Acórdão nº 727/05.0TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelPAULO BARRETO
Data da Resolução18 de Dezembro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível (2.ª) do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório J.., com residência no lugar do.., Guimarães, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra B.. e mulher M.., residentes no lugar de.., Guimarães, A.. e mulher A.., residentes no dito lugar de.., C.., Ld.ª, com sede na Rua.., Guimarães, e F.. e mulher C.., residentes na Rua.., Guimarães, pedindo: A título principal: - Se declare, com todos os efeitos e consequências legais, a nulidade, por simulação, do negócio jurídico denominado “doação”, formalizado por escritura de 12 de Abril de 2001, celebrado entre os primeiros Réus, como doadores, e o segundo Réu marido, como donatário, relativamente ao imóvel identificado no artigo 13.º da petição inicial, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º .., da freguesia de Caldelas, do concelho de Guimarães; - Se declare, com todos os efeitos e consequências legais, a nulidade, por simulação, do negócio denominado “confissão de dívida e hipoteca”, formalizado por escritura de 22 de Dezembro de 2003, celebrado entre a terceira Ré sociedade, como mutuária, o quarto Réu como mutuante e aceitante da hipoteca e os segundos Réus como prestadores da hipoteca sobre o identificado imóvel descrito na Conservatória sob o n.º ../Caldelas/Guimarães; - Sejam todos os Réus condenados a reconhecer tais nulidades e os efeitos delas decorrentes; - Se ordene o cancelamento do registo de propriedade lavrado relativamente àquele prédio n.º ../Caldelas/Guimarães pela inscrição G2/AP02/ /16042001, e, bem assim, do registo de hipoteca lavrado pela inscrição C2/AP13/ /23122003, bem como de quaisquer registos posteriores.

A título subsidiário, para a hipótese de não proceder o pedido principal formulado: - Se condenem os segundos, terceira e quarto Réus a restituírem o valor do identificado imóvel, descrito na Conservatória sob o n.º../Caldelas/Guimarães, ao património dos primeiros Réus, livre e desonerado do crédito e sua garantia real de hipoteca constituída a favor do quarto Réu e, em consequência, se reconheça e se declare ter o Autor o direito de executar tal imóvel no património dos segundos Réus para pagamento e satisfação do seu direito de crédito, totalmente livre e desonerado de tal hipoteca.

