Acórdão nº 696/07.2TBEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Abril de 2012
Magistrado Responsável | MANSO RA |
Data da Resolução | 26 de Abril de 2012 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência na 1ª Secção Cível da Relação de Guimarães: Joaquim (…) intentou, pelo Tribunal Judicial de Esposende, ação com processo na forma ordinária contra Maria (…), Paulo (…), Pedro (…), Tiago (…) e mulher Joana (…) e António (…), peticionando que fosse modificado o contrato de trespasse que descreve, celebrado entre os Réus, sendo, em consequência: a) declarado um novo valor a considerar como preço do trespasse; b) reconhecido a quem deu em trespasse um crédito sobre o trespassário, no valor da diferença entre o preço pago e o devido; c) condenado o trespassário no pagamento ao Autor do crédito de €285.046,38 e juros respetivos. Subsidiariamente, peticionou que fosse declarada ineficaz em relação a si o trespasse a que alude, na medida em que tal se mostre necessário à satisfação do seu crédito.
Alegou para o efeito, em síntese, que é credor da 1ª Ré por vários empréstimos de dinheiro que lhe fez, que totalizam €285.046,38, como sabiam todos os Réus. Tal quantia, porém, está por pagar, pese embora a execução instaurada contra a 1ª Ré. A 1ª Ré é meeira no património que tinha com seu falecido marido e contitular do direito à respetiva herança, assim como os 2º, 3º e 4º Réus, filhos do casal, são contitulares do direito à mesma herança. De tal acervo fazia parte um estabelecimento de farmácia, que era o único bem capaz de garantir a satisfação do crédito do Autor. Sucede, contudo, que tal bem veio a ser trespassado ao 6º Réu pelo preço de €500.000,00 (de que €422.826,20 ficaram logo consignados ao pagamento, a fazer pelo trespassário, de dívidas pré-existentes aos fornecedores da farmácia), valor este deveras inferior ao valor comercial real de farmácia, que era, pelo menos, de €3.049.038,12. Os 1º a 5º Réus, que dependiam quase em exclusivo dos rendimentos proporcionados pela farmácia, encontravam-se então num “estado económico e social muitíssimo frágil”, tendo a farmácia acumulado avultadas dívidas. Acresce que a 1ª Ré, pessoa de avançada idade, não tinha experiência negocial para “operações hodiernas”. Com o aludido trespasse a 1º Ré, agindo afinal em “desespero de causa”, acabou por proceder a um negócio desastroso para as suas finanças, mas tendo ela e os 3º, 4º e 5º Réus consciência de que tal implicava o desfalque do seu património do bem que poderia permitir o ressarcimento do Autor. O 6º Réu, que de tudo isto tinha ciência e aproveitando-se do estado de ligeireza e inexperiência da 1ª Ré, obteve assim para si um benefício excessivo e injustificado, que ascende a um montante de pelo menos €2.549.038,12, valor este que representa o correspondente prejuízo para os trespassantes. Nesta medida, estamos perante um negócio usurário que importa modificar segundo juízos de equidade, devendo estabelecer-se um novo preço para o trespasse em função do seu valor de mercado, e o 6º Réu ser condenado a satisfazer o crédito do Autor. E o Autor, como credor da 1ª Ré, goza do direito de peticionar tal modificação, em sub-rogação da devedora, que o não fez. De outro lado, o trespasse implicou uma diminuição da garantia patrimonial do crédito do Autor, tendo os Réus agido de má fé, porquanto tinham perfeita consciência do prejuízo que do negócio resultaria para o Autor. Isto confere ao Autor o direito a impugnar o negócio, de forma a ver-se pago à custa do bem em causa.
Contestaram a 1ª Ré e o 6º Réu, concluindo pela improcedência da ação.
Alegaram, em síntese, que o negócio efetuado não padece de qualquer desvalor, não podendo ser impugnado nos termos visados pelo Autor.
Seguindo o processo seus termos, veio a final a ser proferida sentença que julgou improcedente a ação.
Inconformado com o assim decidido, apela o Autor.
Da sua alegação extrai as seguintes conclusões: (…) + O 6º Réu contra-alegou, concluindo pela improcedência da apelação.
+ Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir, tendo-se sempre presentes as seguintes coordenadas: - O teor das conclusões define o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, sem prejuízo para as questões de oficioso conhecimento, posto que ainda não decididas; - Há que conhecer de questões, e não das razões ou fundamentos que às questões subjazam; - Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
+ Da questão de Facto: (…) + Da questão de Direito (conclusões 77ª a 107ª): Insurge-se o Apelante quanto ao tratamento jurídico que à causa foi dado pela sentença recorrida, sustentando que a ação deve proceder.
Para vermos se assim é, importa recuperar aqui os factos que estão provados, e que são os seguintes: 1.- A Ré Maria (…) é mãe dos Réus Paulo (…), Pedro (…) e Tiago (…) e são todos herdeiros do falecido Júlio (…) (alínea A) dos “Factos assentes”).
-
- Existe um estabelecimento comercial de farmácia, denominado “Farmácia M (…)”, instalado no rés-do-chão do prédio urbano sito na Rua Primeiro de Dezembro, freguesia e concelho de Esposende, inscrito na matriz urbana sob o artigo 326 (alínea B)).
-
- O referido estabelecimento pertencia à primeira Ré e ao seu falecido marido, Júlio (…) (alínea C).
-
- Por escrito, datado de 24 de Maio de 2004, assinado pela primeira Ré e intitulado de “Declaração e Reconhecimento de Dívida” foi declarado: "Maria (…), viúva, residente na Avenida Engenheiro Losa Faria, 3, 3º Caminha, Esposende, por si e na qualidade de cabeça de casal da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Júlio (…), contribuinte...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO