Acórdão nº 342/08.7GBVVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2012
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2012 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO No 1º. Juízo do Tribunal Judicial de Vila Verde, no âmbito do processo comum singular nº. 342/08.7 GBVVD, a arguida Ana C... foi condenada pela prática de um crime de ameaça agravada p. e p. pelos art. 153.º n.º 1 e 155.º n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 10,00, pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181.º n.º1, do Código Penal, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de € 10,00 e, em cúmulo jurídico, na pena única de 150 dias de multa, à taxa diária de € 10,00, o que perfaz € 1.500,00.
Foi, além disso, condenada a pagar € 900,00, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, a contar da notificação (18 de Outubro de 2010) até integral pagamento a Manuel C..., a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Inconformada recorre a mesma, rematando a respectiva motivação com conclusões, nas quais, em síntese, suscita as seguintes questões: - nulidade da sentença por omissão de pronúncia sobre questão suscitada na contestação e nulidade insanável por violação do disposto no art. 115.º n.º1 do Código Penal; - impugnação da matéria de facto; - vícios previstos no art. 410.º n.º2 do CPP (erro notório na apreciação de prova); - qualificação jurídica dos factos relativos ao crime de ameaça; - medida das penas.
* O Ministério Público junto do tribunal recorrido não apresentou resposta ao recurso.
O assistente respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência.
Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, a Ex.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência do mesmo, com excepção do montante diário da multa que entende dever ser fixado em € 8,00.
Foi cumprido o disposto no art.417.º n.º2 do CPP, tendo havido resposta quer do assistente quer da recorrente.
Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
* II- FUNDAMENTAÇÃO Decisão recorrida “A- Factos provados 1ºNo dia 09 de Junho de 2008, pelas 14 horas, estava o assistente Manuel C... a proceder ao restauro de um muro da sua residência, sita em Rua de C..., 7, Barbudo, em Vila Verde, quando surge, exaltada, a arguida que se lhe dirigiu dizendo “hei-de-te matar” 2ºA arguida proferiu a expressão supra referida com foros de seriedade, bem sabendo que as mesmas eram idóneas a provocar no assistente um sentimento de receio de inquietação e a afectar o mesmo na sua liberdade de determinação, o que se veio a verificar.
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Agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era legalmente proibida.
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Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar acima referidas a arguida dirigiu-se ao assistente Manuel C... chamando-lhe “ladrão”, “gatuno” e “vigarista”, o que fez com a intenção de o atingir e ofender na sua honra e consideração social e dignidade, como efectivamente atingiu e ofendeu.
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A arguida, que agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabia censurável e penalmente sancionável a sua conduta.
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Ao ameaçar de morte o assistente/demandante, a arguida/demandada provocou naquele sentimentos de receio e de inquietação.
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Tendo, por isso mesmo, constrangido o demandante no seu dia a dia.
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Por outro lado, ao injuriá-lo pela forma como o fez, a demandada ofendeu-o na sua honra e consideração, causando-lhe sentimento de vergonha, revolta e desgosto.
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O assistente é pessoa séria e honesta, goza e sempre gozou, em todo o lado onde é conhecido, de boa reputação.
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A arguida vive em casa de que é usufrutuária, com o marido e um filho, nora, e dois netos.
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É usufrutuária de vários imóveis que já partilhou com os filhos, com excepção de duas bouças que ainda são sua propriedade.
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É reformada, auferindo de reforma cerca de 400,00€ mensais, embora trabalhando na agricultura; 13º O cônjuge da arguida também se encontra reformado, auferindo uma reforma de França de cerca de 1.000,00€ mensais.
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O casal tem uma viatura automóvel e um tractor agrícola.
B- Factos Não Provados 1- Que a arguida é pessoa perfeitamente capaz de cumprir a ameaça de morte.
2- Que a ofensa na honra e consideração provocada pela arguida ao assistente tenha sido grave.
3- A arguida é pessoa pacífica e respeitada na sociedade.
4- A arguida seria incapaz de ameaçar o assistente ou outrem, com foros de seriedade e com intuito de lhe provocar um sentimento de receio e o afectar na sua liberdade de determinação C- Motivação de Facto O Tribunal formou a sua convicção sobre a factualidade provada e não provada com base na análise crítica e ponderada de toda a prova produzida, nomeadamente, nos documentos juntos aos autos, nas declarações da arguida e do assistente, no depoimento das testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento, conjugadamente com as regras da experiência e o princípio da normalidade, bem como no CRC da arguida.