Em fundamento da sua pretensão, alega: o Autor é dono e legítimo portador de seis cheques, emitidos ao portador e sacados, emitidos e assinados pelo 1.º Réu marido, os quais foram posteriormente endossados ao Autor por J.., apresentados a pagamento, tais cheques foram devolvidos sem pagamento, com a menção de “extravio”; o Autor é ainda portador de uma letra de câmbio, sacada por J.., aceite pelo 1.º Réu e posteriormente endossada por aquele ao Autor; apresentada a pagamento, tal letra não foi paga; munido de tais títulos de crédito, o Autor instaurou acção executiva contra o 1.º Réu e o aludido J.., para pagamento da dívida global representada pelos referenciados títulos, no valor de 10.170.000$00 / 50.727,75, a qual correu seus termos, com o n.º 318/2001, pela 2.ª Vara Mista de Guimarães; no âmbito dessa execução, o Autor não obteve o pagamento da quantia exequenda respectiva; por consequência, o Autor é credor do 1.º Réu da quantia titulada pelos referidos títulos de crédito, acrescida dos juros de mora respectivos, que no momento da propositura da acção ascendem ao montante de € 10.271,18, na quantia global de € 60.998,93; à data da emissão da quase totalidade dos cheques e da letra acima referidos, do património do 1.º Réu constava o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n.º../271296/Caldelas, melhor identificado no art.º 13.º da petição inicial; por escritura pública intitulada “doação”, outorgada em 12/04/2001, os 1.ºs Réus declararam doar ao 2.º Réu marido, seu filho, por conta da quota disponível deles doadores, o identificado prédio urbano, atribuindo-lhe o valor de 4.000.000$00, e todo o seu recheio, atribuindo-lhe o valor de 1.000.000$00, e o 2.º Réu marido declarou aceitar tal doação; não obstante as declarações constantes de tal escritura, nem os 1.ºs Réus pretenderam efectuar ao 2.º Réu marido qualquer doação, nem este pretendeu efectivamente aceitar tal doação; os outorgantes de tal escritura acordaram entre si emitir tais declarações com o único intuito de colocar, formalmente, na titularidade do 2.º Réu o direito de propriedade sobre o referido imóvel e seu recheio, com o objectivo de enganar terceiros sobre a titularidade efectiva e substantiva de tal direito de propriedade, e assim impedir que o Autor viesse a obter o pagamento do seu supra referido crédito pela execução de tal imóvel e recheio; por escritura de 22/12/2003, os 2.ºs Réus, outorgando por si e na qualidade de únicos sócios da terceira Ré, C.., Ld.ª, declararam e confessaram ser esta sociedade devedora ao 4.º Réu, F.., da quantia de € 124.700,00, a título de empréstimo concedido pelo prazo de cinco anos, a contar de 22/12/2003; nesta escritura, para garantia do pagamento do capital mutuado, juros e demais despesas, o 2.º Réu marido, autorizado pela sua mulher, a 2.ª Ré, declararam constituir hipoteca sobre o prédio urbano acima identificado; nesta mesma escritura, o 4.º Réu declarou aceitar a confissão de dívida feita e a hipoteca constituída; nem a terceira Ré era ao tempo da celebração desta escritura devedora de qualquer quantia ao 4.º Réu, nem este efectivamente entregou à terceira Ré sociedade qualquer quantia em dinheiro, quantia essa que, assim, a Ré sociedade não recebeu do 4.º Réu; nem os 2.ºs Réus pretenderam efectivamente constituir a hipoteca para garantia do pagamento daquele empréstimo, nem o 4.º Réu pretendeu efectivamente aceitar tal confissão de dívida, ou celebrar com a terceira Ré sociedade qualquer empréstimo ou, sequer, aceitar qualquer garantia de hipoteca; os 2.ºs e 4.º Réus emitiram as declarações constantes desta escritura a fim de tornar mais difícil, oneroso e obstaculizado uma eventual impugnação pauliana do negócio de doação acima referido; o 4.º Réu prestou-se a proferir nesta escritura as declarações que proferiu por acordo com os 1.ºs e 2.ºs Réus, a fim de simular a contracção da dívida correspondente e hipoteca constituída, e com o objectivo final ou mediato de retirar ao Autor a possibilidade de, com sucesso, instaurar acção de impugnação pauliana da doação acima indicada; todos os Réus actuaram em conluio e união de vontades no sentido de tornar impossível ou extremamente difícil para o Autor e credor dos 1.ºs Réus instaurar e obter procedência de pedido pelo qual procedessem à impugnação pauliana de tal doação; em consequência, ambos os referidos negócios são nulos por simulação; sem prescindir, o património dos 1.ºs Réus, à data do vencimento da dívida do Autor, era constituído exclusivamente pelo prédio urbano supra identificado; a dívida do 1.º Réu ao Autor é anterior ou contemporânea da doação supra referida; os 1.ºs e 2.º Réus realizaram tal doação com conhecimento de que do mesmo resultava a redução da garantia patrimonial do crédito do Autor; à data da celebração da supra aludida escritura de “confissão de dívida com hipoteca”, os 4.ºs Réus tinham conhecimento de que o 1.º Ré era devedor ao Autor da quantia correspondente ao crédito supra aludido, bem como tinham conhecimento de que os 1.ºs Réus não tinham outros bens para garantir o pagamento dessa dívida e de que impendia sobre o 1.º Réu, como executado, a execução acima referenciada; os 4.ºs Réus ao aceitarem constituir hipoteca sobre o referido imóvel estavam conscientes do prejuízo que esse acto envolvia para o Autor; como tal, impugna tais negócios, mediante impugnação pauliana, nos termos dos art.ºs 610.º e segs. do Código Civil.

Tendo o Réu B.. falecido, mediante o competente incidente de habilitação de herdeiros deduzido por apenso, foram declarados habilitados M.. e A.., de modo a assumirem nos autos o lugar anteriormente assumido por aquele B...

Os Réus contestaram, arguindo a excepção de ilegitimidade da primeira Ré mulher e a excepção da ineptidão da petição, por ininteligibilidade do pedido subsidiário, e impugnando no essencial a factualidade atinente à simulação e à impugnação pauliana.

Concluíram, pugnando pela procedência daquelas excepções dilatórias e pela total improcedência das pretensões formuladas pelos Autores, seja a título principal, seja a título subsidiário, com a consequente absolvição dos Réus dos pedidos.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença com a seguinte parte decisória: “ - Declarar ineficaz em relação ao Autor, na medida do valor do seu crédito de € 42.547,47 (quarenta e dois mil quinhentos e quarenta e sete euros e quarenta e sete cêntimos) e juros de mora à taxa legal, a doação celebrada entre os 1.ºs Réus e o 2.º Réu marido, por escritura pública de 12 de Abril de 2001, relativa ao prédio urbano, sito no Lugar da Quintã, da freguesia de Caldelas, concelho de Guimarães, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo .. e descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n.º../Caldelas, referida em 8) dos factos provados; - Condenar os 1.ºs e 2.ºs Réus à restituição do identificado prédio na medida do interesse do Autor, podendo este executá-lo no património dos 2.ºs Réus para satisfação do seu referido crédito, mantendo-se, contudo, a hipoteca constituída por escritura pública de 22/12/2003, referida em 11) dos factos provados; - Absolver os 1.ºs e 2.ºs Réus dos restantes pedidos contra eles formulados pelo Autor; - Absolver a 3.º e o 4.º Réus dos pedidos contra eles formulados pelo Autor”.

Não se conformando com tal decisão, dela recorreram os RR. M.., A.. e A.. oferecendo as seguintes conclusões: “ 1 - Não se conformam, de todo, os Recorrentes com a decisão do Tribunal a quo, na parte em que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu “Declarar ineficaz em relação ao Autor, na medida do valor do seu crédito de € 42.547,47 (quarenta e dois mil quinhentos e...

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