Acórdão nº 706/12.1GCBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução06 de Janeiro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães, I – RELATÓRIO 1. Nestes autos de processo comum n.º 706/12.1GCBRG.G1 do 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Braga e após a realização da audiência de julgamento, o Exmº juiz proferiu a sentença que concluiu com o seguinte dispositivo (transcrição): “Pelo exposto decide-se: 1- Parte Criminal 1- Condenar o arguido João G...

pela prática de um crime de ameaça agravado p. e p. pelos arts 153º nº1 e 155º nº1 a) do CP na pena de 90 (noventa) dias de multa à taxa diária de €6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos).

2- Condenar o arguido João G...

pela prática de um crime de injúria p. e p. pelo art° 181º nº 1 CP na pena de 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de € 6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos).

3- Em cúmulo jurídico das penas referidas em 1 e 2, condenar o arguido João G...

na pena única de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de € 6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos), num total de € 780,00 (setecentos e oitenta euros).

4- Nos termos do artº 109º/1 CP, declaram-se perdidos a favor do Estado as espingardas de caça e os cartuchos apreendidos à ordem dos presentes autos, os quais deverão ficar depositadas à guarda da PSP, que promoverá o seu destino (cfr. artº 78º da Lei nº 5/2006, de 23/02) (…)”.

  1. Parte Cível a) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Artur P... a fls 82 e ss parcialmente procedente e, em consequência, condenar o demandado João G... a pagar ao demandante a quantia de €400,00 (quatrocentos euros).

    1. Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Artur P... a fls 93 e ss parcialmente procedente e, em consequência, condenar o demandado João G... a pagar ao demandante a quantia de €600,00 (seiscentos euros), acrescida de juros de mora à taxa de 4%, contados desde a data da presente sentença até integral pagamento” (…) 2.

    Inconformado, o arguido João G... interpôs recurso, concluindo que a sentença deve ser revogada e, em consequência, absolver-se o arguido dos crimes de que vem acusado bem como do pedido de indemnização contra ele formulado e revogando-se ainda a declaração de perdimento das armas e cartuchos a favor do Estado.

    O Ministério Público, representado pela magistrada no Tribunal Judicial de Braga, apresentou resposta concluindo que o recurso não merece provimento.

    O assistente, Artur P..., formulou igualmente resposta concluindo que a sentença recorrida deve ser confirmada.

  2. Neste Tribunal da Relação de Guimarães, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, concluindo que o recurso não merece provimento. Não houve resposta ao parecer.

    Recolhidos os vistos do juiz presidente da secção e do juiz adjunto e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 4. Questão prévia Da admissibilidade do recurso em matéria cível Vem o arguido-demandado recorrer, além do mais, da condenação no pagamento ao demandante Artur P... a quantia de €400,00 (quatrocentos euros) e quantia de €600,00 (seiscentos euros), acrescidas de juros de mora à taxa de 4%, contados desde a data da presente sentença até integral pagamento.

    Prescreve o artigo 400.º n.º 2 do Código de Processo Penal que o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada e estabelece o artigo 24.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro) que em matéria cível a alçada dos tribunais de 1ª instância é de € 5000 (cinco mil euros).

    A quantia peticionada inicialmente já se continha claramente na alçada do tribunal recorrido e o valor que veio a ser fixado na sentença é manifestamente inferior a metade da alçada do tribunal de primeira instância, pelo que a decisão neste âmbito é irrecorrível.

    O recurso não deveria ter sido admitido nesta parte e agora não pode prosseguir.

    Sendo inquestionável que anterior decisão neste âmbito não constitui caso julgado formal, nem vincula o tribunal superior (artigo 414.º n.ºs 2 e 3 do Código de Processo Penal), impõe-se a rejeição liminar do recurso na parte que se restringe à acção civil enxertada.

