Acórdão nº 38/11.2TBMDB.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: AG.

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Recorrido: BB.

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Tribunal Judicial de MB.. AG.

, residente no Lugar da Anta, Freguesia de Bilhó, Concelho de MB., intentou a presente acção de condenação, emergente de acidente de viação, com a forma de processo ordinária, contra a Ré, BB.

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, com sede na Rua RR., Porto, pedindo que:

  1. Se declare o condutor do veículo seguro pela ré o único culpado pelo acidente de viação que descreve na petição inicial e, em consequência, b) Se condene a ré a pagar-lhe, a título de ressarcimento, as seguintes quantias: i. € 20 000,00 relativa a IPP, ii. € 6 000,00, relativa a perdas salariais, iii. € 10 000,00, relativa a danos não patrimoniais, iv. € 555,94, relativa a danos patrimoniais, c) Se condene a ré a pagar-lhe juros de mora a contar da citação, à taxa em vigor, actualmente de 4% e a sobretaxa de 5% desde o trânsito em julgado da sentença até efectivo e integral pagamento, a título de sanção pecuniária compulsória, nos termos do art. 829º-A do CC.

    Após descrever a sua versão do acidente, que imputa a conduta negligente do condutor do veículo seguro na R., alega o A. os danos sofridos e directamente resultantes do acidente.

    Válida e regularmente citada, contestou a R., e, impugnando os factos, defenderam-se ainda por via transversal, concluindo a primeira pela improcedência total da acção.

    A fls. 78 e ss., o Instituto da Segurança Social, IP. (de ora em diante denominado ISP), deduziu contra a ré pedido de reembolso de prestações de subsídio de doença pagas ao autor em consequência do sinistro, no valor de € 1.807,00, acrescidos de juros vencidos e vincendos.

    Foi proferido despacho saneador onde se afirmou a validade e regularidade da instância, organizando-se de seguida a matéria de facto assente e a base instrutória que não sofreu reclamação.

    Realizado o julgamento, foi proferida sentença que respondendo à matéria de facto controvertida, julgou totalmente improcedente a acção.

    Inconformado com tal decisão, apela o Autor, pugnando pela revogação da decisão, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: “

    1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença, proferida nos autos à margem referenciados, que decidiu julgar a presente acção improcedente e, em consequência, absolveu a ré do pedido formulado pelo autor.

    2. Considerou o Sr. Juiz nos pontos 19 e 35 da factualidade dada como provada que: “Quando o embate ocorreu, o veículo NJ encontrava-se imobilizado na faixa de rodagem, por força da travagem realizada pelo respectivo condutor ao avistar o ciclomotor a cerca de cinco metros de distância e o de matrícula HE encontrava-se em deslocação, a velocidade não apurada” “O condutor do veículo NJ, avistando o veículo do autor, diminuiu a respectiva marcha imobilizando-o”.

    3. Concluiu o Mm.º Juiz do Tribunal a quo que porque o condutor do NJ tomou todas as precauções devidas para evitar o acidente, mormente, imobilizando o veículo antes do embate, o único culpado da sua produção foi o A., pois que o mesmo não deu cumprimento ao dever consagrado no artigo 24.º, n.º 1 do C.E, posto que não logrou imobilizar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, de modo a evitar o embate.

    4. Sucede que, na fundamentação da resposta à matéria de facto dada como provada, a convicção do Tribunal estribou-se, entre outros, no depoimento da testemunha – AJ – que segundo o Sr. Juiz do Tribunal a quo: “de modo espontâneo e seguro, assumindo circular no veículo pesado de passageiros envolvido no sinistro na altura do mesmo, se reportou à percepção que dele teve, no sentido de ouvir o barulho do impacto dos veículos (que não viu), após o que o pesado se imobilizou, sem ter ocorrido qualquer travagem brusca”.

    5. Ora, se, por um lado, o Sr. Juiz decidiu que o condutor do NJ tomou todas as precauções, imobilizando o veículo antes do embate, fundamentou a sua decisão e formou a sua convicção com base no depoimento de uma testemunha que referiu exactamente o contrário, ou seja, que o NJ imobilizou-se após o embate.

    6. Pelo que, a sentença padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. c) do NCPC.

    7. Os quesitos 19.º e 35.º devem ser alterados para não provados.

    8. Os depoimentos que impõem decisão diversa da recorrida são o da testemunha AJ., as declarações do próprio A., bem como prova documental, nomeadamente, as declarações do motorista do NJ prestadas em sede de participação de acidente de viação junta à p.i sob o Doc. n.º 1, as quais estão em contradição com as declarações por ele prestadas em julgamento.

    9. A testemunha António Joaquim Ribeiro, cujo depoimento o Tribunal a quo valorou, porque sério e credível, afirmou que circulava no interior do autocarro, não podendo confirmar a dinâmica do acidente, pois que, efectivamente, não o viu, mas confirmando que o autocarro só se imobilizou após o embate, confirmando, assim, que o embate ocorreu quando ambos os veículos se encontravam a circular, (sublinhado nosso).

