Acórdão nº 507/13.0TBCBT-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DA PURIFICA
Data da Resolução27 de Outubro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães RELATÓRIO S…, declarada insolvente, apresentou recurso da decisão que, admitindo liminarmente o seu pedido de exoneração do passivo restante fixou o limite intangível de rendimento em 500 euros.

Juntou alegações, onde formula as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1. O despacho de que ora se recorre determinou que se considera cedido ao administrador da insolvência o rendimento disponível da insolvente, calculado nos termos constantes do artigo 239º, nº 3 do CIRE, auferido durante os cinco anos seguintes ao encerramento do processo de insolvência e que exceda a quantia de 500,00€.

  1. A Recorrente não se conforma com a quantia fixada como sendo a necessária ao seu sustento e da sua filha, porquanto considera que a mesma viola o disposto no artigo 239º, nº3, alínea b) do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas e nos artigos 1°, 59°, n° 2 al. a) e 63°, n°s 1 e 3 da Constituição da República Portuguesa.

  2. Com o deferimento do pedido de exoneração do passivo restante, o juiz decide o rendimento disponível para o insolvente conduzir a sua vida com dignidade, cedendo tudo o demais que auferir à satisfação dos credores.

  3. A exclusão da cessão de rendimento das quantias previstas na alínea b) i) funda - se na “dignidade humana, assente na noção de que o montante que é indispensável a uma existência condigna, terá de ser avaliado em face das particularidades da situação concreta do devedor em causa, sendo que ao sacrifício financeiro dos credores terá de corresponder o sacrifício do insolvente através da compressão das suas despesas” (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 25/10/2012).

  4. O princípio da dignidade humana é basilar do Estado de Direito Democrático, tendo sido acolhido nas disposições conjugadas dos artigos 1°, 59°, n° 2 al. a) e 63°, n°s 1 e 3 da Constituição da República Portuguesa.

  5. No seu respeito e com vista a um fresh start ao fim de cinco anos, o insolvente vê - se obrigado a comprimir ao máximo as suas despesas, reduzindo-as ao estritamente necessário, sem, no entanto, afectar a sua sobrevivência e dignidade e a do seu agregado familiar.

  6. A decisão recorrida considerou que a quantia de 500,00€ (quinhentos euros) é suficiente para assegurar o digno sustento do agregado familiar da insolvente, constituído por esta e pela sua filha, com um ano e meio de idade e a qual se encontra a cargo da insolvente.

  7. Porém, e, salvo o devido respeito, a quantia de 500,00€, no contexto actual, é plenamente insuficiente para permitir o sustento minimamente digno da insolvente e da sua filha menor, cujas despesas - tal como consta do relatório do douto despacho de que ora se recorre – são assumidas pela insolvente.

  8. Assim, é a Recorrente que tem que suportar todas despesas relacionadas com a sua filha, nomeadamente, a alimentação, as consultas de pediatria, a medicação, as fraldas, o vestuário e ainda a creche, esta última no valor de 50,00€ mensais, tal como consta do documento oportunamente junto a fls..

  9. Acresce que, tal como a insolvente alegou na sua petição inicial e demonstrou através dos documentos juntos com o seu requerimento de fls., aquela tem ainda a seu cargo todas as despesas inerentes à habitação, nomeadamente, as despesas com água, luz, gás, numa média mensal de €150,00, mas também com a renda, a qual se fixa nos 125,00€ mensais.

  10. Porém, a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, no despacho de que ora se recorre, entendeu não existirem despesas com a habitação, podendo ler-se no douto despacho que: “tudo ponderado, em especial, a inexistência de despesas com habitação, julgo adequado fixar o limite inatingível de rendimento em 500,00€, actualizável anualmente de acordo com o índice da inflação” (sublinhado nosso).

  11. Todavia, a insolvente alegou e provou as diversas despesas que tem com a habitação, as quais supra mencionou.

  12. E, no que concerne à despesa com a renda da casa, a mesma consta da fundamentação de facto da douta sentença de declaração de insolvência, bem como do douto despacho de que ora se recorre, mais concretamente, do ponto 19 dos factos dados como provados.

  13. Daí que “a inexistência de despesas com a habitação” não tenha qualquer suporte fáctico, antes descurando os factos dados como assentes nos presentes autos e ainda toda a prova feita nos mesmos.

  14. Acresce que, as despesas com a habitação assumem um peso fulcral no orçamento da Recorrente, pelo que, a mesma teve, desde logo, uma grande preocupação em alega-las aquando da sua apresentação à insolvência.

  15. Ao excluir tais despesas em sede do despacho de que ora se recorre, quando no mesmo despacho se considerou, desde logo, expressamente provada a despesa com a renda da casa, o Tribunal a quo incorreu, salvo o devido respeito, numa intolerável contradição, a qual seriamente compromete as legítimas expectativas da Recorrente.

  16. Para fazer face a todas as despesas, o agregado familiar da Recorrente conta apenas com o salário da Recorrente, o qual se fixa em 485,00€. da Recorrente à insolvência, com o abono da filha, no valor de 116,00€, tal como a mesma teve oportunidade de alegar na sua petição inicial.

  17. Sucede que, actualmente, o abono foi reduzido para a quantia de 29,00€, o que muito dificulta o quotidiano da Recorrente e da sua filha.

  18. Na verdade, estas quantias são manifestamente insuficientes para assegurar a dignidade da Requerente e da filha.

  19. A integralidade do auferido pela Recorrente é gasta na sobrevivência do agregado familiar.

  20. Porém, o Tribunal a quo fixou, como rendimento disponível da Recorrente, o montante de 500,00€, ou seja, um montante substancialmente mais escasso do que aquele com que, desesperadamente, a Recorrente fazia face ao seu quotidiano, o que, num Estado de Direito Democrático como é aquele em que vivemos, se afigura inaceitável.

  21. Acresce que, o tecto...

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