Acórdão nº 3751/15.1T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelESTELITA DE MENDON
Data da Resolução05 de Novembro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Civil do Tribunal da Relação de Guimarães:*Com data de 12/06/2015, foi proferido o seguinte despacho (itálico de nossa autoria): “Indeferimento liminar do Requerimento Executivo.

Nos termos do artº 10º, nº 5, do Novo Código de Processo Civil – C. P. Civil-, “Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.

Assim, o título executivo pode ser definido “como o documento de acto constitutivo ou certificativo de obrigações, a que a lei reconhece a eficácia de servir de base ao processo executivo”, ou “como um acto de verificação (…) contido num documento que, no seu complexo, constitui a condição necessária e suficiente para proceder à execução forçada”, ou, ainda, como “o documento que, por consubstanciar a demonstração legal bastante da existência de um direito a uma prestação, pode, segundo a lei, servir de base a uma execução” [cfr. Amâncio Ferreira, in “Curso de Processo de Execução”, 11ª ed., pág. 19 e Salvador da Costa, in “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, 6ª ed., págs. 312 e 313, citando Castro Mendes e as suas “Lições de Processo Civil e A Causa de Pedir na Acção Executiva”]. E não se confunde com a causa de pedir na ação executiva, pois esta “é a factualidade essencial reflectida no título executivo”, é o relato da “existência da própria obrigação exequenda” apresentado no requerimento inicial, ao passo que o título executivo é “o documento idóneo à sua legal demonstração” [cfr. Salvador da Costa, ob. cit., pág. 313; em sentido diverso, defendendo que o título executivo corresponde à causa de pedir, v. Lopes-Cardoso, in “Manual da Acção Executiva”, ed. INCM, 1987, pág. 27].

Deste modo, pode dizer-se que o título executivo exerce uma tripla função: - uma função delimitadora, por ser por ele que se determinam o fim e os limites, objetivos e subjetivos (neste caso também se diz que tem uma função de legitimação, por determinar quem tem legitimidade ativa e passiva), da ação executiva; - uma função probatória, por se tratar de um (ou vários) documento(s) com uma determinada eficácia probatória - e uma função constitutiva, por atribuir exequibilidade a uma pretensão, permitindo a sua realização coerciva [ Acórdão da Relação do Porto de 02-02-2010, in www.dgsi.pt].

O atual artº 703º do C. P. Civil, nas suas diversas alíneas, elenca os títulos com força executiva. Trata-se de uma enumeração taxativa, como facilmente se constata da letra do preceito em análise [“À execução apenas podem servir de base (…)”].

Ora, como é sabido, o novo Código de Processo Civil (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26.6) infletiu o sentido de ampla executoriedade de documentos consagrada no anterior CPC, retirando exequibilidade aos documentos particulares, com ressalva dos títulos de crédito.

Visou-se contrariar o aumento exponencial de execuções e o risco de execuções injustas, por ausência de controlo prévio sobre o crédito invocado e de contraditório (vide Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII, que deu origem ao novo CPC).

No que concerne à aplicação no tempo do novo Código de Processo Civil, o artº 6º da Lei nº 41/2013, de 26-06, atinente às execuções, estipulou que este se aplica, com as necessárias adaptações, a todas as execuções pendentes à data da sua entrada em vigor (nº 1 do art.º 6º referido).

Especificamente quanto aos títulos executivos (assim como quanto às formas do processo executivo, ao requerimento executivo e à tramitação da fase introdutória), estabeleceu-se que o novo Código de Processo Civil “só se aplica às execuções iniciadas após a sua entrada em vigor”.

Ficou, pois, claro que a exequibilidade dos documentos seria aferida à luz do Código de Processo Civil vigente à data da instauração da execução e não do Código de Processo Civil vigente à data da constituição do documento.

O que, de resto, se coaduna com a natureza do título executivo, pressuposto processual cuja regularidade deverá pautar-se pela lei processual vigente à data da entrada da ação em juízo.

Nestes termos, o documento particular com base no qual foi intentada a presente execução não integra a lista de documentos a que a atual lei processual civil atribui força de título executivo e tal modificação legal é aplicável ao documento em questão.

Invoca, porém, a exequente, jurisprudência no sentido de que esse regime viola o princípio da segurança e da proteção da confiança integrador do princípio do Estado de Direito Democrático, invocando, no sentido da sua posição, o acórdão do Tribunal Constitucional nº 874/2014, o qual, contudo, não declara a inconstitucionalidade do normativo em análise com força obrigatória geral.

Ora, no caso presente, e acompanhando de perto os recentes acórdãos da Relação de Lisboa de 19-06-2014 e 24-09-2014, disponíveis in www.dgsi.pt, discordamos que no caso presente se esteja perante uma violação demasiado onerosa e injustificada ou arbitrária de legítimas expectativas na estabilidade do regime legal.

Na verdade, e conforme exemplarmente se refere no segundo daqueles acórdãos e que, com a devida vénia, passamos a transcrever, por corresponder integralmente ao nosso entendimento: “Por um lado, as críticas à permissividade legal na formação de títulos executivos, em particular no que concerne aos títulos particulares, já vêm de longe, pelo que não se poderá dizer que os credores tinham razões para crer que o status quo a este respeito não sofreria alterações.

Por outro lado, como se disse supra, sendo a força executiva de um documento um pressuposto processual da acção executiva, ou seja, um requisito de admissibilidade desse meio de recurso aos tribunais, em princípio deverá ser aferida pela lei processual vigente à data da instauração da acção executiva (o que afasta a alegação de que se trata de aplicação retroactiva do novo Código de Processo Civil, embora permaneça a questão da eventual inconstitucionalidade da afectação para futuro de expectativas geradas anteriormente).

Depois, a mutação legislativa operada não beliscou a força probatória dos documentos em questão, os quais continuarão, assim, a proporcionar aos credores a mesma credibilidade, perante a ordem jurídica, de que dispunham anteriormente, tão só com o acréscimo da exigência de que, em caso de incumprimento da obrigação titulada, o credor obtenha o reconhecimento do seu crédito em sede de acção declarativa ou de procedimento de injunção.

Tal...

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