Acórdão nº 2016/12.5TBBCL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Março de 2014
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 20 de Março de 2014 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório A Companhia de Seguros…, S.A. não se conformando com o despacho que inferiu a perícia médica em moldes colegiais, com a intervenção de um perito indicado pelo Tribunal ou pelo Gabinete Médico Legal e dois outros indicados pelas partes, veio interpor o presente recurso de apelação, concluindo do seguinte modo: I- A perícia colegial requerida nos presentes autos, apesar de ser médica, não é de clínica médico-legal e forense; II- Não há, no caso, qualquer interesse de ordem pública (ou até de saúde pública, como é o caso das autópsias) que imponha a intervenção exclusiva do INML na realização do exame pericial pedido pelas partes num processo em que se discutem direitos disponíveis.
III- Assim, considera a Ré que não é aplicável ao exame solicitado o disposto na Lei 45/2004.
IV- O nº 3 do artigo 21º da Lei 45/2004 prevê a inaplicabilidade do nº 1 desse mesmo preceito “aos exames em que outros normativos legais determinem disposição diferente”.
V- O artigo 468º n.º 1 alínea b) do NCPC estabelece que “A perícia é realizada por mais de um perito, até ao número de três, funcionando em moldes colegiais ou interdisciplinares:.. b) quando alguma das partes, nos requerimentos previstos no artigo 475º e no nº 1 do artigo 476.º requerer a realização de perícia colegial ”, cabendo, nesse caso, ao tribunal iniciar um perito e a cada uma das partes outro (cfr. artigo 468º n.º 2 do mesmo diploma).
VI- As normas da alínea b) do n.º 1 e do nº 2 do artigo 468º do Código de Processo Civil, constituem um dos “normativos legais” a que alude o n.º 3 do artigo 21º da Lei 45/2004 e que determinam disposição diferente ao princípio geral da intervenção nas perícias de apenas um só perito.
VII- É, precisamente, por força dessa ressalva que a perícia médica realizada no âmbito de um acidente de trabalho, prevista no artigo 138º do CPT, continua a ser realizada em moldes colegiais, com dois peritos indicados pelas partes e um outro pelo tribunal (cfr. 139º n.º 5); de facto, existe uma norma que prevê regime distinto ao da Lei 45/2004 - a do artigo 138º do CPT -, como ocorre nas perícias em direito civil por força dos artigos 468º n.º 1 alínea b) e nº 2.
VIII- Será, pois, no disposto no artigo 21º n.º 3 da Lei 45/2004, de 19 de Agosto, conjugado com as normas dos artigos 468º n.º 1 alínea b) e nº 2 do NCPC, que se encontrará fundamento para a admissão da perícia em moldes colegiais, sendo um dos peritos indicados pelo tribunal (ou GML) e os dois restantes por cada uma das partes.
IX- A realização da perícia em moldes colegiais mostra-se, no caso, imprescindível, pelas vantagens que acarreta na descoberta da verdade material.
X- A unanimidade dos três peritos (um deles indicado pelo GML) quanto a uma determinada conclusão desse relatório pericial, ressalvando, claro, as situações de erro técnico (muito menos provável de ocorrer com a intervenção de três peritos), constituiria uma absoluta certeza por parte do Tribunal de que a situação médica a examinar foi bem avaliada e não oferece qualquer dúvida, nem mesmo para a parte que eventualmente, pudesse ser menos favorecida com tal conclusão.
XI- Mesmo nas situações em que essa unanimidade não se verificasse, a intervenção de três peritos seria útil para que o Juiz, na qualidade de perito dos peritos, se pudesse aperceber das diferentes perspectivas que a mesma situação médica pode merecer, podendo formar a sua convicção de uma forma mais sustentada ou até aprofundar as matérias em que se verificasse essa divergência, de forma a apreciar a eventual justificação para a ausência de unanimidade nas respostas.
XII- A eventual discordância de um perito quanto às conclusões obtidas pelos demais, se fundada em razões sólidas, seria decisiva para que o Tribunal pudesse evitar uma decisão baseada em pressupostos inexactos.
XIII- Do mesmo passo, a presença e discussão entre os peritos, no decurso do próprio exame, dessas eventuais diferenças de perspectiva poderia ser suficiente para evitar conclusões erradas e ser conducente à pretendida unanimidade.
XIV- De um perícia singular levada a efeito no IML não pode resultar qualquer divergência, nem o Tribunal poderá aperceber-se das diferentes perspectivas para a mesma realidade, com o inerente prejuízo para a boa decisão da causa e para as partes, a quem é imposta uma determinada conclusão, muitas vezes subjectiva, do perito, sem que surja qualquer voz dissonante que alerte para o seu eventual desacerto.
XV- Sejam quais forem as regras processuais em vigor em cada momento, nunca será propósito do legislador impor ao Tribunal o julgamento dos factos com base numa perspectiva forçadamente limitada ou insuficiente da realidade relevante.
XVI- Bem pelo contrário, o objectivo último do legislador é o de garantir uma solução justa para o litígio, mediante o apuramento, o tanto mais detalhado quanto possível, dos factos em...
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