Acórdão nº 36/14.4TBPCR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | FILIPE MELO |
Data da Resolução | 01 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Após conferência, acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: No Tribunal Judicial de Paredes de Coura, foi decidido manter a decisão administrativa aplicada à arguida.
Inconformada, a arguida recorre novamente desta decisão, apresentando as seguintes conclusões: I. Recorre-se da decisão do Tribunal Judicial de Paredes de Coura que rejeitou a impugnação judicial deduzida da decisão do Director Nacional Adjunto da PSP que condenou a Arguida na coima de € 2.500,00, acrescido das custas respectivas, pela prática da contra-ordenação prevista nos artigos 159º a 161º do DL 422/89, de 02 de Dezembro; II. A sentença incorreu em erro de julgamento ao considerar que o procedimento administrativo e a decisão final administrativa não eram nulos por violação do direito de audição prévia; III. No âmbito do processo administrativo, a Recorrente recebeu notificação em Fevereiro de 2013 para o exercício do direito de audição prévia que não dava a conhecer os fundamentos de facto nem os fundamentos para a qualificação da máquina como modalidade afim de fortuna ou azar e, consequentemente, para a conclusão de que a mesma acarretava responsabilidade contra-ordenacional; IV. Arguida a nulidade da notificação, a entidade administrativa não respondeu, tendo de imediato proferido decisão final; V. Em sede judicial, e na apreciação desta questão, a sentença dá como provado que a Recorrente foi notificada nos termos que resultam de fls. 111, com a entrega do auto de notícia e cópia do exame pericial; VI. O que representa a notificação para o exercício de audição prévia recepcionada pela Recorrente em 7 de Fevereiro de 2013, composta pela certidão de notificação, auto de notícia nº 117/12 e cópia do relatório pericial; VII. A decisão recorrida erra ao considerar que não foi violado o direito de defesa da Recorrente, na vertente da necessidade de lhe terem de ser dados a conhecer os elementos de facto e direito da infracção imputada; VIII. Não se percebe como pôde a Recorrente, na fase do procedimento administrativo, ter tido conhecimento de todos estes elementos de facto e de direito quando em nenhum dos documentos que lhe foram entregues consta sequer uma singela explicação que permita perceber porque é que o mecanismo em causa desenvolvia modalidade afim de fortuna ou azar e porque motivo estávamos perante a prática de uma contra-ordenação; IX. Ignorava-se naquela fase qual o critério da entidade administrativa para considerar estarmos perante modalidade afim de fortuna ou azar; X. Não podia a Recorrente rebater a acusação por não saber quais os motivos da entidade administrativa para considerar preenchido o tipo legal, nem podia fundamentar a sua posição e a sua defesa escrita de modo a tentar convencer a entidade administrativa que a sua fundamentação ou motivação era errada e/ou insuficiente; XI. Também se demonstra não terem sido dados a conhecer suficientemente à Recorrente os elementos de facto da contra-ordenação, e nomeadamente, o modo de funcionamento do mecanismo; XII. Do facto da Recorrente ter exercido o direito de audição prévia não se pode retirar o seu real conhecimento acerca dos pressupostos de facto e de direito da infracção comunicada nem a conclusão de que o direito de audição prévia se mostra respeitado; XIII. Ao contrário do que refere a decisão recorrida, da leitura da defesa escrita retira-se sim o desconhecimento sobre a fundamentação da entidade administrativa inerente à infracção; XIV. O direito de audição prévia visa facultar ao Arguido a possibilidade de participar no processo contra-ordenacional correspondente, exercendo o contraditório e apresentando as razões de facto e de direito que entenda por convenientes e necessárias à formação da decisão final (apresentando, se entender, as razoes de discordância em relação à acusação); XV. Para tal, é necessário que a acusação (leia-se projecto de decisão) contenha os elementos de facto, de direito e a necessária fundamentação para que o Arguido perceba do que está e porque está a ser acusado; XVI. Errou o Tribunal ao não considerar que a notificação para o exercício do direito de audição prévia era completamente omissa no que toca aos elementos de facto imputados à Recorrente e no tocante a qualquer explicação no sentido de se perceber por que motivo é que a entidade administrativa qualifica o mecanismo como modalidade afim de fortuna ou azar e subsume-a ao regime contra-ordenacional previsto na lei do jogo; XVII. A consequência para a violação do direito de audição prévia é a nulidade do procedimento contra-ordenacional, conforme entendeu o STJ, no