Acórdão nº 830/09.8GAEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | MARIA LU |
Data da Resolução | 05 de Novembro de 2012 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO No processo comum (com intervenção do Tribunal Singular) n.º830/09.8GAEPS do 2ºJuízo do Tribunal Judicial de Esposende, por sentença proferida em 1/2/2012 e depositada no mesmo dia, foi decidido, além do mais, declarar o demandado Jacques F... parte ilegítima e consequentemente absolvê-lo da instância relativamente a ambos os pedidos de indemnização civil contra si deduzidos pelo assistente Manuel D... e pelo “Hospital de Santa Maria Maior, EPE”, nos termos dos arts.288.º n.º1 al.d), 494.º al.e) e 495.º , todos do CPC.
Inconformado com esta decisão, o assistente/demandante Manuel D... interpôs recurso, extraindo da respectiva motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: 1-Por sentença proferida a 01 de Fevereiro de 2012, foi o Arguido/Recorrido condenado pela prática: 2-de uma contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 24, n.º1 e n.º 3, 25º, n,º1 als. f) e i), e n.º 2, 145º, alínea e) e 147º, n.º 1 e 2 do Código da Estrada, que foi causal de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo Art. 148, n.º 1 do Código Penal; 3-E ainda pela prática de um crime de omissão de auxílio, previsto e punido pelo Art. 200º, n.º 1 e 2 do Código Penal.
4-E foi absolvido da instância quanto ao Pedido de Indemnização Cível contra si deduzido pelo Assistente, por ser considera do na sentença recorrida parte ilegítima.
5-Porquanto à data dos factos o Arguido/Recorrido tinha a responsabilidade civil, decorrente de acidente de viação, transferida para uma companhia de seguros, e beneficiava, à data, de seguro válido.
6-Ora, quanto a tal absolvição da instância do Arguido entendemos de modo diferente, já que não há fundamento legal para isso.
7-Na verdade, à luz do nosso Código de Processo Penal vigora o princípio da adesão ou interdependência, consagrado pelo Art. 71º, que reveste natureza obrigatória, no sentido de que o direito à indemnização por perdas e danos sofridos com o ilícito criminal só pode, em princípio, ser exercido no próprio processo penal.
8-Ou seja, o recurso às excepções previstas no Art. 72º do C.P.P. depende da vontade do lesado/Assistente.
9-Mais, a norma actualmente em vigor ao referir, expressamente, que “ o pedido de indemnização cível fundado na prática de um crime é deduzido contra o Arguido…” 10-Nessa senda, o aqui Assistente deduziu Pedido de Indemnização Cível contra o Arguido, e só contra ele, por este após o embate com o motociclo daquele, ter abandonado o local sem prestar qualquer auxílio ou providenciar para que o mesmo fosse prestado à pessoa do aqui Assistente/Recorrente, 11-Cuja integridade física, maxime, sua vida, se encontrava seriamente ameaçada e em perigo, 12-Até, porque, como se apurou e resulta provado, com o choque o Assistente foi projectado pelo ar indo embater contra as chapas de protecção (raile), acabando por ficar prostrado entre a berma e a via de trânsito, sujeito a ser atropelado.
13-E foi por estes factos, anote-se dados como provados na sentença recorrida, que o Assistente/Recorrente deduziu Pedido de Indemnização Cível contra o Arguido, com vista a ser ressarcido, primordialmente, pelos danos não patrimoniais, por este causados com a sua conduta ilícita, no valor de €50.000 (cinquenta mil euros).
14-Assim, provado que está, o crime de omissão de auxílio, deve o aqui Assistente ser ressarcido pelos danos decorrentes de tal conduta ilícita do Arguido, 15-Uma vez que, o nosso legislador previu a ressarcibilidade às vitimas de crimes, sob pena de tal direito ser denegado ao aqui Assistente.
16-Por outro lado, e para que se façam cumprir as necessidades de prevenção geral positiva que, no caso sub júdice, se revelam acentuadas, face aos consideráveis, e de toda a gente conhecidos, índices de sinistralidade rodoviária, 17-E dada a falta de consciência cívica e desrespeito, quer pelos valores sociais, quer pelos bens jurídicos tutelados, deve o Arguido ser condenado no pagamento de uma indemnização cível, pelo menos, por danos não patrimoniais.
18-Saliente-se que quem comete o presente tipo de crime, omissão de auxílio, tem um dever de garante, nos termos do Art. 10º, n.º2 do Cód. Penal.
19-Trata-se, pois, de um tipo legal de crime que sanciona o ataque ao valor da solidariedade social quando esse ataque se manifesta, como se verifica no caso presente, através de uma conduta socialmente inadmissível.
20-Isto é, através de uma conduta que denota reprováveis sentimentos de egoísmo e desrespeito em relação ao bem jurídico VIDA, dever de garante esse que o Arguido não zelou, muito pelo contrário, como até se diz na sentença recorrida.
21-E, nessa conformidade, esse dever de garante estende-se ao pagamento de uma indemnização, ao Assistente/Recorrente, por essa conduta culposa e danosa independente da que tem de ser atribuída pelo acidente em si, 22-Ou seja, um Pedido de Indemnização Cível que se refere só, como é evidente, ao crime de abandono, primordialmente, danos não patrimoniais pela omissão de auxílio.
23-Ou seja, temos, nesta sede, duas condutas distintas: 24-A conduta negligente do Arguido enquanto condutor do seu veículo automóvel em desrespeito pelas regras...
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