Acórdão nº 226/11.1GBAVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelFILIPE MELO
Data da Resolução19 de Maio de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Após conferência, acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: No 1º Juízo do Tribunal Judicial de Vila Verde, após julgamento, foi decidido: Condeno o arguido Ernestino L..., como autor imediato, pela prática de: - um crime de detenção de arma proibida previsto e punido no art.º 86.º n.º 1 c), por referência aos artigos arts.º 2º, nº 1, al. ad) e ar) e 3º, n.º 1 e n.º 6, al. a), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na pena de 220 (duzentos e vinte) dias de multa à taxa diária de € 12,00 (doze euros), o que perfaz o montante global de € 2 640,00; - uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 97.º n.º 1, por referência ao art.º 2º, n.º 1, al. aac) da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na coima de € 1 200,00 (mil e duzentos euros); e de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 97.º n.º 1, por referência aos artigos 2.º n.º 1 af) e 3.º n.º 9 b) da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na coima de € 1 200,00 (mil e duzentos euros), e em cúmulo jurídico na coima única de € 2 000,00 (dois mil euros).

Inconformado, o arguido Ernestino L... recorre desta decisão, com as seguintes conclusões: a) Uma arma de plástico comercializada como um brinquedo numa vulgar loja de uma superfície comercial, que não é passível de ser transformada em arma de fogo, apresentando um sistema totalmente inofensivo, pois através dela não são disparados quaisquer projecteis não apresentando quaisquer partes móveis, não se confundindo com uma arma de fogo nem como reprodução, a sua posse pelo arguido, não configura a prática de uma contra - ordenação p.p. pelo artigo 97.°, n.º 1, por referência ao art.º 2.°, n. 1, al aac) da Lei n." 5/2006, de 23/2.

b) Há alteração substancial dos factos quando da adição ou modificação dos factos resulte: i) que o bem jurídico agora protegido é distinto do primitivo; ii) um facto naturalísfico diferente, objecto de um diferente e distinto juízo de valoração social; iii) a perda da "imagem social" do facto primitivo, ou seja, resulte a perda sua identidade; iv) o arguido não tenha tido oportunidade de se defender dos "novos factos", não sendo estes meramente concretizadores ou esclarecedores dos primitivos; v) o agravamento das sanções aplicáveis ao arguido, servindo de moldura padrão a constante do tipo a que, na realidade, devem ser subsumidos os factos descritos na acusação.

c) A Mm.a Juiz ao determinar no despacho exarado na acta de 29.11.2012, que o arguido ficasse acusado pela al c) do nº 1 do artº 86º da Lei nº 5/2006, em vez da ai d) de que vinha acusado pelo Ministério Público tendo como consequência directa o agravamento dos limites máximos das sanções aplicáveis, que passaram, em abstracto, de uma moldura penal até 4 anos de prisão ou pena de multa até 480 dias (al d)) para de 1 a 5 anos de prisão ou pena de multa até 600 dias ( al c)), procedeu a uma alteração substancial dos factos, pelo que deveria seguir-se a disciplina prevista no art.º 359.° do CPP, o que não aconteceu, configurando-se tal situação uma nulidade prevista no art. 379°, 1 al. b) do CPP.

d) Na determinação da concreta medida da pena, terá de ter-se atenção o artigo o art" 70° do C.P. que estabelece, com clareza, uma preferência pelas penas não detentivas, sempre que tal se mostre possível. Diz aquele preceito que, "Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".

e) Por sua vez o artº 71° do C.P. estabelece no seu nº 1 a orientação base para a medida da pena a aplicar: “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção".

No nº 2 do preceito faz-se referência às "circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele." O nº 3, por último, obriga a explicitar na sentença os fundamentos da medida da pena que se elegeu.

E é bom de ver que a referida exigência, de fundamentação da concreta pena aplicada, no que diz respeito à sua medida, pode estar ao serviço da respectiva sindicabilidade em sede de recurso do art."º71º do C.P.).

f) Entende o recorrente que, face ao que ficou provado, que o arguido não tem antecedentes criminais, que só aceitou ficar com a guarda das armas até às partilhas da herança, que somente guardou as armas por questões de segurança, sendo que a espingarda é propriedade da herança, a pena de multa que lhe foi aplicada, (220 dias) é exagerada, muito próxima do meio da pena (300 dias), atendendo ainda e em comparação com outras decisões quanto a situações idênticas. Vejam-se por exemplo os seguintes acórdãos.

Ac da RC de 01-04-2009 pena de 60 dias de multa; Ac da RP de 23.5.2012 pena de 90 dias de multa; Ac da RP de 02-11-2011 pena de 150 dias de multa; Ac da RP de 13.4.2011 pena de 120 (cento e vinte) dias de multa; Ac da RC de 28.9.2011 pena de 120 dias de multa.

