Acórdão nº 494/10.6GCBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | PAULO FERNANDES DA SILVA |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2012 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: --- I.
RELATÓRIO.
--- Nestes autos de processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da comarca de Braga, por sentença de 10.11.2011, depositada no mesmo dia, decidiu, além do mais, --- Condenar o Arguido André N... --- «Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. nos termos dos artigos 203.º, n.º 1, 204.º, n.º 2, al. e), por referência ao art. 202.º, al. d), todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão Cf. volume II, fls. 158 a 177. ---. --- Do recurso para a Relação.
--- Notificado daquela sentença em 24.04.2012, inconformado com ela, o Arguido veio dela interpor recurso para este Tribunal em 15.05.2012, concluindo as suas motivações nos seguintes termos: (transcrição) --- «I. Afigura-se ao aqui Recorrente que, salvo o devido respeito, carece de fundamento de facto e de direito o douto Acórdão de fls. 158 a 174 dos autos, que o condenou, por um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203°, n.° 1 e 204, n.° 2, al. e) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, pelo que merece a discordância do recorrente e se lhe afigura passível de reparo; II. Encontra-se errada e incorrectamente julgada a matéria de facto dada como provada nos pontos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8 a qual deveria antes ter sido dada como não provada porque assim o impunha o depoimento da testemunha Nuno S... e a ausência de qualquer prova sobre a autoria do crime; III. Salvo o devido respeito e melhor opinião, não foi produzida prova segura e inequívoca que o arguido, ora Recorrente André N..., foi o autor dos alegados factos e agente do crime pelo qual veio a ser condenado; IV. Sucede que o depoimento da testemunha Nuno S..., não permitia, nem permite, com aliás resulta do próprio texto do douto Acórdão, atribuir a autoria do crime ao aqui recorrente, sendo certo que este não presenciou a pratica do crime, nem identificou o/s respectivo/s agentes, apenas tendo deposto sobre os bens alegadamente furtado; V. Acresce ainda que se desconhece, nem foi produzida prova sobre a forma como a aqueles concretos objectos ou superfícies, onde alegadamente foram identificados vestígio produzidos pelos dedos e mão do recorrente André, foi por este tocada e em que circunstâncias de tempo, modo e lugar tal aconteceu; VI. Para além dessa prova e essencialmente, o Tribunal a quo, para prova da autoria do crime formou a sua convicção no "relatório de apreciação técnica e relatório pericial a fls. 16 a 18"- que adiante colocaremos em crise; VII. Ora, conforme resulta do douto Acórdão e respectiva motivação, e conforme já aqui referimos, a supra referida testemunha não presenciou os factos, nem em momento algum por qualquer forma, reconheceu o arguido - o qual aliás foi julgado na ausência o que impunha um maior rigor e exigência na apreciação da prova uma vez que o Tribunal não dispõe da versão do arguido sobre os factos e qualquer explicação para existência de qualquer vestígio biológico - como sendo o autor dos factos, nem tão pouco é certo que foi o mesmo quem partiu o vidro ou forçou qualquer janela ou levantou ou teve contacto com qualquer persiana, e se esses objectos foram tocados naquelas circunstâncias de tempo lugar e não noutras, e se por qualquer outra forma poderá ter o arguido estado em contacto com aquelas superfícies e caixas, em circunstâncias dispares aquelas que resultam da douta acusação. Nenhum testemunha identificou ou reconheceu quem quer que seja, ou presenciou os factos; VIII. Acresce que a inspecção ao local - cfr. fls. 8 dos autos - só ocorreu cerca de 24 horas depois da prática dos factos aqui em julgamento, o que, para além da questão da perenidade das impressões digitais, dependendo naturalmente da qualidade das mesmas e condições de preservação e ambientais, admite e possibilita que durante um longo espaço de tempo aquele local e objectos pudessem ser tocados ou manuseados pelo arguido independentemente de ser ele o autor ou co-autor do crime em julgamento; IX. Acresce ainda que se desconhece se o arguido foi, por qualquer meio ou em qualquer circunstância de tempo, modo e lugar, anterior a prática dos factos, visita daquela residência ou nesta permaneceu por qualquer razão ou foi-lhe permitido o acesso pelo respectivo proprietário ou terceira pessoa; X. Nestes termos, não tendo sido recolhidas quaisquer provas materiais que permitam afirmar com o grau de certeza necessária a autoria do crime por parte do aqui recorrente o Tribunal a quo não podia, nem devia, ter dado como provado que o aqui recorrente era o agente do crime, nem a supra factualidade vertida nos pontos 1 a 8 dos factos provados. Muito menos poderia o fazer com base num alegado relatório pericial (cfr. fls. 18 do autos) remetida aos autos, transvestido, com o devido respeito, de prova pericial, de reduzido ou nulo valor probatório; XI. Dispõe o artigo 157°, n.