Acórdão nº 324/17.8PBBJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS BERGUETE COELHO
Data da Resolução24 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1. RELATÓRIO Nos autos de processo sumário em referência, que correu termos no Juízo Local Criminal de Beja do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, realizado julgamento e proferida oralmente sentença (com transcrição efectuada na 1.ª instância), o arguido AA foi condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal (CP), na pena de 50 (cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 7,00 (sete euros), no total de € 350,00, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer tipo, em vias públicas ou equiparadas, pelo período de 5 (cinco) meses.

Inconformado com tal decisão, o arguido interpôs recurso, formulando as conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a acusação, condenando o arguido pela pratica como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292º, n.º 1, e 69º n.º 1, al. a), ambos do Código Penal na pena de 50 (cinquenta) dias de multa à taxa diária de 7,00€ (sete euros), o que perfaz a quantia de 350,00€ (euros),e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer tipo, em vias públicas ou equiparadas, pelo período de 5 (cinco) meses.

  1. Não pode o arguido conformar-se com tal decisão, no que à pena acessória diz respeito, por considerarmos a mesma excessiva para a culpa do arguido.

  2. O arguido confessou espontaneamente os factos pelos quais vem acusado.

  3. A medida de inibição causa-lhe grande transtorno e enorme prejuízo aliás como ficou explanado nas declarações e condições pessoais e sociais do arguido (provadas).

  4. Sendo que, nos termos do disposto no nº 3 do Art. 139º do Código da Estrada, aprovado pelo D.L. 114/94, de 3 de Maio com as alterações introduzidas pelo D.L. 2/98, de 3 de Janeiro, “a sanção de inibição de conduzir é cumprida em dias seguidos”.

  5. Consideramos que este dispositivo legal viola o direito, constitucionalmente consagrado e assegurado nos termos do nº 1 do Art. 58º da C.R.P., ao trabalho. Segundo esta norma constitucional todos têm direito ao trabalho.

  6. Pelo que a sanção aplicada ao arguido de conduzir em dias seguidos impede de desempenhar as suas funções laborais, violando assim o seu direito ao trabalho.

  7. A violação desta norma constitucional tem implicações directas na violação de outros direitos, nomeadamente, o direito a uma existência condigna.

    Pelo que concluímos pela inconstitucionalidade material do nº 3 do art. 139º do Código da Estrada por violação do disposto no preceito constitucional, Art. 58º nº1 9. Mais acresce que nos termos do disposto no nº 2 do Art. 18º da C. R. P., “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.

    No caso sub judice, a norma legal considerada aqui inconstitucional, peca por restringir o direito económico que é o direito ao trabalho.

  8. O nº 3 do Art. 139º do Código da Estrada, aprovado pelo D.L. 114/94, de 3 de Maio com as alterações introduzidas pelo D. L. 2/98, de 3 de Janeiro, viola o direito ao trabalho constitucionalmente consagrado pelo nº1 do Art. 58º da C.R.P. Pelo que, padece de inconstitucionalidade material, não devendo, assim, ser aplicado.

  9. Todavia, na sentença proferida pelo Tribunal a quo de que aqui se recorre foi aplicada ao arguido a sanção acessória de inibição de conduzir.

  10. Sendo que se nos termos da lei (a nosso ver inconstitucional) esta sanção tem de ser aplicada em dias seguidos - Art. 139 nº 3 do Código da Estrada - estamos perante uma incongruência e desconformidade entre uma norma legal e uma norma constitucional.

  11. Na hierarquia das leis as normas constitucionais prevalecem sobre as normas legais.

  12. Deste modo violando a norma legal em apreço, uma norma constitucional, estamos perante uma norma que não poderá deixar de se considerar, flagrantemente, violadora dos princípios basilares do Estado de Direito Democrático, em que os direitos dos cidadãos são tutelados pela Lei Fundamental do Estado Português.

  13. Pelo que concluímos que, a sanção de inibição de conduzir não poderá ser aplicada em dias seguidos nem no espaço de tempo atribuído (ao contrário do preceituado no Código da Estrada) de modo a violar o direito constitucional ao trabalho e à dignidade da pessoa humana, à qual é garantido o direito a uma existência condigna.

    Sem conceder sempre se dirá que, pelo menos 16. A sentença deve ser revogada na parte referente à medida de inibição de conduzir veículos com motor substituindo-se por outro que reduza essa medida para 3 (três) meses, sendo suspensa na sua execução pelo período de 2 anos mediante prestação de boa conduta.

