Acórdão nº 802/05.1TBPTL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO CUNHA XAVIER
Data da Resolução26 de Novembro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO 1. Na sequência do trânsito em julgado das decisões que se pronunciaram sobre a reclamação da conta de custas de sua responsabilidade, no montante de € 83.136,00, e do despacho que indeferiu a arguição de nulidade por omissão de pronúncia que suscitaram nos autos (do qual pediram a respectiva reforma, que foi igualmente indeferida), vieram os AA. A… e M… requerer, ao abrigo do disposto no artigo 33º do Regulamento das Custas Processuais, o pagamento da conta de custas em prestações de montante máximo de € 350 mensais, alegando, em síntese, não disporem de condições económicas para pagar montante superior, e que qualquer decisão ou interpretação daquela norma que impeça o pagamento em número de prestações superior ao nela previsto é inconstitucional, por violação do princípio do acesso ao direito, consagrado no n.º 1 do artigo 20º da Constituição.

  1. O Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento do requerido.

  2. Por despacho de fls. 1295 foi indeferida a pretensão dos AA., com os seguintes fundamentos: “(…) Nos termos do art.º 33.°, n.º 1, al. b), do RCP, sendo o valor das custas superior a 12 UC, como é o caso dos autos, o seu pagamento tem de ser feito, no máximo, em 12 prestações mensais sucessivas, não inferiores a 1 UC.

    Não se vislumbra que a interpretação daquela norma no sentido de indeferir a pretensão dos AA. de proceder ao pagamento das custas em prestações em número superior ao legalmente previsto viole o princípio do acesso ao direito consagrado constitucionalmente.

    Com efeito, como decorre do processado nestes autos, os AA. exerceram de forma exaustiva e amplamente aquele direito, deduzindo as pretensões que entenderam mais convenientes à defesa dos seus interesses.

    Como bem assinala o digno Magistrado do Ministério Público está apenas aqui em causa o pagamento das custas, cujo valor foi apurado em função do valor da acção, da actividade processual desenvolvida pelos AA. e das decisões proferidas.

    O deferimento da pretensão dos AA. é que violaria o princípio, constitucionalmente consagrado, da igualdade, na medida em que seria feita fora dos condicionalismos legalmente previstos e, portanto, criaria uma desigualdade relativamente à generalidade dos devedores de custas.

    Atento o exposto, indefere-se o requerido pelos AA..

    Notifique.” 4. Inconformados recorreram os AA., pedindo a revogação do despacho recorrido com os fundamentos que assim sintetizaram [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª Os Autores, ora Recorrentes, notificados da conta de custas final do processo no montante de € 83.136,00, requereram o respectivo pagamento em prestações mensais em número superior a 12.

    1. Fundamentaram a sua pretensão em que o artigo 33.º, n.º 1, alínea b), do Regulamento das Custas Processuais, que pretende estabelecer aquele limite de 12 prestações mensais, é inconstitucional, aplicado ao caso dos autos.

    2. Na verdade, tal aplicação tem como consequência que aos Autores, ora Recorrentes, o Estado exige, no contexto do acesso aos tribunais, que façam o pagamento de prestações mensais cada uma delas 15 (quinze) vezes superior ao montante total do seu rendimento mensalmente disponível.

    3. Porém, o despacho recorrido, afirmando que "[n]ão se vislumbra» a invocada inconstitucionalidade, aplicou o dito artigo 33.º, n.º 1, alínea b), do Regulamento das Custas Processuais, e, em consequência, indeferiu a pretensão dos Autores, ora Recorrentes.

    4. A verdade, porém, é que esse artigo 33.º, n.º 1, alínea b), do Regulamento das Custas Processuais, aplicado ao caso dos autos (em que se exijam, no contexto do acesso à justiça, prestações mensais cada uma delas 15 (quinze) vezes superior ao montante total do rendimento disponível dos Autores, ora Recorrentes), é mesmo inconstitucional pelas seguintes razões.

    5. Viola o direito de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

    6. Viola o direito a um processo equitativo, consagrado no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

    7. Viola o direito a não serem postos numa situação de servidão, consagrado no artigo l.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e de não serem sujeitos a tratamento desumano ou degradante, consagrado no artigo 25.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

    8. Viola flagrantemente o Princípio da Justiça, consagrado no artigo l.º da Constituição da República Portuguesa.

    9. Viola o princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, sendo que esse artigo 33.º, n.º 1, b), do Regulamento das Custas Processuais, assim aplicado aos autos, estabelece o número 12 como número fetiche (sendo o número 12 o número dos Signos do Zodíaco), não admitindo outro número (como 13 ... 17 ... 31...243 ou outro), sendo que uma das dimensões do princípio do Estado de Direito é a de que o Estado não pode reger-se por números fetiches ou superstições.

    10. A decisão recorrida violou, pois, as seguintes disposições legais: a) Os artigos l.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; b) Os artigos l.º, 2º, 20º, n.º 1 e 4, e 25º, n.º2, da Constituição da República Portuguesa.

    Nestes termos e nos mais de direito doutamente supridos por V. Ex.ªs, deve ser...

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