Desde logo, o assistente e as testemunhas Fernando M..., Agostinho R..., Paulo C..., Manuel V..., Domingos S... e Luís C..., referiram de forma unânime que a arguida na altura dos factos se encontrava bastante exaltada, tendo, aliás, as três primeiras testemunhas dito que a arguida chegou ao local de tractor e bastante exaltada, que parou o veículo frente ao local de construção do muro, o que impossibilitou as testemunhas de prosseguirem com os trabalhos de construção do muro e, de forma autoritária, mandou parar as obras, dizendo ao assistente que o mesmo não tinha licença e que não podia fazer ali o muro.
No depoimento do assistente e das referidas testemunhas, o Tribunal extraiu que a arguida manteve-se no local exaltada durante pelo menos uma hora e meia, e que nesse período se dirigiu ao assistente e disse-lhe que o havia de matar, chamando-o, ainda, de “ladrão”, “gatuno” e “vigarista”.
O assistente acrescentou que se sentiu incomodado, assustado e inquieto, face às palavras proferidas pela arguida que manifestou a intenção de o matar, manifestação essa que considerou séria e ameaçadora, atendendo ao que conhece da arguida e à forma como se lhe dirigiu.
As testemunhas Fernando M..., Agostinho R... e Paulo C..., afirmaram que o assistente se sentiu preocupado e assustado com as palavras proferidas pela arguida ao ponto de não se manifestar contra a arguida e, bem assim, o ter andado pelo menos durante uma semana, constrangido, incomodado, triste e angustiado, principalmente, pelo facto de a arguida ter dito que o havia de matar e mandá-lo para junto da mulher, sendo que esta tinha falecido há uns doze anos.
O Tribunal valorou os depoimentos do assistente e das testemunhas Fernando M..., Agostinho R... e Paulo C..., apesar das suas relações de proximidade e familiares com o assistente, e bem assim, apesar de se terem verificado algumas discrepâncias entre as declarações prestadas pela testemunha Agostinho R... perante a autoridade policial e as prestadas em audiência de julgamento, mas que, no essencial, se mostraram coerentes.
As testemunhas Manuel V..., fiscal da Câmara Municipal, Domingos S... e Luís C..., militares da GNR, que se dirigiram ao local, referiram que, efectivamente, a arguida estava exaltada, mas que não se recordam de ter ouvido a mesma dirigir quaisquer insultos ou ameaças ao assistente.
A circunstância de estas últimas testemunhas terem referido que não ouviram a arguida dirigir-se ao assistente e o insultar ou ameaçar, não põe em causa a credibilidade do depoimento das restantes testemunhas, pois que, por um lado, os militares da GNR e o fiscal da Câmara Municipal chegaram ao local cerca de uma hora e trinta minutos depois de se iniciarem as altercações entre a arguida, o assistente e os trabalhadores presentes no local. Por outro lado, estas testemunhas não deixaram de dizer que, quando chegaram ao local, a arguida encontrava-se exaltada, o que torna verosímil ter aquela proferido as expressões que resultam provadas.
No que concerne aos traços de seriedade inseridos na expressão que a arguida dirigiu ao assistente de “hei-de te matar”, que este considerou existirem, razão pela qual disse ter ficado receoso e preocupado, também pelas regras da experiência e da normalidade, o Tribunal forma a sua convicção de que a expressão é adequada a causar ao assistente medo e inquietação, do mesmo modo, que é adequada a prejudicar a liberdade de determinação de quem quer que seja e também do assistente, sendo certo que resultou do depoimento das testemunhas, do assistente e da própria arguida que estes últimos desde há largos anos estão zangados e vêm tendo discussões.
Também resulta das regras da experiência e da normalidade que a arguida sabia que a referida expressão era idónea a provocar no assistente um sentimento de receio e de inquietação e a afectar o mesmo na sua liberdade de determinação, tanto mais que a expressão foi proferida em voz alta e no contexto de uma discussão entre a arguida e o assistente.
Do mesmo modo, resulta das regras da experiência que a arguida bem sabia que tal conduta era proibida e punida por lei.
No que se reporta às expressões “ladrão”, “gatuno” e “vigarista”, que a arguida dirigiu ao assistente, as mesmas também são de forma a causar no assistente vergonha, tristeza e desgosto, pelo que, o Tribunal não pode deixar de valorar o depoimento do assistente e das testemunhas Fernando M..., Agostinho R... e Paulo C..., quando afirmam que o assistente se sentiu com vergonha, revoltado e desgostoso.
As testemunhas João O..., Maria M... e Maria F..., vieram aos autos depor sobre a personalidade e carácter da arguida.
O seu depoimento foi manifestamente parcial, não depuseram de forma objectiva, verdadeira, pretenderam manifestamente trazer aos autos qualidades da arguida que não resultaram demonstradas. Aliás, qualidades que a arguida, com o seu comportamento em Tribunal, desmentiu, nomeadamente, a alegação que a mesma é uma pessoa pacífica, na medida em que a mesma apresentou-se em tribunal de forma agressiva e pouco comedida.
Por outro lado, as testemunhas traçaram um...
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