Acórdão nº 958/14.2TBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | FERNANDO FERNANDES FREITAS |
Data da Resolução | 09 de Abril de 2015 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
- ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES -
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RELATÓRIO I.- A sociedade comercial “I.., Ld.ª”, alegando encontrar-se em situação económica difícil, tendo, por falta de liquidez, séria dificuldade em cumprir com pontualidade as obrigações resultantes da sua actividade comercial, e informando que uma das suas credoras já encetou consigo negociações conducentes à sua revitalização, veio apresentar Processo Especial de Revitalização (PER), instruindo-o, designadamente, com a relação dos seus credores.
Nomeado o Administrador Judicial Provisório (AJP), decorreram negociações com os credores que culminaram com a celebração de acordo que aprovou um plano de revitalização da Devedora.
Notificada, a credora “S.., S.A.”, veio requerer que fosse declarado encerrado o presente processo e declarada a insolvência da Devedora, defendendo que o plano de revitalização foi apresentado aos credores já depois de ultrapassado o prazo máximo de três meses referido no art.º 17.º-D do Código de Insolvência e de Recuperação de Empresas (C.I.R.E.); e fundamentando que os votos apresentados pelos credores deviam acompanhar a acta de contagem dos votos, defende que se trata de uma irregularidade cuja correcção requer; e, ainda, considerando que a aprovação do plano está dependente dos votos favoráveis de mais de 2/3 dos créditos constantes da respectiva lista, correspondentes a 66,67% do total, requer que se considere não ter sido aprovado o plano de revitalização, revogando-se a decisão do Administrador Judicial Provisório, recusando-se a sua homologação.
Respondeu a Devedora defendendo a homologação do plano que considera ter sido tempestivamente aprovado e pela maioria legalmente exigida.
Apresentados os autos, a Meritíssima Juiz, desatendendo os fundamentos invocados pela referida Credora, considerou que o plano foi aprovado com quorum constitutivo e deliberativo suficientes pelo que o homologou.
Reagindo contra esta decisão, traz a mencionada Credora o presente recurso propugnando para que seja revogada e substituída por outra que declare a caducidade do prazo previsto no n.º 5 do artigo 17º-D do CIRE ou, em alternativa, julgue o plano não aprovado e não homologado e, consequentemente, declare encerrado o presente processo e a insolvência da Devedora.
Esta contra-alegou argumentando no sentido de dever ser mantida a decisão impugnada.
O recurso foi recebido como de apelação com efeito meramente devolutivo.
Ainda no mesmo despacho a Meritíssima Juiz, dando conta de um lapso de escrita que se verificava na linha 4 do segundo parágrafo, da decisão que homologou o Plano, corrigiu-o consignando que onde se escreveu “e que importaram qualquer dilação significativa” se quis escrever “e que não importaram qualquer dilação significativa”.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
** II.- A Apelante funda o seu recurso nas seguintes conclusões: 1º - A Devedora e o AJP não respeitaram o previsto nos artigos 17º-D, 17º-F e 17º-G do CIRE nem os princípios e espírito subjacente ao Processo Especial de Revitalização.
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- E a consequência desse comportamento devia ter sido o encerramento imediato do processo e a declaração de insolvência da Devedora.
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- A decisão recorrida negou razão ao requerido pela Recorrente sem apontar as razões da sua discordância em relação à posição e entendimento da Recorrente relativamente às questões suscitadas.
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- A decisão recorrida não explica a forma ou sentido em que interpreta as normas jurídicas aplicáveis.
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- Aliás da decisão recorrida não se consegue extrair, com clareza, qual o entendimento e a interpretação que o Tribunal efectuou da situação concreta e das normas jurídicas em causa.
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- Nos termos do artigo 154º do CPC as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas.
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- E de acordo com o n.º 3 do artigo 607º do CPC, nos fundamentos, o Juiz deve discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
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- Pelo que padece de vício de falta de fundamentação e de obscuridade que a torna ininteligível.
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- A decisão é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível. – cfr artigo 615º do CPC 10º - Nulidade que aqui expressamente se invoca.
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- O prazo de 2 meses para concluir as negociações previsto no n.º 5 do artigo 17º-D terminava em 30-07-2014.
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- O AJP só em 31-07-2014 juntou aos autos um documento, datado de 28-07-2014, em que ele e a devedora declaravam acordar na prorrogação do prazo para conclusão das negociações a que alude o n.º 1 do art.º 17.º-D do CIRE, por um mês.
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- E esse acordo só foi publicado no portal Citius em 04-08-2014.
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- O prazo para a devedora concluir as negociações pode ser prorrogado mediante acordo PRÉVIO e escrito entre o AJP e o devedor, devendo tal acordo ser junto aos autos e publicado no portal citius.
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- Face aos termos da lei, a prorrogação do prazo de negociações opera pela subscrição do acordo nos termos previstos, a sua junção aos autos e publicação no portal do Citius, dispensando despacho judicial a deferir a prorrogação.