Assim, entende o recorrente que uma pena de 100 dias acha-se adequada, justa e equitativa ao presente caso.

g) Insurge-se ainda o recorrente contra o montante pecuniário que lhe foi aplicado por cada dia de multa 12,00 €. Neste particular aspecto, como defende o Professor Figueiredo Dias (Direito Penal Português, pág. 127), todas as considerações atinentes quer à culpa, quer à prevenção geral quer à especial, devem exercer influência sobre a determinação da pena e, por via disso, sobre os dias de multa, e não sobre o quantitativo diário. Em contrapartida, tudo quanto respeite à situação económica - financeira do condenado deve ser considerado na fase de fixação do quantitativo diário da multa.

De tal forma, a nossa lei, (artigo 47.°, n.? 2, do C. Penal) vai para além de uma visão puramente economicista e contempla critérios de razoabilidade e exigibilidade. Assim, se é verdade que a pena de multa terá de representar uma censura do facto, e ao mesmo tempo uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada, não é menos certo que deverá sempre ser assegurado ao condenado o nível existencial mínimo adequado às suas condições sócio - económicas.

Contudo, a pena de multa não pode transformar-se numa pena de confisco, pelo que, conforme dizem Jeschek (Tratado de Derecho Penal, pág. 709) e Figueiredo Dias (obra citada, pág. 129), devem ser privadas de influência na determinação do quantitativo diário circunstâncias como as de o condenado viver com sua família num imóvel de alto valor e pagar altíssimos prémios de seguros de vida ou encargos análogos.

h) No concreto caso, ficou provado, que o arguido habita em casa própria com a mulher e dois filhos maiores, um deles estudante. Pagam mensalmente um prestação de € 750,00 para aquisição da habitação. Paga uma prestação mensal de € 250,00 pela aquisição de um veículo de marca Nissan de 2006. Aufere mensalmente rendimentos não concretamente apurados, mas superiores a € 1.000,00.

Face a tal quadro táctico, é mais adequado, na opinião do recorrente, que lhe seja aplicada uma quantia de € 6,00 correspondente a cada dia de multa.

i) Por fim, insurge-se o recorrente quanto aos montantes das coimas aplicadas.

Ao arguido foi -lhe aplicado uma coima de € 1.200,00 por cada contraordenação e em cúmulo jurídico uma coima única de € 2.000,00.

Como sanção de natureza pecuniária a coima não poderá deixar de ser fixada em função da situação económica do agente. A situação económica intervém aqui num contexto diverso daquele que se passa ao nível da multa penal. Ali a situação económica só intervém na definição do "quantum" diário da multa, depois de a culpa e as exigências de prevenção terem definido a dimensão dos dias de multa que a materializam Pelas razões que já foram aduzidas em supra, para o montante da pena de multa, como também face a outras decisões judiciais que representam alguma similitude com o presente caso, como por exemplo: Ac da RP de 7.11.2012 RP201211071245/11.3TBVLG.P1 - coima aplicada € 600,00.

Ac da RC de 29-02-2012, 1109/09.0JACBR.C1 - coima aplicada € 700,00; Entendemos mais justa e adequada a aplicação ao arguido de uma coima de € 600,00 por cada contra ordenação e em cúmulo jurídico uma coima única de € 1.000,00.

Ao decidir como decidiu o Tribunal "a quo" violou as seguintes disposições legais: - Artigo 97.°, nº 1, por referência ao art.º 2.°, n.º 1, al aac) da Lei nº 5/2006, na redacção que lhe foi conferida pela Lei 17/2009 de 6/5; - Artigo 1.°, al f) e Artigo 359.°, n.s 1 e 2, ambos do CPP, - Artigos 40.°, 47.°, nº 2, 70.°,71 n.s 1,2,3, todos do CP; Em suma, e como bem referido no douto parecer que antecede, entende o arguido que a sentença é nula por haver condenado a coberto duma alteração substancial dos factos, porquanto no despacho de 29/11/2012 lhe foi comunicada uma alteração não substancial, mas que assim não pode ser qualificada porque daquela decorre um agravamento da pena aplicável; Que a pena de multa aplicada – 220 dias – é exagerada, visando a aplicação duma pena de 100 dias e que a taxa diária aplicada – 12 euros – peca por excesso, devendo esta situar-se em 6 euros Entende ainda que não constitui contra-ordenação a detenção efectivamente verificada do que chama de “arma de plástico”, por ela ser um “brinquedo” que se comercializa “numa vulgar loja de uma superfície comercial”, porquanto “não é passível de ser transformada em arma de fogo, apresentando um sistema totalmente inofensivo, pois através dela não são disparados quaisquer projecteis, não apresentando quaisquer partes móveis, não se confundindo com uma arma de fogo, nem como reprodução”, havendo, pois, um erro de qualificação jurídica E por fim que o valor da coima aplicado a cada uma das contra-ordenações se apresenta exagerado, batendo-se por um valor de 600 euros para cada uma delas, e por uma coima única de 1.000 euros.

A decisão recorrida assentou na seguinte matéria de facto: No dia 12 de maio de 2011, pelas 10.30 horas, o arguido detinha, na sua residência, sita na Rua do...

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