    10. O próprio A., em declarações de parte, de forma completamente isenta, afirmou circular a cerca de 1 metro da berma da estrada atento o seu sentido de marcha e assim que viu o autocarro guinou, ficando a cerca de 50 cm da berma da estrada, sendo que quando o embate ocorreu o autocarro vinha em circulação.

    11. A testemunha, CO., condutor do veículo NJ, prestou declarações em julgamento que estão em contradição manifesta com aquilo que declarou na participação de acidente de viação elaborada pela GNR, onde declarou: “Circulava entre Pioledo e Cavernelhe, ao descrever uma curva à esquerda fui embatido por um ciclomotor que circulava em sentido oposto, projectando-se, de seguida, numa valeta”.

    12. Ou seja, em momento algum, referiu o condutor, nesta sede, ter imobilizado o veículo antes do embate.

    13. Note-se que as declarações prestadas perante a GNR, aquando da elaboração da participação do acidente de viação, foram-no imediatamente após a ocorrência do sinistro, ao contrário do que sucedeu com as prestadas em julgamento, que foram prestadas sensivelmente quatro anos depois, a que acresce o interesse que esta testemunha tem no desfecho da causa.

    14. Estranha-se, assim, a factualidade dada como provada pelo Sr. Juiz nos pontos 19 e 35, pois é o próprio Tribunal que confere credibilidade a uma testemunha que diz que o autocarro se imobilizou após o embate, mas afinal dá como provado exactamente o contrário, ou seja, que o NJ já estava imobilizado quando ocorreu o embate, valorando, apenas e tão só o depoimento do motorista do autocarro, que, como acima se disse, anteriormente depôs em sentido contrário.

    15. Salvo o devido respeito por opinião contrária, não podemos atribuir credibilidade ou prevalência ao depoimento do motorista do autocarro, em detrimento do depoimento de uma testemunha completamente alheia e desinteressada no desfecho desta lide, não devendo, assim, ser valorado nos termos em que o foi pelo Tribunal a quo.

    16. Pelo que, face à alteração da matéria de facto pretendida, dúvidas não existem que quando os veículos embateram encontravam-se em circulação.

    17. Da matéria de facto provada resulta ainda que a via tem 3,60m, o autocarro tem uma largura de 2,50mts e circulava a cerca de 0,50 cm a 1 metro da berma.

    18. Entendemos, assim, que houve culpa efectiva do condutor do veículo seguro na Ré, pois que circulava ocupando toda a faixa de rodagem, impedindo a passagem de quem circulava em sentido contrário, mormente, do A., que, veja-se, conduzindo um ciclomotor, portanto, um veículo pequeno, não teve espaço suficiente para passar na sua hemi-faixa de rodagem, em virtude da mesma se encontrar praticamente toda ocupada pelo condutor do veículo seguro da R.

    19. Violou, assim, o motorista do NJ o disposto no artigo 13.º, n.º 1 e 2 do C.E.

    20. Mas mesmo que se entenda não existir culpa efectiva do condutor do veículo seguro da R., sempre a mesma deverá responder pelos danos, com base na culpa presumida do condutor ou em responsabilidade pelo risco.

    21. No caso dos autos não oferece dúvidas que existia uma relação de comissão entre o condutor do veículo e a sociedade proprietária do mesmo, dado que aquele o conduzia sob as ordens e direcção desta, cfr. ponto 5 da factualidade dada como provada.

    22. Recai portanto sobre o condutor a presunção de culpa a que se refere o citado n.º 3, do artigo 503.º do C. Civil.

    23. Ora, assim sendo, mesmo que se considere que não houve culpa do condutor do veículo segurado da R., como decidido pelo Tribunal a quo, sempre deve recair sobre o condutor do NJ a presunção de culpa, X) Isto porque, da factualidade dada como provada sabe-se apenas que o veículo NJ ocupava praticamente toda a faixa de rodagem por onde circulava e que o embate ocorreu entre o canto dianteiro esquerdo do NJ e o punho esquerdo do volante do HE, sendo que, ambos os condutores antes do embate avistaram-se a 4/5 metros de distância.

    24. Mesmo que ainda assim não se entenda, ou seja, caso se considere afastada por não provada, a culpa efectiva de qualquer dos condutores intervenientes no acidente, bem como a culpa presumida do condutor do veículo segurado da R., sempre deve considerar-se, que atentas as circunstâncias em que ocorreu o acidente, estamos perante um caso de responsabilidade pelo risco, já que, circulando um veículo pesado de passageiros, com 2,50 metros de largura, a pelo menos 0,50 m da berma, numa estrada com 3,60 m de largura, são as condições da via e dos veículos que estiveram na origem do acidente e não a culpa dos seus condutores, já que, ocupando o veículo motorizado do A e o seu condutor pelo menos 75 cm de largura, não havia espaço para ambos se cruzarem sem ocorrer o embate.

    25. Pelo que, tendo em conta o disposto no artigo 506.º-1 do Código Civil que determina que, para efeitos indemnizatórios, deve considerar-se a responsabilidade repartida pelo risco com que cada um dois veículos tiver contribuído para os danos, deve fixar-se o grau de responsabilidade para a produção do acidente e dos danos...

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