reforma a ser recebida pelo beneficiário; e não se destinam a garantir a satisfação de um encargo público do Estado.

  8. A sentença do Tribunal a quo, conclui que a competência para julgar a presente ação executiva pertence aos Tribunais Administrativos e Fiscais.

  9. Todavia, o n.º 2 do artigo 148.º do Código de Procedimento e Processo Tributário impõe, para que se possa fazer uso o processo de execução fiscal, no caso de “dívidas a pessoas coletivas de direito público que devam ser pagas por força de ato administrativo”, que a lei estipule expressamente os casos e os termos em que o pode fazer.

  10. E, o artigo 179.º do Código de Procedimento Administrativo prescreve que “Quando, (…), devam ser pagas prestações pecuniárias a uma pessoa coletiva pública, (…), segue-se, na falta de pagamento voluntário fixado, o processo de execução fiscal (…)”.

  11. Contudo, no Novo Regulamento da CPAS, como vimos, não existe norma que, de forma expressa, determine que as dívidas à CPAS sejam cobradas através de processo de execução fiscal a correr nos serviços de finanças.

  12. O que foi confirmado, já depois da entrada em vigor do Novo Regulamento da CPAS, pela Autoridade Tributária e Aduaneira à Direção da CPAS, conforme resulta da informação junta sob doc. 1.

  13. Também não colhe, igualmente, o entendimento vertido no Acórdão do Tribunal de Conflitos de 22/04/2017, segundo o qual a cobrança das contribuições da CPAS deveria ser concretizada através de processo de execução fiscal a promover pela Segurança Social, pois inexiste norma que a habilite, de forma expressa, a instaurar processos de execução fiscal sobre esta matéria.

  14. E porque, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do Código de Processo Civil “A todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde a ação adequada”, não resta à CPAS outro caminho senão recorrer aos tribunais judiciais, como no presente caso, para cobrar as contribuições em dívida por parte dos seus beneficiários, isto sob pena de ficar sem tutela jurisdicional efetiva para o apontado propósito.

  15. Assim a interpretação das referidas normas de modo a concluir pela incompetência do Tribunal a quo, acarretaria o incumprimento de preceito constitucional, constante do n.º 1 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, que estipula que “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (…)”.

  16. Tendo em conta este preceito constitucional e a interpretação conjugada da alínea o) do n.º 1 do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e do n.º 2 do artigo 148.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, ou seja, de que apenas os tribunais administrativos e fiscais seriam competentes para dirimir os litígios entre a CPAS e os seus beneficiários, é...

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