Acórdão nº 2180/13.6TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução26 de Junho de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES – A) RELATÓRIO I.- S…, com os sinais de identificação nos autos, moveu acção de condenação, com processo comum sumária, contra “E…, Ldª.”, com sede em Braga, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 15.000,00 acrescida de juros de mora legais desde a data da citação.

Fundamenta alegando que aquela importância é um crédito que a sua ex-entidade patronal – “M…, Ldª.” – tinha sobre a Ré e lhe cedeu para liquidação de créditos laborais, tendo trabalhado para ela até ao início de Abril de 2011.

Contestou a Ré negando a existência do crédito, recusando ter comprado à “M…, Ldª.” qualquer stand de vendas. Afirmou ainda nunca ter sido notificada da cessão de crédito invocada.

Respondeu o Autor reafirmando que a Ré reconheceu a validade e eficácia do contrato de cessão de créditos, e propôs mesmo pagar um preço inferior ao acordado, o que não foi por si aceite.

Os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a Ré do pedido.

Inconformado, traz o Autor o presente recurso pretendendo seja revogada aquela decisão, condenando-se a Ré nos termos que peticionara.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi recebido como de apelação, com efeito meramente devolutivo.

Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre apreciar e decidir.

* II.- O Autor/Apelante funda o seu recurso nas seguintes conclusões: 1 - Atenta a prova produzida em audiência de julgamento e contrato de cessão, junto com a p.i., ter-se-á que entender que, efectivamente, foi celebrado aquele contrato de cessão de crédito, pela M… e pelo recorrente, para pagamento, por conta, de remunerações devidas ao trabalhador, tal como ocorrera com outros trabalhadores, que receberam, também, parte em espécie; 2 – Na verdade, não obstante a testemunha, F… ter referido no seu depoimento que o negócio foi realizado pelo A., em nome próprio, não lhe era exigível saber se o fazia nessa condição ou em nome da cedente, tanto mais que, como consta desse e doutros depoimentos, desempenhava funções de director comercial da empresa e, por isso, sempre que actuava, em qualquer venda, fazia-o em nome da empresa e não em seu nome, como é lapidar… 3 - Aliás, essa testemunha referiu que não vendia em nome da empresa, dado que esta não vendia stands, o que demonstra, claramente, que o depoimento prestado teve esta convicção, o que deveria ter sido interpretado pelo tribunal, com esse sentido, pois tal facilmente se intui… 4 - Ora, sendo que a celebração desse contrato respeitava a um acto de gestão, não era, nem é exigível, que qualquer funcionário da cedente tivesse conhecimento da celebração do contrato, pois tal acto respeitava, tão só ao cessionário, ora recorrente, e ao gerente da cedente, com poderes para obrigar a sociedade, no caso, J….

5 – A recorrida usufrui desse stand, de valor manifestamente superior ao acordado, como ressalta dos depoimentos das três testemunhas, nisso unanimes, não pagou um único cêntimo e, segundo a decisão recorrida, nada deve ou tem a pagar, não obstante a mesma se ter defendido que com a alegação falsa de que se tratava de sucata e de produto sem qualquer valor económico, já abandonado nuns lotes que lhe foram prometidos vender… 6 - Como é manifesto, o A. nenhum interesse tinha em invocar aquele contrato, caso o mesmo não tivesse sido celebrado e devidamente assinado e cujas assinaturas não foram impugnadas.

7 - Por isso, a M… cedeu tal crédito/stand ao A., por conta dos seus créditos laborais, tal como o fez relativamente a outros seus trabalhadores.

8 - Deste modo, violou a douta decisão, além do mais, do disposto no artigo 577 do CC.

* Como resulta do disposto nos artos. 608º., nº. 2, ex vi do artº. 663º., nº. 2; 635º., nº. 4; 639º., nos. 1 a 3; 641º., nº. 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.

De acordo com as conclusões acima transcritas cumpre: - reapreciar a decisão sobre a matéria de facto; - considerar se estão verificados os pressupostos de que depende a validade e eficácia da cessão de crédito.

* B) FUNDAMENTAÇÃO III. – O Apelante impugna a decisão da matéria de facto.

O artº. 662º. do actual C.P.C. regula a reapreciação da decisão da matéria de facto de uma forma mais ampla que o artº. 712º. do anterior Código, configurando-a praticamente como um novo julgamento.

Assim, a alteração da decisão sobre a matéria de facto é agora um poder vinculado verificado que seja o circunstancialismo referido no nº. 1: quando os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

A intenção do legislador foi, como fez constar da “Exposição de Motivos”, a de reforçar os poderes da Relação no que toca à reapreciação da matéria de facto.

Assim, mantendo-se os poderes cassatórios que permitem à Relação anular a decisão recorrida, nos termos referidos na alínea c), do nº. 2, e sem prejuízo de se ordenar a devolução dos autos ao tribunal da 1ª. Instância, reconheceu à Relação o poder/dever de investigação oficiosa, devendo realizar as diligências de renovação da prova e de produção de novos meios de prova, com vista ao apuramento da verdade material dos factos, pressuposto que é de uma decisão justa.

As regras de julgamento a que deve obedecer a Relação são as mesmas que sujeitam o tribunal da 1ª. Instância: tomar-se-ão em consideração os factos admitidos por acordo, os que estiverem provados por documentos (que tenham a força probatória plena) ou por confissão, desde que tenha sido reduzida a escrito, extraindo-se dos factos que forem apurados as presunções legais e as presunções judiciais, advindas das regras da experiência, sendo que o princípio basilar continua a ser o da livre apreciação das provas, relativamente aos documentos sem valor probatório pleno, aos relatórios periciais, aos depoimentos testemunhais, e agora inequivocamente, às declarações da parte – cfr. artos. 466º., nº. 3 e 607º., nos. 4 e 5 do C.P.C., que não contrariam o que acerca dos meios de prova se dispõe nos artos. 341º. a 396º. do Código Civil (C.C.).

Deste modo, é agora inequívoco que a Relação aprecia livremente todas as provas carreadas para os autos e valora-as e pondera-as, recorrendo às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus próprios conhecimentos...

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