Acórdão nº 875/12.0GBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | ANA TEIXEIRA E SILVA |
Data da Resolução | 30 de Junho de 2014 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os juízes, em conferência, na Secção Criminal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO JOÃO G... veio interpor recurso da sentença que pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos artºs 2º, nº1, al. m), 3º, nº2, al. f), e 86º, nº1, al. d), da Lei 5/2006, de 23.02, o condenou na pena de 130 dias de multa, à taxa diária de €6,50, no total de €845,00.
O arguido expressa as seguintes “conclusões” Perante a sua extensão, dificilmente se podem considerar um “resumo das razões do pedido” – artº 412º, nº1, do CPP.
: A – Vem o presente recurso interposto da douta decisão que Condenou o arguido JOÃO G... pela prática, em autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86º, n.º 1, al. d) com referência ao disposto nos art.ºs 2º, n.º1, al. m) e 3º, n.º 2, al. f), todos da Lei n.º 5/2006, de 23/02, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa, à taxa diária de 6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos), perfazendo a multa global de 845,00€ (seiscentos e cinquenta euros) e a que corresponderão, se for caso disso, 86 (oitenta e seis) dias de prisão subsidiária; B - O tribunal à quo considerou provados a factualidade descrita em a) a f) da factualidade assente, que aqui se dá por integralmente reproduzida para os devidos e legais efeitos; C – O tribunal à quo considerou inexistir factualidade não provada, com relevo para a decisão a proferir; E – Dos depoimentos que existem nos autos, a Mma. Juíz à quo atendeu, para a formação da convicção e consequente condenação do arguido, às declarações da testemunha Jorge V..., da testemunha Manuel F... e da testemunha Maria F... Cortez, cujos depoimentos se dão por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos; F – Não valorando, a Mma. Juíza a quo, as declarações do arguido quanto à alusão de os factos terem ocorrido no interior dos limites do seu prédio e ter justificado a detenção da faca; G – Existem duas versões contraditórias: a versão apresentada pela testemunha Manuel, até então arguido nos autos, tendo havido desistência de queixa quanto ao crime de ofensa à integridade física simples e a versão apresentada pelo arguido; H – A Mma. Juíza não formulou nenhum juízo de credibilidade sobre declarações do arguido, que relatou o desentendimento ocorrido entre ele e familiares do Sr. Manuel F... e que, perante uma invasão por parte do Sr. Manuel e restantes envolvidos, não hesitou em socorrer-se de uma faca de cozinha existente perto do local onde se encontrava, faca esta utilizada para a matança de animais de pequeno porte pela sua esposa, para se defender; I - O arguido nunca omitiu que havia pegado na faca e admitiu que a deixou cair em virtude de uma pancada que havia levado na cabeça; J - Assim sendo, ao ponderar o seu depoimento, era imperioso existir um especial cuidado na sua valoração por banda da Mma. Juíza a quo, que entendemos não ter existido; L – De igual modo não podemos, de todo descurar o facto de que o depoimento da testemunha Manuel F... não foi feito com isenção e sem interesse no resultado do processo, já que a este só interessaria a condenação do aqui recorrente; M – Pois, como se pode aferir da prova produzida em audiência de julgamento existem más relações de vizinhança entre o arguido, Sr. Manuel e sua família por diferendos de longa data; N - No que refere à subsunção da conduta que aqui se imputa ao arguido em sede de factualidade tida como provada e contrariamente ao que foi decidido na douta sentença sob recurso, entende o arguido que não se encontraram preenchidos os elementos constitutivos do crime de detenção de arma proibida, assente na posse de uma arma branca, p. e p. pelo art.º 86º, n.º1, d), da Lei n.º5/2006, de 23 de Fevereiro, pelo qual foi condenado; O – Nos termos do art. 2º n.º 1 m), da Lei n.º 5/2006, de 23/2, entende-se por “arma branca” todo o objeto ou instrumento portátil dotado de uma lâmina ou outra superfície cortante, perfurante, ou corto-contundente, de comprimento igual ou superior a 10 cm e, independentemente das suas dimensões, as facas borboleta, as facas de abertura automática ou de ponta e mola, as facas de arremesso, os estiletes com lâmina ou haste e todos os objetos destinados a lançar lâminas, flechas ou virotões; P – E, de acordo com o estatuído no art.º 86º n.º 1 d), da referida Lei, estando em causa arma branca, apenas incorre no crime de detenção de arma proibida quem detiver, sem autorização ou fora das condições legais, “arma branca dissimulada sob a forma de outro objeto, faca de abertura automática, estilete, faca de borboleta, faca de arremesso, estrela de lançar, boxers, outras armas brancas ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser usados como instrumentos de agressão e o seu portador não justifique a sua posse”; Q – Nesta conformidade, facilmente se compreende que a imputação do crime depende da caracterização da arma branca em causa. E, não cabendo nas categorias expressamente elencadas mas tão-só “nas outras armas brancas”, a punição depende da alegação e prova cumulativa dos seguintes requisitos: a) Não tenha aplicação definida; b) Possa ser usada como arma de agressão; c) O seu portador não justifique a posse; R – Ora, as armas brancas só são passíveis de integrar a previsão supra referida se se revelar que não tem aplicação definida (art.º 86º n.º 1 d)), o que não é o caso, uma vez que estamos perante um faca de cozinha, por natureza afeta às lides domésticas; S – Se assim não se entender (e segundo o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa, no processo n.º 121/11.4SHLSB.L1-5, de 06/11/2012), não se poderá tão pouco questionar o não preenchimento deste requisito, uma vez que o arguido se encontrava na sua propriedade, no local onde se encontrava a faca em questão; T – A acusação omitiu a referência explícita à posse justificada pelo arguido; U – A Mma Juíza a quo não deu como provado o preenchimento do terceiro requisito, a falta de justificação da posse, inexistindo factualidade provada nesse sentido e não se pronunciou sobre esta questão, essencial para o preenchimento do tipo objetivo do ilícito. Não foram consideradas as suas declarações do arguido sobre esta questão; V – Questiona assim o arguido a validade formal da sentença, pois considera que na sua elaboração foram preteridas formalidades legais, impostas pelo art.º 86º n.º1 d), omissão que a pode tornar nula, nos termos do art. 379º, n.º 1, c); X – Concluiu-se que da acusação do tribunal a quo não consta e não são alegados nenhuns dos factos relativos aos elementos do tipo objetivo do crime de detenção de arma proibida e não descreve nenhuma conduta tipificadora do crime imputado ao arguido; Z – Nesta perspetiva, evidencia-se, pois, uma falha na matéria fáctica apurada que podia e devia ter sido colmatada visto que é essencial à definição e inserção da arma possuída em determinada categoria legal e, consequentemente, à imputação do crime. (Vide, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo n.º 1752/11.8TAVFR.P1, de 04.07.2012, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo n.º 581/10.0GDSTS.P1, de 27.06.2012 e Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Processo n.º 1229/08.9GBAGD.C1, de 30.06.2010); AA – A detenção de uma faca de cozinha pelo arguido não integra o crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, n.º 1 al. d) da Lei 5/2006, de 23/02, independentemente do cumprimento da lâmina ou da superfície cortante...
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