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- Ou seja, a sua junção aos autos e publicação no portal do Citius é condição de eficácia e validade da prorrogação do prazo.
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- Tal acordo tem que ser celebrado, redigido a escrito, subscrito pelas partes, junto aos autos e publicado no Citius antes de terminar o prazo dos 2 meses das negociações.
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- Tendo o aludido acordo só sido junto aos autos em 31-07-2014 e publicado no portal Citius em 04-08-2014, o prazo de 2 meses para conclusão das negociações que terminou em 30-07-2014 mostra-se ultrapassado e o processo devia ter sido encerrado.
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- Não obstante, ainda que se entenda que o prazo para conclusão das negociações foi prorrogado por mais 1 mês de prorrogação, começou a contar a partir do dia 30-07-2014, o que significa que terminaria em 30-08-2014, o que, por ser um sábado, transferir-se-ia para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, dia 01-09-2014.
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- Mas, por carta registada expedida em 02-09-2014 e recepcionada pela Recorrente em 03-09-2014, a Devedora notificou-a para, até ao dia 15-09-2014, apresentar o seu voto expresso por escrito relativamente ao Plano de Recuperação, referindo que no dia 01-09-2014 foram encerradas as negociações.
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- E só em 19-09-2014, é que o AJP enviou aos autos o documento previsto no n.º 4 do artigo 17º-F do CIRE com o resultado da votação e a sua decisão sobre a aprovação ou não do plano de recuperação 22º - No entanto, entendemos e seguimos de perto o mais recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09-10-2014, proferido no Proc. Nº 974/13.1TBPFR.P1 – 3ª Secção (Apelação), disponível no www.dgsi.pt quando refere: I – A votação com vista à aprovação do plano de recuperação deve ser feita antes da conclusão do prazo das negociações. Na verdade, deve presumir-se que a votação e aprovação do plano estão incluídas nas diligências a efectuar durante o prazo para as negociações previstas no nº. 5, do artº 17º D do CIRE.(…) 23º - Por isso é que, no artigo 17º-C, se refere “negociações conducentes à revitalização daquele por meio da aprovação de um plano de revitalização.” 24º - E que, no artigo 17º-F, n.º 1 e 2 se menciona “Concluindo-se as negociações com a aprovação de plano de recuperação…” (o sublinhado é nosso) 25º - As normas legais do CIRE conjugadas com a natureza urgente do PER e a sua expedita tramitação não se compadece com o expediente utilizado pela Devedora de considerar encerradas as negociações dentro dos 3 meses mas depois ainda conceder um prazo (totalmente à escolha da Devedora porquanto não está legalmente previsto) para os credores apresentarem o seu sentido de voto.
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- E poder juntar aos autos a documentação com o resultado da votação quando bem entender.
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- Das normas do PER resulta também clara a imposição de prazos curtos e de uma tramitação que se quer célere e por isso é que também a lei atribuiu natureza urgente ao processo (artigo 17.º-A, n.º 3) 28º - Pelo que o procedimento adoptado pela Devedora contraria a ratio e o espírito subjacente ao PER.
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- O Decreto lei n.º 150/2014, de 13 de Outubro veio clarificar o regime aplicável à prática de atos processuais enquanto se mantiver a situação de exceção provocada pelos constrangimentos técnicos ao acesso e utilização do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais (CITIUS), estabelecendo um regime de justo impedimento e de SUSPENSÃO DE PRAZOS PROCESSUAIS.
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- Mas o prazo de 2 ou 3 meses para a obtenção de um acordo de credores (finalidade procurada pelo PER), refere Luis A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in “Codigo da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, 2ª Edição, Quid Iuris, 2013, pág. 161 que “Nos termos em que está concebido, trata-se de um prazo de caducidade, razão pela qual, se o acordo só for obtido para além dele, não pode já ser homologado por violação não negligenciável da lei – art.º 215º, aplicável por imperativo do art.º 17º-F, n.º 5. Aliás, segundo disposição expressa do art.º 17º-G, n.º 1, o processo negocial é encerrado se for ultrapassado o prazo aqui estabelecido.” 31º - Pelo que aquele Decreto Lei não lhe é aplicável, sendo certo que a Devedora nunca esteve impedida de concluir as negociações (que nem sequer se efectuam nos autos) nem de colher os votos dos credores ou de juntar aos autos a documentação a que alude o n.º 4 do artigo 17º-F, impedimento que nem sequer alegou.
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- Desta forma, o acordo teria que ser obtido dentro do prazo de 2 ou 3 meses legalmente previsto, sendo evidente que, no caso dos autos, o acordo não foi obtido nesse prazo.
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- Por outro, findo o prazo dos 3 meses, a Devedora NÃO dispõe do prazo de dez dias previsto no n.º 1 do art.º 211.º para os credores apresentarem o seu voto.
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- Cremos que, se o Legislador tivesse...
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