Acórdão nº 1835/10.1TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução18 de Dezembro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO M… intentou acção de investigação de paternidade contra R… e J… e mulher A… pedindo que seja reconhecida como filha de A…, já falecido, pai dos réus R… e J….

Contestaram os réus J… e mulher A… alegando desconhecer os factos articulados na petição inicial e salientando que os mesmos se reportam há mais de 40 anos.

Elaborou-se despacho saneador e definiram-se os factos assentes e a base instrutória.

Procedeu-se a perícia médico-legal com exumação de cadáver para colheita de material biológico, tendo o resultado conduzido a uma paternidade praticamente provada, com o valor percentual de 99,99999998% na Escala de Hummel.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido aditados dois quesitos à base instrutória, no início da audiência e, fixada a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção procedente, declarando-se que a autora M… é filha do investigado A…, ordenando-se o correspondente averbamento no assento de nascimento da autora.

Discordando da sentença, o réu R… interpôs recurso tendo, a final, nas alegações, formulado as seguintes Conclusões: A A. interpôs a presente acção de investigação da paternidade contra os ora Recorrentes peticionando que fosse reconhecida como filha de A…, ordenando o averbamento de tal paternidade e da avoenga daí resultante ao seu assento de nascimento e condenados os Réus a reconhecerem-na como filha do referido A….

O artigo 1817º do C.C., (previsto para a investigação da maternidade, mas, aplicável ipsis verbis à acção de investigação da paternidade, por força do disposto no artigo 1873º, do código civil) prevê um prazo de caducidade e, a lei n.º 14/2009, de 9 de Abril, veio alterar a redacção desse artigo, porém, continua a prever prazo de caducidade.

A Autora, nunca foi tratada como filha do pretenso pai, nem este, a reconheceu como tal, ou praticou factos que indiciassem ser o pai da Autora.

A Autora, só após a morte deste teve conhecimento, segundo alegaram as testemunhas, que o pai seria o falecido.

Todavia, as referidas testemunhas, só sabem, o que a Autora lhes contou.

De resto, nunca aquela, estabeleceu com aquele, durante a vida do mesmo qualquer laço familiar, ou até de amigo ou conhecido.

Pelo que, deve a excepção da caducidade ser decretada e, em consequência, não ser a Autora reconhecida como filha do falecido A… e, irmã dos ora Réus.

Pelo que, deve o recurso interposto ser julgado procedente e, em consequência, ser revogado a douta sentença e substituída por outra que declare a caducidade da presente acção e em consequência não ser a Autora reconhecida como filha do falecido – A… e, irmã dos Réus.

A autora contra alegou, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Neste tribunal o recurso foi recebido nos mesmos termos em que havia sido admitido em 1.ª instância e foram colhidos os vistos legais.

A única questão a resolver traduz-se em saber se ocorreu a caducidade do direito da autora.

  1. FUNDAMENTAÇÃO Na sentença foram considerados provados os seguintes factos: A) - A Autora nasceu no dia 18 de Maio de 1967, na freguesia e concelho de Ponte de Lima, filha de M…, encontrando-se a paternidade omissa no respectivo assento de nascimento.

    1. - A… faleceu no dia 16 de Agosto de 2009, no estado de casado com E….

    2. - O Réu R… nasceu no dia 28 de Junho de 1951, filho de A… e de E….

    3. - O Réu J… nasceu no dia 6 de Março de 1953, filho de A… e de E….

    4. - O Réu J… casou catolicamente com A… em 18 de Agosto de 1984.

    5. - E… faleceu no dia 9 de Janeiro de 2010, no estado de viúva de A….

    1.º - Quando a Autora nasceu, a mãe desta e A… já tinham terminado a sua relação amorosa.

    3.º - A mãe da Autora, M…, trabalhava numa pensão em Ponte de Lima.

    4.º,5.º,6.º - Uma das funções de M… era a entrega diária de refeições no posto da GNR a um dos presos, aí tendo conhecido A…, que era militar nesse posto.

    7.º - Nessas circunstâncias, A… foi metendo conversa e fazendo a corte a M….

    11.º,12.º - Por diversas vezes, e no decurso de 1966, M… e A… mantiveram entre si relações sexuais de cópula completa, donde resultou a gravidez daquela e o nascimento da Autora.

    14.º - Pelo menos uma vez, A… ofereceu dinheiro a M… para que esta comprasse uma prenda para a Autora.

    15.º - Meses antes da morte de A…, a Autora tentou contactá-lo várias vezes.

    18.º - Não existe qualquer relação de parentesco entre A… e M….

    19.º - Até meses antes da morte de A…, a mãe da Autora sempre disse a esta que ela era filha de um soldado que tinha morrido na guerra.

    20.º - A mãe da Autora apenas lhe relatou o descrito nas respostas aos quesitos 1.º, 3.º a 7.º, 11.º e 12.º perante a insistência da Autora.

    O estabelecimento da paternidade pode efectuar-se através da presunção de paternidade, da perfilhação e do reconhecimento judicial da paternidade. «Estas três vias têm dois denominadores comuns: o de satisfazerem o direito de cada ser humano a conhecer o seu pai; e o de fazerem coincidir a paternidade jurídica com a paternidade biológica» - Diogo Leite de Campos in ‘Lições de Direito da Família e das Sucessões’, 2.ª edição, pág. 347.

    Nos termos do artigo 1869º do Código Civil «A paternidade pode ser reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho se a maternidade já se achar estabelecida...» Encontrando-se a maternidade previamente estabelecida, é possível a prova da filiação biológica, uma vez que pai biológico é o que manteve com a mãe as relações procriantes de que resultou o filho investigante (vide Guilherme de Oliveira in «Estabelecimento da Filiação», pág. 151).

    Numa acção de investigação de paternidade a causa de pedir é o vínculo biológico de progenitura que, pretensamente, liga o réu ao filho. O investigante precisa de convencer o tribunal de que o réu é o progenitor do filho.

    A autora, neste caso, pode tentar provar o vínculo biológico ou pode beneficiar de uma presunção de paternidade.

    No que respeita à prova do vínculo biológico, ele pode ser feito através da prova de factos instrumentais – o facto positivo da existência de relações sexuais entre o réu e a mãe do filho, durante o período legal da concepção e o facto negativo da ausência de relações sexuais entre a mãe do filho e outros homens, durante aquele período (coabitação e exclusividade) – ou pela via directa, através de meios científicos, hoje consagrados preferencialmente pelo artigo 1801.º do Código Civil.

    No caso dos autos esta relação biológica encontra-se estabelecida, uma vez que ficou provado que o nascimento da A. resultou das relações sexuais mantidas entre o pretenso pai (A…) e a mãe da A.

    O apelante, nada opondo quanto a esta...

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