Acórdão nº 756/10.2TBFLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução11 de Setembro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO «C.., Lda.» intentou acção declarativa contra «C..Seguro de Créditos, SA», pedindo que a ré seja condenada a pagar à autora a quantia de € 73.820,00, acrescida de juros de mora vencidos, no montante de € 12.784,37 e vincendos, até efectivo e integral pagamento, à taxa de 8% até 30/06/2010 e depois às taxas comerciais que vierem a ser fixadas, nos termos da Portaria n.º 597/2005 de 19 de Julho.

Alegou para o efeito que celebrou com a ré contrato de seguro tendo por objecto os créditos decorrentes da sua actividade empresarial de venda de calçado nos mercados interno e externo. O contrato abrangia os créditos sobre um cliente inglês “D.. Ltd.”, até ao limite de € 150.000,00, não tendo este pago à autora o preço de € 126.217,76 correspondente ao fornecimento do calçado discriminado nas facturas juntas com a petição inicial. Tendo comunicado tal facto à Ré, esta pagou apenas o montante de € 52.397,76, encontrando-se em falta o valor restante correspondente a € 73.820,00.

Contestou a ré, por excepção, invocando a caducidade do direito da autora a exigir o pagamento da indemnização e alegando já ter pago o que lhe competia nos termos da apólice aqui em causa, com a assinatura, por parte da autora, do recibo de indemnização definitiva. Por impugnação, alega que, tendo a cliente da autora sido declarada insolvente, a ré apenas pagou à autora a quantia que foi reconhecida pelo administrador da insolvência - € 58.219,73 -, não tendo sido reconhecido o restante por alegados defeitos nos artigos vendidos, o que conduziu à suspensão da verificação do sinistro. A cobertura do contrato de seguro celebrado entre as partes é, no mercado externo, de 90% do prejuízo apurado, motivo pelo qual a Ré pagou à Autora o correspondente montante de € 52.397,76 por conta do valor do crédito reconhecido no processo de insolvência.

Replicou a autora para dizer que não foi informada nem era conhecedora da cláusula relativa à caducidade inserta nas condições gerais da apólice que é contrária à boa fé e, sendo proibida tal cláusula contratual geral, é a mesma nula. Mesmo que assim não fosse, tendo a verificação do sinistro ficado suspensa, não pode a ré invocar a caducidade. Finalmente, alega que, ao assinar o aviso de pagamento de indemnização, nunca quis dar à ré recibo de indemnização total e definitiva pelo sinistro em causa, nem foi essa a posição que a ré tomou, na altura.

Treplicou a ré para dizer que o contrato foi negociado com detalhe e que a autora estava bem ciente de todas as suas cláusulas, designadamente da relativa à caducidade, mantendo o já alegado na contestação. Mais considerou que, sendo a autora segurada da ré há cerca de vinte anos e sempre tendo sido o contrato cumprido sem problemas, a invocação de qualquer eventual nulidade neste momento, constitui manifesto abuso de direito.

Na sequência de despacho convidando a autora a apresentar nova petição, na qual alegue factos concretos quanto aos bens fornecidos, datas e termos do negócio, defeitos invocados pelo cliente, respectivos termos e datas, veio a autora apresentar nova petição, cumprindo tal convite, a que se seguiram contestação, réplica e tréplica idênticas às anteriormente apresentadas.

Elaborou-se despacho saneador e definiu-se a matéria de facto assente e a base instrutória, com reclamações de ambas as partes, desatendidas.

Teve lugar o julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela autora, condenando a ré a pagar à autora a quantia de € 61.198,23, acrescida de juros legais vincendos, contados à taxa supletiva legal (comercial), desde o trânsito em julgado da decisão, até efectivo pagamento.

Discordando da decisão, dela interpôs recurso a ré, tendo, nas alegações, formulado as seguintes Conclusões: (..) Termina pedindo a revogação da sentença recorrida, devendo a acção ser julgada improcedente, com a absolvição da ré/apelante.

A autora contra alegou pedindo que seja negado provimento ao recurso.

O recurso foi admitido, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

Foram colhidos os vistos legais.

As questões a resolver traduzem-se em saber: - se deve ser alterada a matéria de facto; - se o contrato celebrado entre a apelante e a apelada está correctamente identificado na sentença, bem como os seus requisitos; - se houve violação do princípio do contraditório e se a apelada deveria ter interposto acção contra a sua cliente para ver reconhecido o seu crédito; - se se verifica a caducidade do direito da apelada.

  1. FUNDAMENTAÇÃO Na sentença foram considerados provados os seguintes factos: 1. A Autora dedica-se ao fabrico e comercialização de calçado (cfr. alínea A) dos factos assentes); 2. Em 24 de Janeiro, 11 e 25 de Fevereiro, 20 de Março, e 2 e 8 de Abril de 2008, no exercício da sua actividade comercial, a sua cliente “D..LTD”, com sede em .., em Bristol, Inglaterra, solicitou o fornecimento de 325 pares de sapatos e 3.110 pares de botas a fabricar pela Autora, mediante o pagamento do preço de € 126.217,76, nos termos constantes dos documentos juntos a fls. 10 a 15 dos autos (cfr. alínea B) dos factos assentes); 3. No cumprimento do referido no número anterior, a Autora entregou à referida “D.. LTD” o calçado discriminado nas seguintes facturas: a) 325 pares de sapatos, ao preço unitário de 12,73 GBP (libras esterlinas), cujo valor foi apurado no documento contabilístico denominado factura n.º 5677, datada de 28 de Março de 2008, no valor global de 4.137,25 GBP (libras esterlinas), correspondente a € 6.129,26; b) 860 pares de botas, ao preço unitário de 39,00 €, cujo valor foi apurado no documento contabilístico denominado factura n.º 5682, datada de 4 de Abril de 2008, no valor global de € 33.540,00; c) 520 pares de botas, ao preço unitário de € 39,00, cujo valor foi apurado no documento contabilístico denominado factura n.º 5683, datada de 8 de Abril de 2008, no valor global de € 20.280,00; d) 60 pares de botas, ao preço unitário de € 43,15, 280 pares de botas, ao preço unitário de € 39,00, e 110 pares de botas, ao preço unitário de € 36,00, cujo valor foi apurado no documento contabilístico denominado factura n.º 5685, datada de 11 de Abril de 2008, no valor global de € 17.469,00; e) 275 pares de botas, ao preço unitário de € 36,50, cujo valor foi apurado no documento contabilístico denominado factura n.º 5686, datada de 11 de Abril de 2008, no valor global de € 10.037,50; f) 520 pares de botas, ao preço unitário de € 39,00, 120 pares de botas, ao preço unitário de € 36,00, 140 pares de botas, ao preço unitário de € 43,30, e 225 pares de botas, ao preço unitário de € 36,00, cujo valor foi apurado no documento contabilístico denominado factura n.º 5689, datada de 2 de Maio de 2008, no valor global de € 38.762,00 (cfr. alínea C) dos factos assentes); 4. As facturas aludidas no número anterior totalizam o valor de € 126.217,76 e deviam ser pagas pela referida “D..LTD” no prazo de trinta dias sobre as datas de emissão das facturas por meio de cheque (cfr. alínea D) dos factos assentes); 5. A “D.. LTD” alegou que o calçado fornecido pela Autora e identificado no anterior número 3., tinha defeito, pretendendo desse modo obter um desconto de 55% sobre o preço das facturas aí identificadas sob as alíneas b) a f), remetendo à Autora, em 23 de Maio de 2008, a respectiva nota de débito n.º 1052, no...

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