Acórdão nº 539/10.0TBCBT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório M… e mulher, M… vieram intentar acção declarativa sob a forma de processo sumário contra C… e mulher, F….

Alegaram, em síntese, que são donos dos prédios rústicos denominados Cerrado da Casa, Cerrado da Fonte e Cerrado da Bouça por compra a I… . Por sua vez, os RR. são donos do prédio misto denominado de Sorte de Mato do Ribeiro e casa destinada a habitação, arrumos e carpintaria de rés-do-chão, o qual adquiriram mediante escritura de dação em cumprimento dos AA.

Para rega e lima dos seus prédios rústicos os AA. utilizam um tanque situado no lado poente-sul do prédio dos RR., sendo que a água daquele tanque nasce em prédio de um terceiro e deste deriva para o prédio dos RR. através de uma mina, com cerca de 8 metros de comprimento que atravessa a estrada municipal e que estabelece a ligação entre os lugares de Cabreira e Castelo, pertencendo a água desse tanque todo o ano aos AA.

Para o acesso ao tanque e à água que ali acode, os AA. sempre utilizaram há mais de 20, 30 e 50 anos, para se dirigirem da via pública, a pé, para abrir e tapar o tanque, um caminho em terra batida, de trilho e leito bem definidos, visíveis e permanentes, com o comprimento de cerca de 40 metros e largura de três metros, caminho que apresenta sinais aparentes e permanentes.

Também os AA. para acesso ao sobredito tanque e à água que ali acode, sempre utilizaram, há mais de 20, 30 e 50 anos um carreiro de terra batida, de trilho e leito bem definidos, de sinais visíveis e permanentes com o comprimento de cerca de 35 metros e com a largura de cerca de 0,5 m, com início no prédio rústico denominado “Cerrado da Fonte”.

Em Agosto de 2009, os RR. obstruíram totalmente o caminho e o carreiro descritos, tendo para o efeito vedado todo o seu prédio e não deram qualquer chaves aos AA. para poderem aceder ao tanque.

E antes disso, em Abril de 2009, os RR. construíram um poço destinado a exploração de água naquele seu prédio, junto à nascente, tendo ainda, na mesma ocasião, entupido parcialmente a mina com terra. Em virtude da obra efectuada, a poça deixou de ter água, secando.

Sem a água necessária às culturas que os AA. têm nos seus prédios rústicos, estes nada produzem, causando-lhes um prejuízo anual de cerca de 2.500,00 euros.

Com o comportamento dos RR., os AA. sentiram-se muito humilhados, envergonhados, constrangidos, desgostosos e angustiados, o que agudizou as suas doenças.

Pedem, consequentemente: a) que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre os prédios identificados no artigo 1º da petição inicial; b) que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre a água descrita nos artigos 15º a 17º da petição inicial; c) que seja declarado e reconhecido o direito de servidão de aqueduto, constituído pelo tubo descrito nos artigos 24º a 26º a favor dos prédios dos autores e a onerar o prédio dos réus mencionado no artigo 13º e nas condições dos artigos 27º e 28º, todos da petição inicial; d) que seja declarado e reconhecido o direito de servidão de passagem, constituído pelo caminho supra nos artigos 33º a 36º a favor dos ditos prédios dos autores e a onerar o prédio dos réus descrito no artigo 13º e nas condições dos artigos 38º e 39º, todos da petição inicial; e) que seja declarado e reconhecido o direito de servidão de passagem constituído pelo carreiro descrito nos artigos 44º a 47º a favor dos ditos prédios dos autores e a onerar o prédio dos réus descrito no artigo 13º e nas condições dos artigos 49º e 50º, todos da petição inicial; f) que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre a água descrita nos artigos 65º a 67º da petição inicial; g) a condenação dos réus a reconhecer tais direitos; h) a condenação dos réus a retirarem do caminho e do carreiro os obstáculos que neles colocaram e que estorvam o exercício das descritas servidões, designadamente o portão e a rede, referidos nos artigos 56º a 58º da petição inicial; i) a condenação dos réus a tapar o poço que abriram no seu identificado prédio, mencionado nos artigos 74º a 77º e 13º da petição inicial, e a desobstruir e o cano; j) a condenação dos réus a pagar aos autores o valor de € 5.000,00, consoante alegado foi nos artigos 79º a 84º da petição inicial; l) a condenação dos réus a pagar aos autores uma indemnização pelos prejuízos por estes sofridos em virtude da privação da dita água, cujo cálculo se fará em liquidação para execução de sentença, consoante alegado foi no artigo 85º da petição inicial; m) a condenação dos réus a pagar aos autores a quantia de € 2.500,00 a título de indemnização pelos danos morais sofridos e alegados nos artigos 86º a 90º da petição inicial; e, n) a condenação dos réus a absterem-se da prática de quaisquer atos que estorvem o exercício das mencionadas servidões de passagem.

Os RR. contestaram invocando a ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir e impugnaram os demais factos invocados.

Os AA. responderam, defendendo que adquiriram os direitos que invocaram não apenas por usucapião, como invocaram na p.i., mas também por destinação de pai de família, mantendo o mais alegado na p.i. e pugnando pela improcedência da excepção invocada.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido julgada improcedente a excepção da ineptidão da petição inicial e procedeu-se à selecção da matéria de facto provada e a provar.

Procedeu-se a peritagem, encontrando-se junto a fls 112 a 119 e a inspecção judicial (fls 194 e fls 195).

Realizado o julgamento, respondeu-se à base instrutória sem reclamações e a final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e: a) Declarou e reconheceu que os autores são proprietários dos prédios descritos nos factos provados 1), 2) e 3); b) Declarou e reconheceu que os autores são proprietários da água referida nos factos provados 9) e 10); c) Declarou e reconheceu que existe a favor dos prédios dos autores uma servidão de aqueduto, constituída pelos rego e tubo descritos nos factos provados 19) a 22), e a onerar o prédio dos réus mencionado no facto provado 6); d) Declara e reconhece a faculdade de os autores passarem a pé pelos caminhos referidos nos factos provados 11) e 12), para cabal exercício da servidão de aqueduto referida em c), quando as circunstâncias o imponham, para vigiar, inspecionar, reparar e limpar o aqueduto, bem como para abrir e tapar o tanque; e) Declarou e reconheceu que os autores são proprietários da água referida no facto provado 28); f) Condenou os réus a reconhecerem os direitos e a faculdade previstas em a) a e); g) Condenou os réus a retirarem dos caminhos referidos nos factos provados 11) e 12) os obstáculos que neles colocaram e que impedem o exercício da faculdade de passagem referida em d), designadamente o portão e a rede referidos no facto provado 13); h) Condenou os réus a pagarem aos autores o valor que vier a ser liquidado posteriormente, correspondente à perda dos rendimentos agrícolas verificada em virtude da privação de água sofrida nos prédios dos autores referidos nos factos provados 1), 2) e 3), em consequência do descrito nos factos provados 13) e 14); i) Condenou os réus a pagarem aos autores a quantia de € 1.000,00 (mil euros) a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos em consequência do descrito nos factos provados 13) e 14); j) Condena os réus a absterem-se da prática de quaisquer atos que impeçam o exercício dos direitos e a faculdade previstas em a) a e).

Os RR. não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo formulado as seguintes conclusões: (…) Finalizam pedindo a revogação da sentença recorrida no que respeita aos direitos declarados sob a alíneas b), c) e d) do respectivo dispositivo e à condenação pertinente fixada nas alíneas f) a j) do mesmo dispositivo.

A parte contrária não contra-alegou.

II – Objecto do recurso Considerando que: . o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos...

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