Assento nº 1/2003, de 25 de Janeiro; XVIII. A sentença viola as regras da experiência comum, analisa erradamente a documentação do processo que atesta o modo de notificação da Recorrente para o exercício do direito de audição prévia e erra na interpretação do alcance da norma dita violada (artigo 50º do Regime Geral das Contra-Ordenações); XIX. Deve, na sequência, ser anulada e substituída por decisão de absolvição da Recorrente; XX. A sentença incorreu em erro de julgamento ao considerar não verificado o vício de incompetência do autor do acto; XXI. A sentença não se pronuncia sobre a verdadeira questão colocada à sua apreciação: XXII. Existe vício de incompetência de autor do acto porque a lei de habilitação, conferindo poderes ao Ministro da Administração Interna para aplicar coimas, não prevê expressamente como possível órgão delegado e, concretamente, o Director Nacional da PSP; XXIII. A norma de habilitação deve conter a referência expressa de qual o órgão destinatário do acto de delegação, conforme estipula o artigo 111º, nº2 da Constituição da República Portuguesa e 35º, nº1 do Código de Procedimento Administrativo; XXIV. Ao assim não ser, no absurdo, poderia o Sr. Ministro da Administração Interna delegar os seus poderes num administrativo ou até num funcionário de limpeza, desde que integrado na estrutura hierárquica do Ministério; XXV. A jurisprudência e doutrina também entendem que a delegação de poderes num determinado órgão só é válida e legítima se constar da norma habilitante que aquele órgão concreto pode ser sujeito passivo concreto do acto de delegação; XXVI. Não decorrendo da lei de habilitação menção expressa de que o Ministro da Administração Interna pode delegar as suas competências, nomeadamente, para aplicar coimas, na PSP e na sua Direcção Nacional, é inequívoco que o despacho de delegação de poderes é inválido e consequentemente é o Sr. Director Nacional Adjunto da PSP incompetente para aplicar qualquer coima nesta matéria; XXVII. A sentença recorrida incorre em erro de julgamento, ao não analisar devidamente o instituto da delegação administrativa de poderes; XXVIII. Mostram-se violados os artigos 164º da Lei do Jogo, 111º, n2 da CRP e 35º, nº1 do CPA; deve a sentença ser anulada e absolvida a Recorrente; XXIX. A sentença incorreu em erro de julgamento ao não considerar verificada a nulidade da decisão administrativa condenatória por omissão do dever de pronúncia; XXX. A Recorrente articulou como fundamento de impugnação a violação do dever de pronúncia que sobre a entidade administrativa impendia na sequência da defesa escrita e que devia ter sido levado à decisão administrativa condenatória; XXXI. A factualidade alegada na audição prévia devia ter sido ponderada; XXXII. O ónus da prova no direito sancionatório impende sobre a entidade administrativa que acusa, sendo esta entidade que tem de provar os pressupostos constitutivos do tipo legal; XXXIII. Sobre esta entidade pertence todo o poder de instrução, nos termos do artigo 54º do RGCO, cabendo-lhe recolher toda a prova necessária à descoberta da verdade material e à boa decisão da causa; XXXIV. Perante a defesa da Recorrente que afirmou nunca ter colocado mecanismo que atribuísse prémio em dinheiro mas apenas mecanismo que atribuía vales de desconto, cabia à entidade administrativa pronunciar-se sobre a matéria, recolher a prova necessária e fundamentar a sua decisão no sentido da prova ou não prova do facto alegado; XXXV. A decisão administrativa não dedicou uma única linha a esta matéria.
XXXVI. Em sede de julgamento percebeu-se porque motivo é que a entidade administrativa não se pronunciou sobre a defesa articulada em audição prévia; XXXVII. Decorre documentado (vide despacho constante da acta de 26-03-2014 e de 23-04-2014) que o original do mecanismo desapareceu – cartaz onde se descrevia o seu modo de funcionamento - e as cópias do processo relativas ao mecanismo e ao seu modo de funcionamento são ilegíveis, pelo que nunca poderia a entidade administrativa comprovar o facto alegado pela defesa e de que decorria forçosamente a absolvição desta concreta acusação; XXXVIII. De acordo com o artigo 374º, nº2 do CPP, aplicável por força do artigo 41º do Regime Geral das Contra-Ordenações, a decisão final deve-se pronunciar sobre os factos levados ao processo pela acusação e pela defesa; XXXIX. A omissão no cumprimento deste requisito gera nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 379º, nº1, al. c) do CPP.
XL. Nulidade que a sentença recorrida deveria ter considerado verificada; XLI. Não se devendo confundir fundamentação da decisão administrativa com omissão do dever de pronúncia, como erradamente efectua o Tribunal de 1ª Instância...
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