° 1 do Código Processo Penal que: "Finda a perícia, os perito procedem à elaboração de um relatório, no qual mencionam e descrevem as suas respostas e conclusões devidamente fundamentadas. "; XII. Ora, conforme se pode constatar da leitura do relatório de fls. 18, apesar da designação que lhe pretendem atribuir de relatório pericial, não consubstancia o mesmo uma perícia nem um relatório pericial, uma vez que este não obedece aos requisitos impostos pelo artigo 157° supra referido, uma vez que não fundamenta a sua resposta e conclusão de que o recorrente produzira aqueles impressões reveladas; XIII. Acresce que esse alegado relatório nem sequer esclarece quais os métodos empregues para se proceder ao processo identificativo, nem são juntas aos autos quaisquer fotografias de vestígio digital alegadamente identificado e respectivas ampliações, bem como, do dactilograma com ele coincidente, para que fosse possível proceder às necessária confrontações utilizando as regras formuladas por Locard; XIV. Ou seja, no relatório de fls. 18 dos autos, não foram aduzidos quaisquer fundamentos que permitam sindicar a bondade da sua conclusão e metodologia empregue, impossibilitando avaliação e valoração desse juízo técnico ou científico por si produzido, numa clara manifesta violação do disposto no artigo 157° do Código Processo Penal; XV. Estar, nesse alegado relatório pericial, afirmado que o vestígio recolhido foi produzido por um qualquer dedo do aqui recorrente, vale tanto como se nesse relatório viesse afirmado sem qualquer fundamento ou sem que se conheça a razão de ciência, que o vestígio recolhido fora produzido por um qualquer dedo do aqui signatário, ou por um qualquer dedo de qualquer dos sujeito processual que intervierem nos presentes autos ou ainda, com o devido respeito e por mero efeito de raciocínio (todos estes exemplos ou hipóteses aqui colocadas), que foi produzido pelos Ilustres Desembargadores que venham a apreciar o presente recurso; XVI. Pelo exposto, no caso sub judice, não estamos perante um relatório pericial, e por o não ser não poderá o mesmo ser valorado enquanto tal, nomeadamente nos termos e com os efeitos consignados no artigo 163° do Código Processo Penal. Ora, este meio de prova foi essencial para a formação da convicção pelo Tribunal a quo de que o aqui recorrente foi o autor do crime dos autos. Consequentemente, não podendo, nem devendo, ser o mesmo valorado nos termos e com os efeitos consignados no artigo 163° do Código Processo Penal, nem tendo existido qualquer testemunha directa que tenha presenciado nomeadamente a alegada quebra do vidro e arrombamento da portada ou contacto com persiana, e não podendo a mera existência de impressões digitais reveladas ser suficiente para determinar que quem as produziu praticou um crime, nomeadamente este aqui em julgamento, necessariamente que o Tribunal a quo não podia, nem devia, ter dado com provada a supra referida factualidade vertida nos pontos 1 a 8 dos factos provados, a qual deveria, de acordo com o que se vem de expender, ser dada como não provada, pois assim o impunha a prova testemunhal e a demais prova validamente valorável enquanto tal; XVII. No caso em apreço, não existe para além do alegado relatório pericial - que como supra se referiu não poderá ser valorado enquanto prova pericial e as suas conclusões não têm qualquer valor enquanto juízo técnico ou científico - qualquer outra prova ou indício que possa de forma razoável e de acordo com as regras da experiência atribuir a autoria do factos ao ora recorrente, porque, se a impressão digital pode fazer prova directa do contacto do recorrente com os objectos ou superfícies em causa, o certo é que isoladamente, independentemente da sua localização (onde vestígio foi encontrado/revelado), não faz prova directa da participação do recorrente no facto criminoso, nem faz prova das concretas circunstâncias em que esse contacto ocorreu, e há quanto tempo, não podendo o Tribunal a quo, sem violar o princípio da verdade material e do in dubio pro reo e da livre apreciação da prova, presumir essas circunstâncias e dar como provados os supra identificados e transcritos factos vertidos nos artigos 1 a 8 dos factos provados, os quais deveriam ter sido dados como não provados; XVIII. Pelo exposto, toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, e face a ausência de prova segura e inequívoca da participação do aqui recorrente no crime dos autos, a factualidade vertida nos citados pontos ou artigos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8 dos factos provado deveria ter sido dada como não provada, assim o impunha (e impõe) o depoimento da testemunha Nuno S... - e demais prova produzida -, os quais nada disseram que permitisse atribuir a autoria dos factos ao aqui recorrente André N...; XIX. Acresce que, sem prescindir, nos presentes autos o arguido foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos art.º 203°, n.° 1 e 204°, n.° 1, al. a) e e) do Código...
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