Acórdão nº 402/06.9TBVCT de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelISABEL ROCHA
Data da Resolução17 de Maio de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes que constituem a 1.ª secção cível do Tribunal de Guimarães.

I - RELATÓRIO Domingos e mulher, Rosa, Gracinda e marido, Fernando, intentaram a presente acção declarativa com processo sumário contra Adelino e mulher, Maria Ricardina, Daniel e mulher, Inês, pedindo que: a) se declare e reconheça o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio descrito no artigo 1º da petição inicial e que do mesmo faz parte integrante a parcela de terreno identificada no artigo 15º do mesmo articulado; b) se condenem os Réus a reconhecer aquele direito dos Autores e a restituírem a estes a dita parcela de terreno integrada no referido no artigo 1º da petição inicial; c) se condenem os Réus a abster-se da prática de quaisquer actos que atentem contra o direito de propriedade dos Autores; Se assim não se entender: d) que seja declarado nulo e de nenhum efeito o contrato de permuta mencionados nos artigos 13º a 16º da petição inicial; e) se condenem os Réus a restituir aos Autores a parcela de terreno referida no artigo 14º da petição inicial.

Alegam para tanto que: são donos e legítimos possuidores do prédio urbano sito no Lugar de …, Vila Boa, freguesia do Rego, comarca de Fafe, composto de casa de habitação de dois andares com área coberta de 192 m2 e terreno de logradouro, por lhes ter sido adjudicado em partilha realizada a 27.08.1990, vindo sobre o mesmo a exercer actos de posse há mais de 20 anos com intenção de exercerem direito de propriedade próprio, pleno e exclusivo; os 1ºs Réus são donos de prédio rústico situado no mesmo lugar, confinante com o referido prédio dos Autores, do qual destacaram uma parcela de terreno com 1.100 m2, objecto de inscrição autónoma na matriz sob o art.º 1… urbano, que doaram ao 2º Réu marido; há 25/30 anos realizou-se entre os anteriores proprietários dos prédios de AA e RR uma permuta verbal de parcelas de terreno desanexadas de cada um daqueles prédios, com sensivelmente 180 m2 cada, situação que se manteve ininterruptamente até hoje. Em Janeiro de 2006, os Réus começaram a propalar que a parcela de terreno recebida na troca pelo anteproprietário do prédio dos Autores – identificada no artigo 15º da p.i. – lhes pertencia e notificaram os Autores para de lá removerem os seus objectos e cortaram um tubo que conduz os resíduos líquidos à fossa.

Os Réus contestaram, defendendo-se por impugnação, alegando que: a permuta verbal de parcelas com área aproximada de 180 m2 cada, em meados de 1980 e referida pelos autores tem a localização que indicaram no levantamento topográfico junto a fls. 50; A parcela que ficou para o pai dos Autores foi totalmente ocupada por parte do prédio urbano aí depois edificado, ficando a confrontar directamente, nomeadamente nos seus alçados posterior e lateral esquerdo, com o prédio dos 1ºs. Réus; Os autores nunca praticaram actos de posse sobre o terreno adjacente àqueles alçados do edifício, sendo que, quer as fossas existentes no prédio dos Réus para escoarem águas limpas provenientes do café, quer os motores colocados nas traseiras do edifício, foram-no mediante autorização expressa do 1º Réu ao pai dos autores; os autores agem com abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, ao pedirem subsidiariamente a declaração de nulidade do negócio de permuta e restituição das parcelas permutadas Deduziram ainda pedido reconvencional nos seguintes termos: - que se declare e reconheça que os Réus/Reconvintes são donos e legítimos possuidores do prédio rústico identificado no artigo 76º da contestação, com as confrontações e áreas referidas nos artigos 89º, 90º e 91º; - que se declare e reconheça que a parcela de terreno que os pais dos Autores trocaram com os 1ºs Réus, descrita nos artigos 23º, 24º e 26º da contestação, fazia parte integrante do prédio dos 1ºs Réus e neste momento faz parte do lote de terreno que os 1ºs Réus doaram aos 2ºs Réus; - que se condenem os Reconvindos a reconhecer tal direito e a absterem-se de interferir na utilização que os Reconvintes pretendam dar ao seu prédio; - que se condenem os Reconvindos a pagar aos Réus/Reconvintes indemnização a título de danos não patrimoniais no valor de € 2.000,00, acrescida de juros contados desde a contestação; - que se condenem os Reconvindos como litigantes de má fé em multa e no pagamento aos Réus da quantia que for devida a título de honorários aos seus mandatários, bem como em quantia a fixar a título de despesas havidas com a presente acção.