  14. A determinação da medida da pena acessória deve operar-se mediante recurso aos critérios gerais constantes do art. 71º do CP, com a ressalva de que a finalidade a atingir pela pena acessória é mais restrita, na medida em que a sanção acessória tem em vista sobretudo prevenir a perigosidade do agente, ainda que se lhe assinale também um efeito de prevenção geral.

    IMPORTANTE, 18. A falta de antecedentes e ausência de perigo concreto.

  15. O arguido não ter colocado em perigo a sua segurança como nem a de quaisquer utentes da via pública.

  16. A distância até ao destino ser mínima.

    TAMBÉM, 21. O arguido sendo primário, permite-se esperar que sanção terá o efeito de choque, por constituir o primeiro confronto com os órgãos repressivos, evitando a prática de novas condutas semelhantes.

  17. Afigura-se que a medida da inibição dentro do mínimo legal (3 meses) alcança justificação.

  18. No que toca à suspensão da sanção pensamos que a simples censura do facto, a ameaça da inibição de condução e a prestação da caução de boa conduta, bastam para a realização de forma adequada e suficiente das finalidades da punição de prevenção geral e prevenção especial.

  19. Reforçamos que o recorrente se conforma com os factos e sua qualificação jurídica, bem como com a natureza e medida concreta da pena principal em que foi condenado, sendo que apenas discorda da medida concreta da pena acessória de proibição de conduzir, que considera excessiva e que a mesma deverá ser suspensa na sua execução.

  20. No que respeita à determinação da medida concreta da pena acessória, teria a mesma de ser fixada dentro da moldura penal abstracta - com um mínimo de três meses e um máximo de três anos - de acordo com a culpa e as exigências de prevenção (geral e especial), bem como a todas as circunstâncias que depuserem a favor ou contra o arguido (artigo 71º do Código Penal), fazendo-se, por isso, o mesmo raciocínio que se fez para graduar a pena principal.

  21. Assim, a sanção acessória é concretamente determinada em função da culpa do agente e das exigências da prevenção especial e geral.

  22. O recorrente, nunca tinha sido condenado por conduzir em estado de embriaguez, nem por qualquer outro crime.

  23. Daí sermos de opinião que a aplicação de uma proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 5 (cinco) meses é, atenta a sua moldura abstracta de três meses a três anos, desadequada, (podendo de igual modo contribuir de forma válida e eficaz para fazer sentir ao arguido/recorrente o que esperam de si, enquanto condutor, os seus concidadãos, fazendo-o entender que a condução de veículo sob influência do álcool representa um perigo para a comunidade, o qual deve ser evitado), se o for reduzida para o mínimo legal de 3 (três) meses.

  24. Entendemos que poderia haver lugar à suspensão da pena acessória ou sua substituição por caução de boa conduta.

  25. Considera-se injusta e desproporcional a imposição ao arguido da proibição de conduzir veículos a motor por um período de 5 meses.

  26. Uma medida acessória dentro do mínimo legal servirá para que o arguido procure interiorizar a necessidade de conformação da conduta posterior servindo como efeito dissuasor da conduta assumida, capacitando o arguido da necessidade de refrear qualquer impulso de ingestão de bebidas alcoólicas sempre que tenha que conduzir.

  27. Ora, em face da factualidade provada sempre temos de concluir que o arguido praticou o crime não na sua forma dolosa mas quanto muito de forma negligente.

  28. Pugnamos pela inconstitucionalidade material do nº 3 do art. 139º do Código da Estrada por violação do disposto no preceito constitucional, Art. 58º nº1.

    Sem conceder, 34. A sentença recorrida violou o disposto nos art.s 40º, 69º, n.º1, 71, n.º 2 do C. Penal.

  29. Entendemos que assim a sentença deve ser revogada na parte referente à medida de inibição de conduzir substituindo-se por outra que reduza essa medida para três meses (minimo legal), sendo suspensa na sua execução pelo período de 2 anos mediante prestação de boa conduta.

  30. Caso também esta suspensão não seja possível de aplicar, que, a medida de inibição de conduzir seja reduzida para os 3 meses.

    Sem prescindir do Douto Suprimento de V. Exas deve ser concedido provimento ao presente recurso, devendo em consequência ser reformulado o douto Acórdão recorrido nos termos da Motivação e Conclusões antecedentes, julgando procedente o presente recurso O recurso foi admitido.

    O Ministério Público apresentou resposta, concluindo: 1 º - Inconformado com a douta sentença que o condenou pela prática de um crime de Condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 292º, n.º 1 e art.º 69º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, veio o arguido dela interpor recurso por não concordar com a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de cinco meses.

    1. ...

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