Acórdão nº 333/12.3TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução03 de Julho de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO J… instaurou a presente acção, com processo ordinário, contra Companhia de Seguros…, S.A.

, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 200.000,00, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação.

Fundamenta este pedido, em síntese, na ocorrência de um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo pesado com a matrícula QD-43-21 (conhecido por camião do lixo grosso), propriedade do Município de…, na altura conduzido pelo funcionário J… e o autor, que foi atropelado por aquele identificado veículo, a cujo condutor atribui a culpa na eclosão do acidente, em consequência do qual lhe sobrevieram os danos que indica resumidamente no artigo 60º da petição inicial e de que se quer ver ressarcido, sendo responsável pelo pagamento a ré para quem o proprietário do identificado veículo havia transferido a responsabilidade civil emergente da sua circulação.

A ré contestou, contrapondo ter havido culpa do condutor do veículo e do autor na produção do acidente, tendo ambos os comportamentos contribuído de igual modo para a sua eclosão, impugnando a restante matéria alegada pelo autor, considerando ainda excessivos e desajustados os valores peticionados.

Houve réplica, concluindo o autor como na petição inicial, mais pedindo a condenação da ré como litigante de má fé.

A ré respondeu, concluindo pela improcedência do pedido de condenação da mesma como litigante de má fé.

Realizada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar, com subsequente enunciação da matéria de facto assente e organização da base instrutória, sem reclamação das partes.

Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, após o que foi proferida sentença[1] com o seguinte dispositivo: «Termos em que se decide julgar a acção parcialmente procedente e, consequentemente: a) condenar a ré Companhia de Seguros…, S.A. a pagar ao autor J…: a. a quantia de € 20,000 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos com o acidente de viação dos autos; b. a quantia de € 14.305,00, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos com o acidente de viação dos autos; c. juros de mora sobre as quantias acima referidas, à taxa de 4%, desde a citação e até integral pagamento; b) absolver a Ré de tudo o mais que foi peticionado pelo Autor.

» Inconformada, a ré apelou do assim decidido, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: «A - O objeto da presente apelação circunscreve-se ao quantum indemnizatório devido ao A. lesado e que, no entendimento da Recorrente, foi calculado pelo Tribunal a quo de forma excessiva para as circunstâncias apuradas do caso concreto.

B - Em face das circunstâncias do caso concreto, designadamente pela repercussão na capacidade de ganho do lesado e de obtenção de rendimento, o Tribunal a quo conclui que o dano biológico apurado deverá ser ressarcido enquanto dano patrimonial.

C - Por esta via, o cálculo do montante indemnizatório devido relativo aos danos patrimoniais sempre deverá considerar, entre outros factores, a idade provável de reforma do lesado, ou seja, um período de cerca de 30 anos desde a idade do lesado à data de consolidação médico legal das lesões e a idade provável da reforma.

D - Por outro lado, o rendimento mensal do lesado apurado nos autos, resultante da sua actividade para o Município de… (ao abrigo de uma medida governamental criada através o Instituto do Emprego e Formação Profissional denominada Emprego-Inserção, regulada pela Portaria n.º 128/2009, de 30 de Janeiro), era auferido 12 vezes por ano e não 14 vezes por anos como, erradamente, se considerou na douta sentença recorrida.

E - Como elemento essencial e que foi desconsiderado pelo Tribunal a quo, há ainda o défice funcional permanente de 6 pontos apurado.

F - Considerando todos estes elementos e tomando como guia os sistemas de orientação maioritariamente seguidos na jurisprudência dominante e que balizam os montantes indemnizatórios dos danos corporais decorrentes de acidentes de viação, a indemnização devida ao lesado pelos danos patrimoniais sofridos nunca deverá ultrapassar os €12.000,00.

G - Por outro lado, não se conforma ainda Recorrente com a indemnização a título de danos não patrimoniais arbitrada nestes autos, uma vez que a mesma é por demais exagerada quando integrada na prova produzida e danos apurados.

H - Considerando os factos apurados e a jurisprudência maioritária, a compensação a atribuir ao lesado pelos danos não patrimoniais decorrentes do acidente em causa dos autos não deverá alcançar um valor superior a € 10.000,00, quantia esta que se mostra adequada e proporcional.

