Acórdão nº 1057/10.1TBEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | RAQUEL REGO |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2014 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO Tribunal DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO.
Z…, residente na Avª Arantes de Oliveira, casa 6, Esposende, intentou a presente acção ordinária contra M…, M… e M…, todas com residência em Avª. De Goios, 45, Marinhas, Esposende, na qualidade de herdeiras da “herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de H…”.
Invoca, em suma, que a sua mãe, falecida em 5 de Agosto de 2010, só lhe revelou mesmo antes do seu falecimento que ela nasceu das relações sexuais ocorridas entre a sua mãe e o aludido H… e peticiona que seja reconhecido e declarado que é filha deste.
As RR. contestaram invocando a caducidade do direito de propor a presente acção e, no mais, impugnando os fundamentos da presente acção, concluindo a final pela sua improcedência.
Prosseguiu então a acção os termos normais, proferindo-se sentença que julgou procedente a excepção peremptória da caducidade, absolvendo as rés do pedido.
*Discordando desta decisão, dela interpôs recurso de apelação a autora, vindo a ser proferido acórdão que anulou o julgamento com vista a sanar contradição da matéria de facto.
Proferida nova decisão, foi outra vez julgada procedente a excepção peremptória da caducidade, absolvendo as rés do pedido.
A autora interpôs nova apelação, tendo apresentado tão extensas conclusões, que nos dispensamos de reproduzir.
Termina pedindo que se revogue a decisão que julgou procedente a excepção peremptória de caducidade, substituindo-se por outra que condene no peticionado.
* As rés apresentaram contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.
Ao mesmo tempo, ao abrigo do artº 636º, nº2, do Código de Processo Civil, requerem que a matéria do quesito 3º seja respondido provado e a dos quesitos 4º e 5º se responda não provado.
* Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO.
Na sentença recorrida fez-se constar ter-se considerados provados os seguintes factos:
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A A. nasceu no dia 23 de Maio de 1954.
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Do assento de nascimento consta como sua mãe F… .
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A mãe da A. casou no dia 17 de Março de 1984 com M… .
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A mãe da A. faleceu no dia 5 de Agosto de 2010.
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H… faleceu no dia 28 de Outubro de 2004.
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A mãe da A. travou conhecimento com o referido H… em finais do ano de 1952, princípios de 1953.
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Nos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o nascimento da A., a sua mãe manteve relações sexuais de cópula completa com o falecido H… .
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Tendo sido em consequência de tais relações sexuais que a A. foi gerada e sua mãe deu à luz em 23 de Maio de 1954.
*O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
* São três as questões submetidas à apreciação deste tribunal de recurso:
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A inconstitucionalidade material do artº 1817º, nº1, do Código Civil.
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Sobre quem recai o ónus da prova da excepção da caducidade da acção.
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Alteração da resposta à matéria dos quesitos 1º, 2º, 3º, 4º e 5º. *Quanto à primeira: É inquestionável que tem sido objecto de controvérsia saber se a acção de investigação de paternidade deve, ou não, ser limitada no tempo.
Anteriormente à Lei 14/2009, por acórdão nº23/2006, de 10/01, publicado a 08.02.2006, o Tribunal Constitucional declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do artº 1817º do Código Civil, na medida em que previa, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante, com fundamento em violação das disposições conjugadas dos artºs 26º nº1, 36º nº1 e 18º nº2 da Constituição da República Portuguesa.
Nessa sequência e pela citada lei, o legislador ordinário veio conferir nova redacção ao preceito, passando a consagrar, que, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1817º, nº1 e 1873º do Código Civil, a acção de investigação de paternidade possa ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos dez anos posteriores à sua maioridade ou emancipação, ao mesmo tempo que prevê, nos nº 2 e 3 do primeira norma, um leque de situações em que a investigação possa ir para além do prazo geral de dez anos.
Ainda assim, inúmera jurisprudência continuou a entender que o prazo de dez anos também é inconstitucional, por limitar a possibilidade de investigação a todo o tempo, constituindo uma restrição não justificada, desproporcionada e não admissível do direito do filho de saber de quem descende.
São disso exemplo os acórdãos do STJ datados de 08.06.2010, de 21.09.2010 e de 27.01.2011, disponíveis in www.dgsi.pt.
De novo instado a pronunciar-se, agora já no domínio do novo prazo, o mesmo Tribunal Constitucional decidiu que a norma não padece já da falada inconstitucionalidade, alicerçando-se no entendimento de que “não deixa de relevar que alguém a quem é imputada uma possível paternidade – vínculo de efeitos não só pessoais, como também patrimoniais – tem interesse em não ficar ilimitadamente sujeito à “ameaça”, que sobre ele pesa, de instauração da acção de investigação.
Note-se que este...
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