Para tanto alegam, em síntese que: no exercício ininterrupto e contínuo de actos de posse, com os demais caracteres susceptíveis de permitirem o reconhecimento da aquisição por usucapião da titularidade do direito de propriedade sobre o prédio reivindicado, cuja área de 19.580 m2, é a que se encontra delimitada no levantamento topográfico junto a fls. 51, estendendo-se até à parede traseira do prédio dos Autores; a parcela cedida em permuta pelo pai dos Autores encontra-se integrada no prédio dos Réus e delimitada por um muro em pedra, sendo desde 1980 possuída pelos Réus. Em 2005, os primeiros Réus doaram aos segundos um lote de terreno com 1.100 m2 que desanexaram do seu referido prédio, para a construção de uma casa de habitação. No terreno doado aos 2ºs Réus inclui-se parte da parcela cedida aos 1ºs Réus pelo pai dos Autores. Assim, também os 2ºs Réus possuem, desde 2005, parte da parcela objecto de permuta; os Autores vêm propalando que os Réus lhes roubaram terreno, enxovalhando o bom-nome e a reputação destes que assim sofrem preocupação e angústia, para além dos incómodos decorrentes da defesa na presente acção, o que justifica o pedido de condenação dos Autores no pagamento de indemnização a título de danos morais. Não desconheciam os Autores a falta de fundamento da sua pretensão.

Os autores responderam, confessando que o prédio referido no artigo 1.º da pi foi dividido em dois, mantendo, no mais e no essencial, a versão da pi e impugnando os factos alegados pelos réus para fundamentar os pedidos reconvencionais.

Em conformidade com a dita confissão, alteraram as alíneas a) e b) do seu pedido, que passaram a ter o seguinte teor: a) que seja declarado e reconhecido que os 1ºs Autores são donos e legítimos possuidores do prédio descrito no artigo 18º do articulado de resposta e os 2ºs Autores do prédio descrito no artigo 19º do mesmo articulado e que dos dois prédios faz parte integrante a parcela de terreno descrita no artigo 15º da petição inicial, na proporção de metade para cada um deles; b) que os Réus sejam condenados a reconhecerem aqueles direitos de propriedade dos Autores e a restituírem a estes a dita parcela de terreno que faz parte integrante do logradouro dos respectivos prédios destes.

Os Réus treplicaram, impugnando uma vez mais os alegados actos de posse dos Autores sobre qualquer outra área para além da que se situa a nascente dos seus prédios.

Por despacho de fls. 140 foi admitido o pedido reconvencional.

Proferiu-se despacho saneador tabelar, fixou-se a matéria assente e seleccionou-se a matéria de facto controvertida Por despacho proferido a fls. 225 e ss. dos autos foi ordenada a realização de perícia colegial, tendo sido elaborado relatório subscrito unanimemente por todos os peritos.

Na sequência de reclamação dos Autores contra o relatório pericial, foi proferido despacho que, deferindo a reclamação, ordenou que os peritos esclarecessem as omissões e deficiências ali referidas.

Os peritos prestaram esclarecimentos a fls 355 e 356.

Os Autores vieram então requerer, ao abrigo do disposto no art.º 588.º n.º 1 do CPC, que fosse ordenada a notificação dos peritos para comparecerem em audiência, para, sob compromisso de honra, prestarem os esclarecimentos que lhes fossem solicitados.

Sobre tal requerimento foi proferido despacho com o seguinte teor: “Antes de mais, notifiquem-se os autores para, em dez dias, virem invocar os esclarecimentos que pretendem ver esclarecidos pelos Srs. Peritos uma vez que a presença dos mesmos só excepcionalmente é determinada, como decorre da redacção da parte final do n.º 1 do art. 588.º do Cód. do Proc. Civil.” Notificados deste despacho, vieram os autores dizer que pretendiam que os peritos prestassem esclarecimentos à matéria dos quesitos que constituíam o objecto da perícia sob os números 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 11.º, 19.º, 57.º, 59.º, 60.º e 61.º, cujas respostas foram objecto da referida reclamação contra o relatório pericial.

Foi então proferido despacho que indeferiu a requerida notificação dos peritos para comparecerem na audiência de julgamento, por se ter entendido que a sua comparência em audiência é excepcional e apenas pode ter lugar “…nas situações em que os Srs. Peritos responderam de forma deficiente, obscura ou contraditória no seu relatório e não conseguem esclarecer essas deficiências por intermédio dos esclarecimentos solicitados ao abrigo do disposto no art.º 587.º do Cód. de Proc. Civil.

Sendo certo que, “…do requerimento apresentado pelos autores não se descortina quais as dúvidas que lhes suscitaram as respostas dos Srs. Peritos que permita ao julgador aferir da necessidade da presença deste em Julgamento… .” Conclui-se, assim que, “Face ao exposto e não tendo os autores, após convite nesse sentido, alegado fundadamente os motivos pelos quais pretendiam a presença dos Srs Peritos em audiência de julgamento, indefere-se o requerido.” Inconformados com tal despacho, os autores interpuseram recurso de agravo, que foi admitido com subida diferida, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1 – O douto despacho agravado não está fundamentado de harmonia, quer com as regras gerais orientadoras da interpretação das normas jurídicas fornecidas pelo artigo 9º, do CC, quer com a doutrina avalizada do Insigne Mestre Prof. A. do Reis; 2 – No que toca às regras da interpretação, atento o princípio inserto no n.º 1, do preceito citado, não cingimento à letra da lei, mas reconstituição do pensamento legislativo, a partir dos textos, tendo...

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