Acórdão nº 541/10.GAPTB.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelANA TEIXEIRA
Data da Resolução18 de Dezembro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES SECÇÃO CRIMINAL - Acórdão I - RELATÓRIO 1. No processo Comum (tribunal Singular n.º 541/10.1 GAPTB, do Tribunal Judicial da Comarca de Ponte da Barca, a arguida Diana P...

veio a ser absolvida da prática de crime de burla informática e nas comunicações e condenada pela prática de crime de furto simples na pena de 120 dias de multa á taxa diária de 7,50 euros, num total de €900,00.

(…)» 2. Inconformado, o MP recorre, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [fls.279 ]: «(…) CONCLUSÕES 1 - O bem jurídico protegido pela incriminação do crime de furto, p, e p, pelo artigo 203.°, n.º 1, do Código Penal, é a propriedade, incluindo a posse e a detenção legítimas; o bem jurídico protegido pela incriminação do crime de burla informática e nas comunicações, p. e p. pelo artigo 221.°, n.? 1, do Código Penal, é o património de outra pessoa, e o ofendido é a pessoa que sofre o prejuízo patrimonial e não o proprietário ou utente dos dados ou programas informáticos.

2 - No caso concreto, inexiste qualquer relação de concurso aparente ou de normas, por não se verificar qualquer relação de especialidade, subsidiariedade ou consunção entre as normas (artigos 203.°, n," 1, e 221.°, n:" 1, do Código Penal). Estamos, outrossim, perante um concurso efetivo de crimes.

3 - A relação de especialidade verifica-se quando duas normas se encontram numa relação de género e espécie, ou seja, quando duas normas têm os mesmos elementos típicos, mas uma delas apresenta ainda outros elementos distintivos que a particularizam, o que não sucede no caso em apreço.

4 - O primeiro comportamento da arguida enquadra-se na previsão do artigo 203.° do Código Penal, consumando-se o ilícito com a retirada do cartão à titular, colocando-se a arguida na sua posse sem autorização. O segundo comportamento, repetido duas vezes, enquadra-se na previsão do artigo 221.° do Código Penal, e consiste na utilização que a arguida posteriormente fez do objecto subtraído, interferindo indevidamente no tratamento de dados informáticos e logrando o levantamento de quantias em numerário que, por força do processamento informático, foram debitadas na conta da titular do cartão.

5 - Trata-se de concurso efetivo de crimes na medida em que houve violação de duas disposições legais que não têm campo de aplicação coincidente, pois a primeira tutela o património alheio enquanto a segunda, tendo em vista ainda e também a tutela do património de terceiros, vai mais longe e protege essencialmente os dados informáticos.

6 - Não se pode afirmar a verificação de uma resolução única no que respeita à violação destas duas normas, por ser incompatível com os mais elementares princípios da psicologia humana que tal suceda numa situação em que não existe uma conexão temporal estreita entre os comportamentos integradores dos tipos de crime em apreço (203.° e 221.° do Código Penal), já que a atividade da arguida se repartiu ao longo de vários dias, pelo menos dois e três dias após o furto do cartão.

A resolução criminosa única reporta-se tão só à utilização do cartão não abrangendo o momento anterior que consistiu na subtração de um documento alheio, retirando-o do domínio de quem de direito.

7 - A douta sentença recorrida, no segmento em que afirma que o que a arguida queria era o dinheiro, entra em contradição com os factos provados relativos ao elemento subjectivo (pontos 9. a 12. - provado que era intenção da arguida fazer seu aquele cartão de crédito, bem como foi sua intenção, em momento posterior, ludibriar as máquinas de levantamento automático de dinheiro, agindo como se se tratasse da legítima titular do cartão de crédito), O que configura contradição insanável da fundamentação.

8 - O Tribunal a quo, ao considerar que os factos subsumíveis ao crime de burla configuram tão-só "o esgotamento ou exaurimento do crime de furto", e que as normas se encontram numa relação de concurso aparente, mais precisamente de especialidade, violou os artigos 30.°, 203.°, n." 1, e 221.°, n.? 1, todas as disposições do Código Penal, efetuando uma errada interpretação das normas mencionadas.

9 - O artigo 30.° do Código Penal impõe que se considere que foram cometidos dois crimes, a saber: um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.°, n.º 1, do Código Penal, que consistiu na subtração do cartão de crédito, a que se seguiu um crime de burla informática, p. e p. pelo artigo 221.°, n.º 1, do Código Penal, na forma continuada (artigo 30.0, n. o 2, do Código Penal), que consistiu na realização dos dois levantamentos de dinheiro nos terminais de ATM, em dias distintos.

10 - Em suma, afigura-se-nos existir uma relação de concurso efetivo entre os crimes de furto, p. e p. pelo artigo 203.°, n.º 1, e de burla informática, p. e p. pelo artigo 221.°, n.º 1, ambas as disposições do Código Penal, atendendo a que, na presente situação, foram efetuados pela...

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