  3. Questões a decidir Como tem sido entendimento unânime, o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, onde deve sintetizar as razões da discordância do decidido e resumir as razões do pedido - artigos 402º, 403.º e 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, naturalmente que sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso (cfr. Silva, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, Vol. III, 1994, p. 320; Albuquerque, Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal, 3ª ed. 2009, pag 1027 e 1122, Santos, Simas, Recursos em Processo Penal, 7.ª ed., 2008, p. 103; entre outros os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271; de 28.04.1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, p. 196).

    Podemos sintetizar as questões a apreciar nos seguintes termos, pela ordem lógica de conhecimento:

    1. Erro de julgamento na decisão da matéria de facto; b) Medida da pena - razão diária da multa; c) Perdimento a favor do Estado das armas e munições.

  4. Matéria de facto Para a fundamentação da presente decisão, torna-se imprescindível transcrever parcialmente a sentença objecto de recurso.

    O tribunal recorrido julgou provada a seguinte matéria de facto (transcrição): “1. No dia 30 de Julho de 2012, cerca das 15h45m, o arguido João G... e o seu vizinho Artur P... encontravam-se nas respectivas propriedades, as quais confrontam nas suas extremidades, sitas em Adaúfe, nesta comarca de Braga.

  5. Nesse dia, o arguido pedira à sua entidade patronal para sair mais cedo do trabalho, pois a esposa tinha-lhe telefonado, dando-lhe conta que o painel solar estava partido.

  6. Ao aperceber-se da presença de Artur P..., com quem se encontrava e encontra desavindo, o arguido, por suspeitar que fora ele quem lhe partira o referido painel solar, subiu o muro de vedação e, em tom alto e de forma exaltada, disse-lhe: “Ó filho da puta, ó cabrão, foste tu que partiste o painel, vou-te matar!” 4. Então, o assistente retorquiu: “Se me quiseres matar, mata-me.” 5. Tendo Artur P... permanecido no local onde se encontrava, o arguido João G... dirigiu-se ao interior da sua habitação e, instantes depois, regressou, munido com uma espingarda de caça, calibre 12 mm, cano de alma lisa com 71 cm de comprimento de que é proprietário.

  7. Segurando a arma com as mãos, o arguido apontou-a a Artur P..., que se encontrava a curta distância, dizendo, em tom sério: “ Tenho aqui vitaminas para te matar! Estás a ver? Esta é para ti!” 7. Perante a natureza das palavras proferidas e as potencialidades letais que atribuiu à arma que lhe foi apontada, Artur P...sentiu algum temor que, em data posterior, o arguido viesse a atingir a sua integridade física e vida, concretizando o mal anunciado, o que lhe causou alguma intranquilidade e desassossego, totalmente dissipados quando soube que as espingardas de caça de que o mesmo era portador foram apreendidas pela GNR.

  8. Em consequência dos insultos de que foi vítima, o assistente Artur P... sentiu-se envergonhado e humilhado, tanto mais que os insultos ocorreram na presença do seu filho menor, à data com 6 anos de idade, e do seu amigo José F....

  9. O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as expressões por si proferidas, acompanhadas do gesto de exibir e apontar uma arma de fogo, eram adequadas a provocar medo ou inquietação e a prejudicar a liberdade de determinação de Artur P... e quis fazê-lo.

  10. Pretendeu ainda atingir o bom nome, consideração, a honra e o carácter do assistente.

  11. Sabia que as suas condutas eram proibidas por lei.

    Mais se provou: 12. O arguido João G... não tem antecedentes criminais 13. É operador de máquinas, auferindo mensalmente cerca de €720,00.

  12. É casado.

  13. A esposa é doméstica, não auferindo qualquer rendimento.

  14. Tem dois filhos (de 20 e 14 anos de idade), a cargo.

  15. Vive em casa própria.

  16. O assistente Artur P... é cortador de carnes por conta própria, auferindo mensalmente cerca de €1 000,00.

  17. É casado.

  18. A esposa ajuda-o, não auferindo qualquer...

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