I - Ao decidir nos termos constantes da sentença em crise, o Tribunal a quo violou, pelo menos, o disposto nos artigos 494.º, 496.º, 564.º e 566.º, todos do Código Civil.» Termina pedindo que seja proferido acórdão que revogue a sentença em crise e reduza os montantes atribuídos a título indemnizatório em conformidade com o alegado.

A ré contra-alegou em defesa do julgado, tendo formulado as seguintes conclusões: «1ª - Ao abrigo do disposto no art. 566 nº 3 C. Civil, a quantia de 20.000,00€, fixada na douta sentença sob recurso, é assertiva, criteriosa, ponderada e justa.

  1. - O recurso a juízos de equidade, tendo em consideração, designadamente, a esperança de vida, o grau de incapacidade, o tipo de ocupação e o salário auferido, até aconselhariam a que no caso sub judice, se situasse a indemnização um pouco acima do montante de 14.305,00€, fixado na douta sentença sob recurso.» Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - ÂMBITO DO RECURSO O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), consubstancia-se em saber se devem ser reduzidos os montantes indemnizatórios fixados na sentença a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.

III – FUNDAMENTAÇÃO

  1. OS FACTOS A 1ª instância, como resulta da sentença recorrida, fixou os seguintes factos provados e não provados: Factos provados 1 - No dia 11 de novembro de 2009, pelas 14h15m, na Rua 1.º de Maio, em Prazins Santa Eufémia, Guimarães, ocorreu um acidente de viação, no qual intervieram: - o veículo pesado, com a matrícula QD-43-21 (vulgarmente conhecido por camião do lixo grosso), propriedade do Município de…, na oportunidade conduzido pelo funcionário J…; - o autor, como vítima de atropelamento [al. A) dos factos assentes].

    2 - Na circunstância, o Autor descia da cabine do identificado veículo para proceder à recolha do lixo para o interior do camião [al. B) dos factos assentes].

    3 - O Autor foi colhido pela roda da frente do lado direito do QD [al. C) dos factos assentes].

    4 - Na sequência do acidente, o autor efetuou fisioterapia no Hospital de Guimarães durante dois meses [al. D) dos factos assentes).

    5 - Foi observado pelos serviços clínicos da Ré no dia 15 de abril de 2010 [al. E) dos factos assentes].

    6 - Fez novamente fisioterapia/reeducação nos dias 7, 9, 10, 13 a 17 e 20 a 23 de dezembro de 2010 [al. F) dos factos assentes].

    7 - Foi internado no Hospital de Santa Maria do Porto, no dias 25 e 26 de dezembro de 2010, para efetuar cirurgia artroscópica do joelho [al. G) dos factos assentes].

    8 - De seguida, fez fisioterapia/reeducação nos dias 27 a 30 de dezembro de 2010 e nos dias 3 a 6 de janeiro de 2011 [al. H) dos factos assentes].

    9 - Em 06-01-2011, 422 dias depois do acidente, a Ré fixou a consolidação médico-legal das lesões do Autor [al. I) dos factos assentes].

    10 - Em meados do ano de 2009, o Autor estava desempregado e solicitou junto do centro de emprego a realização de um contrato emprego-inserção com a Câmara Municipal de…, para as funções de cantoneiro de limpeza [al. J) dos factos assentes].

    11 - Tal contrato emprego-inserção veio a ser assinado pelas partes em 10-08-2009, estando previsto o seu termo para 09-08-2010 (al. K) dos factos assentes].

    12 - Ao abrigo daquele contrato emprego-inserção o Autor tinha o seu horário normal de trabalho das 06h00 às 12h00, de segunda a sexta-feira [al. L) dos factos assentes].

    13 - Recebia, mensalmente, do Centro de Emprego, a quantia de € 403,80, a que acrescia um complemento de montante de 20% daquela prestação (€ 78,07), pago pelo Município de… [al. M) dos factos assentes].

    14 - Porque ainda se encontrava a recuperar do acidente, o Autor não pôde executar o dito contrato [al. N) dos factos assentes].

    15 - O Autor esteve internado no Hospital de Guimarães até 24-12-2009, tendo sido diagnosticado: - fratura da bacia - ramo isquiopúbico direito; - entorse do joelho esquerdo com lesão do menisco e ligamentos; e - fratura do tornozelo direito bimaleolar [al. O) dos factos...

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